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POESIA E MÚSICA DA RESISTÊNCIA

orouxinoldaresistencia

13
Jun17

A IGNORÂNCIA

António Garrochinho
A IGNORÂNCIA POR VEZES TEM CANUDO
CHEGA A HABITAR NAQUELES QUE SABEM TUDO
E DEPOIS DE OS OUVIR FICAMOS
MAIS POBRES COM MUITOS DANOS
POR NELES TER ACREDITADO
EMBORA NA VIDA O LETRADO
SEJA POR NORMA MAIS FAVORECIDO
NÃO É QUALQUER DOUTOR MAL PARIDO
QUE DE TUDO, DÁ CONTA DO RECADO
E MESMO O QUE DA CANA NÃO SABE FAZER O Ó
MOSTRA QUE HÁ DOUTORES QUE DÃO DÓ
QUE COM BURROS OMBREIAM LADO A LADO

António Garrochinho
Foto de António Garrochinho.

13
Jun17

10 ERROS DE PORTUGUÊS QUE ACABAM COM A SUA CREDIBILIDADE

António Garrochinho

A forma como escrevemos tem um impacto fundamental na nossa credibilidade.
Receber um email ou um orçamento com erros leva-nos a questionar, mesmo que inconscientemente, a competência de quem está do outro lado. No caso das empresas, quando há erros no site ou nos posts partilhados nas redes sociais, é a credibilidade da empresa que está em causa.
Na minha rotina de trabalho a ler e escrever há erros que vejo quase todos os dias. Listei-os para que não o apanhem a si também. Tome nota.
1. Há / à
A confusão entre o há com “h”, presente do verbo haver, e o à, sem “h”, que é a contração da preposição “a” com o artigo definido no feminino singular “a”, atrapalha muita gente. Uma dica que pode ajudar: se for possível substituir a expressão pelo verbo”existir” (sinónimo de haver) ou a frase implicar tempo, devemos usar “há”.
Exemplos: Há várias opções de cor. A empresa funciona há dez anos.
2. Ir de encontro / ir ao encontro de
Vejo muitas vezes este erro em propostas para clientes e emails que se pretendem mais formais, momentos em que não convém mesmo escrever com erros. Mas qual é o problema? Quando escrevemos “ir de encontro” para indicar que estamos em sintonia com a outra parte, estamos na verdade a dizer o contrário. A expressão correta a usar é “ir ao encontro de”.
Exemplo: Esperamos que esta proposta vá de encontro aos seus objetivos (estamos a dizer: seja oposta). Esperamos que esta proposta vá ao encontro dos seus objetivos (forma correta).
3. Há dois anos atrás / Na minha opinião pessoal
Estas redundâncias não são propriamente erros, mas a bem da simplicidade não há necessidade deste reforço. Basta escrever “Há dois anos” ou “Na minha opinião”. Afinal, todas as opiniões são pessoais. As frases ficam mais simples, mais curtas e são entendidas mais facilmente.
4. “Ciclo” vicioso
Esta é mais uma daquelas expressões que se usa em relatórios e documentos quando se quer impressionar. O problema é que a expressão “ciclo vicioso” está errada. A forma correta é “círculo vicioso”.
5. Tivesse / estivesse
A confusão entre o “tivesse” e “estivesse” está no chat do Facebook quando falamos com os nossos amigos, mas infelizmente está também nos posts que muitas marcas fazem na mesma rede. As duas formas estão corretas, mas enquanto “tivesse” deriva do verbo ter, “estivesse” é uma conjugação do verbo estar.
Exemplo: Se eu tivesse mais tempo e estivesse em Lisboa gostaria de sair convosco.
6. “Gratuítamente” /gratuitamente
Os advérbios de modo terminados em “mente” não levam acento. E não há exceções. Portanto, obrigatoriamente, gratuitamente, rapidamente, acentuadamente, facilmente, felizmente, etc. nunca são acentuados. Fácil.
7. ás / às
É comum sermos informados que o melhor horário para a reunião é das 14h “ás” 15h00 ou vermos num site de um restaurante que está aberto das 19h00 “ás” 23h00. “Ás” com acento agudo está relacionado com o universo do jogo (ás de espadas, p. ex.) ou pode ser usado para designar alguém que é muito bom em determinada atividade. Quando nos referimos a espaço ou tempo o acento deve ser grave (às).
Exemplo: Temos reunião das 14h00 às 15h00. Portanto, em horários o acento é sempre grave.
8. “Contatos” / Contactos
Quando visito um site português que tem o item de menu de contactos sem “c” fico logo nervosa. Em Portugal, apesar do acordo ortográfico, contactos mantém o “c”, dado que pronunciamos essa consoante.
9. “Fãn”
Este erro tornou-se muito comum com as redes sociais. As páginas têm fãs e eu posso ser  de alguém ou de alguma coisa. As palavras fãn e fãns não existem. “Fan” e “fans” (sem acento) são palavras em inglês.
10. Fala-se / Falasse
Mais um erro que povoa os chats nas redes sociais, mas infelizmente salta para sites, emails e posts de marcas. Fala-se é uma forma do presente do indicativo e refere-se a uma ação real. Falasse é uma forma do imperfeito do conjuntivo e designa uma ação provável.
Exemplo: Hoje fala-se muito de política, mas gostaria que se falasse mais de economia.
Um truque dos professores de português para não errar: construir a frase na negativa: “Hoje não se fala muito de política. Gostaria que não se falasse de economia”. Se o “se” muda de lugar, significa que é separado por hífen.
E desse lado, como é a sua relação com o português? Há erros que não desculpa?
Elsa Fernandes
Originalmente publicado em www.elsafernandes.com
13
Jun17

De pé

António Garrochinho


O que é certo é que resistir vem do latim. "Resistente" vem de resistere, suportar, resistir, ficar firme. É formado por "re", contra, mais "sistere", que é manter-se de pé. No fundo faz parte da nossa própria evolução, enquanto humanos, mantermo-nos de pé. Sendo uma constante, também não significa que as derrotas não sejam também uma constante ao longo da História: para além de haver vitórias, há também derrotas. 


Notável entrevista (VER ABAIXO )a uma notável antropóloga e historiadora chamada Paula Godinho. Estava a pensar nas eleições britânicas quando a li e fiz uma associação, talvez abusiva, ao percurso de resistência de Corbyn, de resto extensível a Sanders ou a Mélenchon, só para dar mais dois exemplos de políticos grisalhos, com capacidade de mobilização juvenil.

Os seus cabelos brancos são um activo, na realidade: como tantos outros, souberam resistir nas décadas de refluxo de todos os socialismos; ao contrário de tantos outros, talvez mais, numa certa classe, numa certa geração, não desistiram, não se venderam, não foram cooptados. Pelo contrário, mantiveram a esperança num tempo de refluxo.  A esperança é jovem e tem classe.

Os seus programas assinalam uma vontade, que não está naturalmente isenta de contradicções, de regressar à esquerda que fala de sistemas de provisão com princípios socialistas, por exemplo, abolindo barreiras pecuniárias no acesso ao ensino superior ou nacionalizando o que nunca devia ser privado (nacionalizando e não internacionalizando, note-se); assinalam uma vontade de regressar ao pleno emprego com direitos, combatendo a precariedade, ancorando a esquerda firmemente no mundo do trabalho; assinalam uma vontade de enfrentar a mais material de todas as questões, a ambiental. E nenhum deles foi em modismos intelectuais, sem futuro ou ancoragem popular, do género do rendimento básico incondicional. Nenhum deles desdenha o Estado-Nação, porque no fundo sabem que tudo o que não se conquistar aí não se conquista talvez em mais lado nenhum.

Os trabalhistas de Corbyn, os democratas da linha Sanders, a França Insubmissa de Mélencon lideram hoje as oposições nos seus países, recusando o triste fim do movimento, já aqui assinalado. São exemplos políticos revigorantes, com os acertos e os erros de quem está vivo para apostar no socialismo. Há mais por aí. Nunca se desiste.
Adenda cinematográfica. Não por acaso, os populares vídeos da campanha de Corbyn foram feitos por outro velho resistente chamado Ken Loach. Um dos que perdeu o combate contra Thatcher e contra o melhor sinal do seu triunfo, Blair. Um dos que nunca desistiu de filmar com todo o realismo poético. Nos seus filmes, de Terra e Liberdade a Eu, Daniel Blake, há um combate pela memória das lutas e um imenso e confiante desejo de que tenham continuidade, mas também gestos quotidianos de solidariedade que atravessam gerações: da neta de punho erguido no funeral do avô, combatente na guerra civil espanhola, à pungente amizade de Blake com a jovem Katie e os seus dois filhos. Daqui até ao Espírito de 1945 é só um passo. O futuro precisa mesmo de um certo passado.

ladroesdebicicletas.blogspot.pt

Paula Godinho. “A História é uma senhora lenta e a realidade é uma coisa muito rápida”

No livro que lançou, “O Futuro É Para Sempre”, fala das diversas estratégias da resistência e da construção dos tempos 









Paula Godinho é antropóloga, começou por estudar as continuidades. Nos campos, tudo parece repetir-se pela mesma ordem, como as estações e as colheitas, até que um dia, há muito tempo, estava em Trás-os-Montes a falar com uma curandeira e elogia-a: “A senhora sabe tanto, parece uma médica.” Ela começa a chorar e diz-lhe: “Pois é, sei curar muitas doenças, mas não consegui salvar o meu filho, que mo levaram os pides.” Para a antropóloga, isso foi um choque: a última coisa que se espera é que numa aldeia do concelho de Chaves, junto à fronteira, falem da PIDE. “Sobretudo quando se está a falar de papeira”, ironiza. A vida tem continuidades e colheitas, mas também tem momentos de rutura. E foi isso que Paula Godinho começou a estudar. A sua estrada de Damasco foi uma aldeia que acolheu refugiados republicanos espanhóis, foi cercada pela PIDE e teve um terço dos seus habitantes presos.
Há um livro de Althusser, a sua autobiografia, que tem como título: “O Futuro Dura Muito Tempo”. O seu livro tem como título “ O Futuro É Para Sempre”. Tem alguma razão para esse maior otimismo?
Quando se é professora e se tem alunos à frente, é melhor ser-se otimista, ou então é melhor mudarmos para cangalheira. O título do livro tem que ver com uma conjuntura em que o país entristecia. Quem mandava ia-nos dizendo, todos os dias, que o país não tinha futuro. Ora eu, todos os dias, nas aulas, confrontava-me com gente de 20 anos, e aos 20 anos só temos futuro. Por outro lado, comecei a ter a perceção: se calhar, as coisas sempre estiveram lá, mas eu não tinha momento para pensar isso. Apercebi-me de que nas minhas etnografias, ao longo da minha vida de antropóloga, mesmo quando recolhia memórias, o que as pessoas estavam a falar era do futuro. O que elas queriam era inscrever o que me diziam num tempo que pretendiam alongado.
No livro começa-se com uma história de um homem que vai plantar uma árvore sabendo que vai morrer antes de os frutos serem colhidos. Planta essa árvore para o futuro dos outros, mas não temos hoje uma coisa que é o contrário, que é uma aceleração total do presente em que o futuro parece nunca mais acontecer? 
Essa aceleração total do presente, ou essa perceção, provavelmente serve interesses determinados. Quando nós andamos tão acelerados, se calhar não temos tempo para refletir. E refletir é olhar para o tempo longo da História. Esta é uma obra de antropologia e também é uma obra que eu quero inscrita num tempo longo. Há um grande historiador catalão chamado Josep Fontana que, em 2013, publicou um livro chamado: “O Futuro É Um País Estranho”, fazendo alusão a uma outra obra de David Lowenthal chamada “O Passado É Um País Estrangeiro”. A ideia de o futuro ser um país estranho é, para Josep Fontana, uma forma de criticar a situação atual e dizer que o futuro sempre foi uma construção longa, que devemos coisas que conquistamos a gerações anteriores à nossa. Nos próprios trabalhos que eu tinha feito tinha verificado que o futuro era resultado de um tempo longo e que demorava muito tempo a conseguir. Vêm agora dizer-nos que as questões relacionadas com o progresso deixaram de fazer sentido, alegando que, neste Primeiro Mundo, não é possível pensar a humanidade e não há futuro. Enquanto antropóloga, estou preparada para lidar com as diversas culturas do mundo e tenho essa convicção de que o futuro não é um país estranho, mas que, se calhar, é mais fácil de ler numa região, que tenho visitado repetidamente, como a América Latina.
Não acaba por fazer uma espécie de arqueologia das resistências e de formas de resistência que nunca se concretizaram em nenhuma vitória?  
Quando se fala em resistência, e no livro fala-se em três tipos de resistência, temos de nos confrontar com vitórias e derrotas. O que é certo é que resistir vem do latim. “Resistente” vem de resistere, suportar, resistir, ficar firme. É formado por “re”, contra, mais “sistere”, que é manter-se de pé. No fundo faz parte da nossa própria evolução, enquanto humanos, mantermo-nos de pé. Sendo uma constante, também não significa que as derrotas não sejam também uma constante ao longo da História: para além de haver vitórias, há também derrotas. O meu livro, sobretudo numa das etnografias que eu trabalho, sobre o Couço, é um livro que também pretende olhar para as derrotas e o que podemos aprender com elas. Como diz Eduardo Galeano numa frase, que de resto serve de epígrafe ao livro: faz sentido continuar a resgatar as esperanças que fizeram enquanto humanos que resistíssemos; faz sentido interrogar e aprender com as ideias que, como dizia Marx, tinham de ser uma força material. 
Há uma cena na primeira parte do “1900”, realizado por Bertolucci, em que um proprietário de um latifúndio na Emília-Romanha, uma zona semelhante ao Alentejo, se volta para um assalariado rural e insulta-o, dizendo que ele tem as orelhas muito grandes. O camponês olha em desafio para ele, puxa da navalha, corta a sua própria orelha e entrega-a. Há uma geografia e uma história que formatam a resistência e que fazem com que as pessoas no Alentejo sejam diferentes das de outra região?
No livro, eu trato esse proletariado do sul. O que temos é uma camada que ao longo da História não tem memória de ter mantido a posse da terra. Aí existiu - temos dados para o Couço que falam de lutas desde o século xix - uma consciência de classe. Para usarmos os termos marxistas, temos uma classe em si que, num momento determinado, se torna classe para si. Noutros dois contextos do livro, um na Galiza e outro na fronteira que também pertence hoje ao Estado espanhol, estudam-se outras formas de reação. Por razões que se prendem com a estrutura social e fundiária, nesses outros locais, essas classes ou ficaram por construir ou não existiram nesse formato de classe. É o caso do Couto Misto, onde existiam grupos sociais mas não existia classe. Para a população do Couto Misto, uma das estratégias existentes não é a da afronta, ao contrário do Couço que, em momentos determinados, afronta, mas usar a arte da fuga que é o escapismo. Para a população do Couto Misto, ao longo da História - e os primeiros documentos que encontramos na Torre do Tombo datam do século xv -, essa é desde há muito a estratégia. Como se calcula, as aldeias não se chamam a si próprias Couto Misto. Nenhuma aldeia diz, de si, somos povo promíscuo. Ora bem, nessas aldeias do Couto Misto, a forma de resistir longamente foi o escapismo, foi nem sequer quererem ter identidade. A questão da identidade foi muito utilizada na antropologia desde os anos 80, mas ali não faz sentido, porque quanto mais camaleónicos fossem, melhor escapavam. O que é certo é que as três aldeias do Couto Misto viviam melhor que todas as outras na região. Viveram anos e anos sem pagar impostos à coroa de Portugal ou de Espanha. Ou seja, o escapismo era funcional como formato de resistência. No caso de outra etnografia que eu uso, a das costureiras de Verim, a forma de reação é diferente. Cheguei a esse estudo quando me apercebi das fortunas que no Estado espanhol foram construídas com base na costura. Ora eu trabalho aquela fronteira há 30 anos, e toda a vida me tinha confrontado com costureiras, mas imaginava-as - este é o vício do antropólogo - como as modistas de Lisboa, a trabalhar em casa. De facto, elas em Verim trabalham em casa; eu não as imaginava era a fazer 12 a 14 horas de jornada de trabalho e a fazerem os fatos, que hoje todos usamos, para as grandes empresas de pronto-a-vestir. Começo a fazer este trabalho quando me apercebo do papel que estas costureiras têm na constituição das grandes fortunas numa altura em que nos diziam que as grandes riquezas eram apenas acumuladas em processos financeiros e que era tudo plástico. Não era verdade. Ali havia uma acumulação que era devida ao trabalho destas senhoras. Entrevistei estas pessoas num momento da vida em que elas estavam sem emprego porque as grandes empresas externalizaram o trabalho para o Bangladesh, para o Brasil e para Marrocos, e estas senhoras ficaram sem trabalho. Curiosamente, num tempo mais recente, as grandes empresas voltaram a recrutar mão-de-obra local porque esses trabalhadores locais ficaram docilizados depois de anos de desemprego. Note que estas senhoras trabalham, como dizem, “ao negro”: não há descontos para a Segurança Social. E quando há, eles são feitos como “empresárias”. Aliás, no concelho de Verim, na viragem do século, quase toda a gente se dizia empresária.  
Esse trabalho em casa não permite nenhuma consciência de classe.
Aí não há. O termo que uso bebo-o numa grande antropóloga catalã, Susana Narotzky,  que fez com Gavin Smith um trabalho na zona de Alicante em que ali identificaram, para quem produz alpercatas, aquilo a que chamam - o termo é de Foucault - as lutas imediatas, que são aquelas em que, em vez de andarem a confrontar-se com o patrão, procuram um adversário que esteja ao mesmo nível. É a outra trabalhadora que pode ficar com mais trabalho do que ela, numa luta de mulher contra mulher. O inimigo é o inimigo imediato e está ao mesmo nível. É impossível forjar consciência de classe nestas circunstâncias. As mulheres que eu entrevistei são mulheres, inclusivamente, no que toca às entrevistas, que não queriam ser vistas a falar comigo porque eu já tinha sido vista a ir aos sindicatos. E isso podia-lhes prejudicar a quantidade de trabalho que lhes era distribuído. Foi das etnografias mais difíceis da minha vida porque elas desistiam de falar. Mesmo mulheres mais velhas, que tinham estado envolvidas no contrabando, me diziam: “Paula, já te contámos tudo do contrabando, mas isto é mais complicado.” Quando lhes perguntava a razão, elas diziam: “Porque podemos voltar a precisar, e se falarmos podemos ficar excluídas da distribuição do trabalho.” Esta luta de mulher contra mulher, em que o tipo que distribui trabalho é próximo e o patrão está longe, não gera consciência de classe, ao contrário do que se passava no Couço.  No Alentejo, o patrão é o inimigo, é identificável e gera luta, resistência e consciência de classe, que é compaginável com outras formas de resistência no quotidiano, para além do confronto.
Formas que no livro são associadas como a indolência no trabalho, a coscuvilhice, uma certa manha, ao nível daquela  anedota soviética que dizia: “Eles fingem que nos pagam e nós fingimos que trabalhamos.” 
Isso é uma constante para os três formatos (escapismo, lutas imediatas e confronto), aquilo que são as três práticas possíveis que todos nós usamos no nosso quotidiano. É aquilo a que o antropólogo e cientista político norte-americano James C. Scott chama as armas dos fracos. São aquilo a que ele também chama os formatos de discurso escondido. As armas dos fracos fazem com que as pessoas trabalhem mais devagar. Porque iriam fazê-lo mais depressa se vão ganhar o mesmo? As armas dos fracos passam pelo falatório e o boato, que arruínam reputações, passam por realizar mal o trabalho. Por exemplo, um homem recrutado para tirar a cortiça: se ele achar que está mal pago pode fazer com que o sobreiro nunca mais possa dar cortiça, basta dar-lhe o golpe mais fundo. Os patrões tinham de saber lidar muito bem com isso, porque um trabalhador descontente e mal pago pode destruir-lhe os sobreiros. São armas dos fracos porque, no momento em que forem confrontados, os trabalhadores que têm esse tipo de prática vão dizer: “Foi sem querer, não sabia.” A alegada ignorância é também um formato de resistência. Estas formas encarnam aquilo a que chamamos infrapolítica, não se veem à vista desarmada, como os raios infravermelhos. Também aqui há dificuldade em reconhecer a dimensão política destes atos e, todavia, eles são políticos. 
Hoje há um fenómeno diferente. Parece que o surgimento de uma dinâmica nacionalista e identitária impede e tira espaço ao surgimento de outras formas de confronto e contestação que se tornem ideias com força material. 
Olhe-se para o século xix - às vezes, observar o ciclo longo é útil para perceber melhor as coisas. Em 1848 acontecem duas coisas ao mesmo tempo: é a primavera das nações e, também no mesmo ano, sai o Manifesto Comunista, ao mesmo tempo que temos as nações a construir-se - porque o nacionalismo é do século xix, as nações podiam já existir mas não existiam cidadãos nacionais, não havia sequer línguas unificadas nem o reconhecimento de uma história comum. É no século xix que isso tudo vai acontecer.  E ao mesmo tempo surge um movimento de enorme importância que é internacionalista. A força material das ideias pode jogar em vários níveis. Porquê? Porque os campos sociais são elásticos: vamos ver quem ganha. Em certos momentos, uns são derrotados e recuam, e mais tarde podem avançar e ganhar. Este crescendo dos nacionalismos é também compaginável com formatos de resistência que se tornam também transnacionais. Agora, é verdade que a resistência, neste momento, não está no seu melhor.
Tem uma passagem do livro em que contesta um certo soberanismo e o regresso à determinação política das coisas no espaço nacional. Esse não é o único caminho possível contra um ultraglobalismo que é ditado por forças não democráticas dos mercados financeiros?
Esse é um caminho, mas não é o único. Há alguns anos, estava a ler etnografias sobre a Costa Rica em que o campesinato, para resistir à imposição da monocultura por empresas multinacionais que o fragiliza, cria ligas transnacionais de enorme importância. Temos movimentos a acontecer, tal como em 1848. 
Isso é contraditório com o aparente facto de que, nos sítios em que a esquerda à esquerda da social-democracia resiste melhor, cruza questões de classe com questões nacionais: é o caso da Irlanda, Catalunha, País Basco - até, de alguma forma, a teorização pelo Podemos da construção de um povo. E, simultaneamente, a aposta do cosmopolitismo parece casar bem pare certos setores intelectuais, como para a grande finança.
Aí casa outro fenómeno. Dizia há pouco que as nações são construídas a partir do século xix. Algumas, porque a correlação de forças não foi tão favorável, ficaram sem constituir-se como Estado-nação. E não podemos falar das nações como de futebol, que se divide em várias ligas. Não houve umas que conseguiram no século xix, e essas merecem, e outras que não conseguiram e seriam relegadas para uma segunda liga. Há, de facto, quem esteja a lutar ao mesmo tempo, vigorosamente, pelo seu direito a ser Estado-nação e não o faça a partir de um perfil conservador. Há quem não entenda que, nesse processo, todos os outros povos são inimigos. Quando se olha, por exemplo, para projetos de construção de nação como a Galiza, Catalunha e País Basco, percebe-se que os formatos de construção da nação não tem necessariamente de fazer um discurso em que os outros povos são vistos como inimigos.
No caso basco, o início do movimento nacionalista no século xix, com Sabino Arana, faz um discurso racista. Só no século xx é que as correntes abertzales (patrióticas), que se constituem em torno da ETA,  fazem um discurso não racista, dizendo que são bascos todos os que lá vivem.
Não conheço tão bem o nacionalismo basco. Conheço bem a Galiza. Mas pode--se dizer que é possível que gente, que tem a uni-la uma consciência de classe, considere que a construção de uma nação lhes pode ser útil para o reconhecimento dessa mesma consciência de classe.
Do ponto de vista da autodeterminação das pessoas, mas do ponto de vista de classe não pode fazer esconder este e tecer uma ilusão?
Uma coisa é o que nós gostaríamos que a força material das ideias concretizasse, outra é o que a realidade nos mostra. A História é, de facto, uma senhora lenta, como Eduardo Galeano nos mostra. É uma senhora que se move com lentidão; a realidade, às vezes, é muito mais rápida. E é difícil compaginar as duas. Quando olhamos o assunto de fora e à distância, além do tempo, podíamos pensar: “Isto podia ser tido assim.” Mas o que é facto é que não foi. 
 Havendo neste mundo condições reais cada vez mais desiguais, por que razão não há essa resposta?
Vai havendo, em nichos, mas o que se passa é que também temos meios hegemónicos que são poderosíssimos. Neste momento voltei a dar uma cadeira na faculdade que é Antropologia e Movimentos Sociais. A última vez que tinha dado foi em 2012, e nessa altura estávamos em Portugal sob o domínio de três entidades em que ninguém tinha votado [FMI, BCE, Comissão Europeia], mas que tinham desenvolvido um programa económico e político que nos fazia sofrer a todos. E eu trazia aos alunos extratos de telejornais, intervenções dos comentadores, dessas autênticas fábricas do consentimento que íamos tendo. Era o voltar a realidade ao contrário. Marx dizia que a ideologia era como a câmara escura, com a realidade virada do avesso. E isso passou a ser uma constante: todos os dias passavam nas televisões comentadores completamente alinhados, com pensamentos iguais. Essa terceira janela, como lhe chamou Paul Virilio, que é a televisão, tem esse papel. É claro que existem outros meios de chegar às pessoas, mas estas fábricas de consentimento têm um poder muito significativo. É evidente que é necessário criar contra-hegemonias, é importante que essa força material das ideias se erga também a partir daqueles para quem esses formatos da dominação merecem ser denunciados num tempo como este, como dizia o movimento Occupy Wall Street, em que são mesmo 99% contra 1%.  Quem o diz não é uma perigosa revista anarquista nem sou eu, mas a revista “Forbes”.  
Antigamente, o conceito de ideologia pressupunha a existência de uma ilusão. Retirada essa ilusão, as pessoas percebiam a realidade e ganhavam consciência do seu papel para a alterar. Hoje, toda a gente sabe que há 1% de muito ricos, com quase metade do rendimento, e 99% com o resto, mas isso não altera nada. Não há é ideia de que é possível mudar.
Eu, no livro, incluo três etnografias porque temos, na realidade, situações muito diversas. Há situações dos muitos que andam consigo no metropolitano, em escapismo, a tentar escapar-se, e não estou a falar necessariamente em imigrantes clandestinos; depois há aqueles que andam em lutas imediatas contra gente que acham que os pode prejudicar; e, finalmente, há alguns que se encontram noutra situação e que pensam que a mudança das suas circunstâncias passaria por uma ação determinada. Temos todas estas situações. O que se passa é que não se conseguiu até agora fazer crer a parte significativa da população que, se calhar, a resposta do escapismo e das lutas imediatas não é a melhor. Isso acontece porque as condições em que as pessoas vivem não as encaminham para formatos mais coletivos. Lembre-se das grandes manifestações que se fizeram contra a troika - e depois, depois o que é que fica? E como gerimos as derrotas e olhamos para elas e para os tempos que se seguem? Porque fomos derrotados? Sabemos as razões? É isso que é importante pensar.



ionline.sapo.pt
13
Jun17

O cavalo da vida (um poema que já foi prosa)

António Garrochinho




O PROBLEMA
(...)
Nesta nossa passagem
para a outra margem,
convém amar afetuosamente um barco,
ou um remo,
ou uma bóia,
ou muitas bóias,
ou muitos barcos.
Todas as pessoas
a quem podermos lançar a mão,
que lancemos, para lhes dar um abraço;
a todos aqueles que de algum modo caminham,
ou nadam,
ou velejam junto a nós,
na travessia,
devemos nós prender a mão.
Que nunca nos larguem
os amigos, os irmãos, os filhos.
Porque vede: as pessoas perdem-se.

O cavalo da vida, enorme, torna-se furioso,
e consome-nos na solidão.
E é um grande problema
quando só vemos o grande cavalo na velhice,
quando o vozeirão se apaga e o ego esmorece.

'Não tomo conta de ti'.
Cuidai, enquanto é tempo*.


Uva Passa, "OProblema"
Eu cuido
conversavinagrada.blogspot.pt
13
Jun17

sou

António Garrochinho

sou António e não sou santo
não tenho coroa nem manto
vim da terra assombrada
gosto de poesia e do canto
e com a cultura me encanto
e fiz dela a minha amada

não tenho raízes fidalgas ou nobres
sou da origem dos pobres
mas tenho honra e carácter
sou português aqui
e no Algarve nasci
Portugal é a minha terra mater

nas estradas da vida aprendi
e também nos livros que li
o meu porte e conduta
sou solidário, altruísta
sou livre, sou comunista
e não viro a cara à luta


António Garrochinho
13
Jun17

Portugal é o maior exportador de bicicletas da União Europeia

António Garrochinho


No mês em que a bicicleta comemora 200 anos, o Eurostat fez um balanço sobre as importações e exportações deste meio de transporte na União Europeia. Portugal foi o maior exportador, em 2016.
Portugal é o maior exportador de bicicletas da União Europeia

Em 2016, os países da União Europeia exportaram um total de 11 milhões de bicicletas e importaram 17 milhões, segundo os dados do Eurostat.

Portugal lidera o "ranking" dos maiores exportadores de bicicletas da União Europeia, sendo responsável pela exportação de 15% das bicicletas exportadas entre os 29 estados-membro, revelou esta segunda-feira, 12 de Junho, o Eurostat numa nota publicada no âmbito das comemorações dos 200 anos deste meio de transporte. O segundo maior exportador é Itália (14%) e o terceiro os Países Baixos (13%).

Do total das bicicletas exportadas por países da União Europeia, 92% foram compradas por outros países da região, sendo o Reino Unido o líder das importações.

O Reino Unido compra 18% das bicicletas fabricadas pelos países da União Europeia.

Os restantes veículos são exportados para fora da UE, com a Suíça a representar 15% das bicicletas exportadas para fora da região, seguida pelos EUA (11%) e a Rússia (7%).

De fora da União Europeia chegam 42% das bicicletas, com Taiwan a liderar, representando 24% das bicicletas importadas de países fora da região.


www.jornaldenegocios.pt
13
Jun17

Alfonsiva e o mar - vídeo e poema em português

António Garrochinho



Alfonsina e o Mar

Pela branda areia que lambe o mar
Sua pequena pegada não volta mais
Um caminho sozinho de pena e silêncio chegou
Até a água profunda
Um caminho sozinho de penas mudas chegou
Até a espuma
Só Deus sabe a angústia que te acompanhou
Que dores antigas calaram tua voz
Para que se recostasse embalada no canto
Das conchas marinhas
A canção que canta no fundo escuro do mar
A concha
Lá vai Alfonsina com tua solidão
Que poemas novos foste buscar?
Uma voz antiga de vento e sal
Te elogia a alma e a vai levando
E te vás para lá como nos sonhos
Adormecida, Alfonsina, vestida de mar
Cinco sereias te levaram
Por caminhos de algas e coral
E fosforescentes cavalos marinhos
Passearão ao teu redor
E os habitantes da água brincarão
Ao seu lado
Baixe a lâmpada um pouco mais
Enfermeira, deixe-me dormir em paz
E se chamarem diga que não estou
Diga que Alfonsina não volta mais
E se chamarem diga que não estou
Diga que fui embora
Lá vai Alfonsina com tua solidão
Que poemas novos foste buscar?
Uma voz antiga de vento e sal
Te elogia a alma e a vai levando
E te vás para lá como nos sonhos
Adormecida, Alfonsina, vestida de mar
13
Jun17

13 de Junho de 1654: O Padre António Vieira prega o "Sermão de Santo António aos Peixes"

António Garrochinho


Peça oratória de Padre António Vieira, proferida três dias antes do jesuíta partir para Lisboa, na cidade de São Luís do Maranhão (Brasil) em 1654, na sequência dos litígios entre jesuítas e colonos do Brasil, por causa da escravização dos índios.

Construindo o sermão sob a forma de alegoria, Vieira faz considerações sobre virtudes e vícios humanos. Esta oratória apresenta uma construção literária e argumentativa notáveis. Fina ironia e forte sátira percorrem o texto assim como uma exuberante linguagem barroca, rica de sugestões alegóricas e de recursos estilísticos.

As partes constituintes do sermão são o exórdio, a invocação, a exposição ou informação, a confirmação e a peroração. 

No exórdio, Pe. António Vieira parte do conceito predicável "Vós sois o sal da terra". E, tal como Santo António,também ele dirige a sua palavra aos peixes, dado que não é ouvido pelos homens. 

Segue-se a invocação à Virgem Maria.

Durante a exposição ou informação, Pe. António Vieira explica as propriedades do sal e, por paralelismo, a importância das pregações para salvar os homens. Louva depois as virtudes dos peixes e repreende, em seguida,os seus vícios. 

Na confirmação, apresenta as qualidades dos peixes: o santo peixe de Tobias tem o dom de sarar da cegueira e repelir os demónios; a rémora tem força e poder; o torpedo possui a faculdade de eletrizar; o quatro-olhos tem a capacidade de vigiar. 

Na segunda parte da confirmação, Pe. António Vieira indica, primeiramente, numa visão de conjunto, os defeitos dos peixes. Em seguida, particulariza a crítica: os roncadores são convencidos e soberbos; os pegadores,parasitas e oportunistas; os voadores, ambiciosos e presunçosos; o polvo, hipócrita e traidor, contrapondo-se a Santo António, modelo de candura, sinceridade e verdade.

Na peroração ou epílogo, o pregador faz uma última advertência aos peixes. Exorta-os a sacrificarem a Deus o respeito e a reverência. 

Antes de terminar o sermão, com um admirável hino de louvor, Pe. António Vieira confessa-se pecador, em oposição aos peixes.

Sermão de Santo António aos Peixes. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013.
wikipedia (Imagens)
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Padre António Vieira
Santo António pregando aos peixes
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13
Jun17

13 de Junho de 1908: Nasce Maria Helena Vieira da Silva

António Garrochinho


Natural de Lisboa, onde nasceu no dia 13 de Junho de 1908, Maria Helena Vieira da Silva instala-se definitivamente em Paris em 1928. Aí descobre a cor, em Matisse e Bonnard, e uma toalha aos quadrados, que retém de um pormenor de um quadro deste último, haveria de entrar em ressonância com a sua própria pintura.Inspira-se ainda em Paul Klee e frequenta, com o marido, Arpad Szenes, as aulas de Roger Bissière, pintor pós-cubista. O início da maturidade da sua obra pode datar-se a partir do quadro Pont transbordeur (1931). Nesta época são já patentes os elementos que hão de definir a sua pesquisa estética: uma conceção do espaço anti-renascentista, ao não assumir o volume ou a perspetiva como um fim em si, e uma conceção da pintura como"escrita", repetindo elementos, quadriláteros ou círculos, percorrendo as tramas das famosas Bibliotecas e Florestas. O mundo exterior surge neste universo através da cor e da luz, e frequentemente a memória da luz e dos azulejos lisboetas habitará as suas telas. Durante a Segunda Guerra Mundial partiu para o Brasil e nos quadros da época instala-se a angústia de um espaço povoado de criaturas fugazes e encurraladas. Guerra ou O Desastre (1942) é sem dúvida o quadro mais representativo destes tempos conturbados. Ao voltar para Paris,Vieira da Silva vê a sua reputação aumentar. O prémio da Bienal de São Paulo (1962) vem coroar um trabalho seguido atentamente pelo meio cultural português. Seguem-se as exposições, as retrospetivas, as consagrações.A sua pintura esteve patente, designadamente, na Europália, em Bruxelas, em 1992. Esse foi, precisamente, o ano da sua morte.   

Vieira da Silva. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012.
Fundação Calouste Gulbenkian
  
Le désastre ou La guerre
 A Biblioteca - Maria Helena Vieira da Silva

13
Jun17

13 de Junho de 1888 : Nasce Fernando Pessoa

António Garrochinho


Poeta, ficcionista, dramaturgo, filósofo, prosador, Fernando Pessoa é, inequivocamente, a mais complexa personalidade literária portuguesa e europeia do século XX. Após a morte do pai, partiu com sete anos para a África do Sul onde o seu padrasto ocupava o cargo de cônsul interino. Durante os dez anos que aí viveu, realizou com distinção os estudos liceais e redigiu alguns dos seus primeiros textos poéticos, atribuídos a pseudónimos,entre os quais se salienta o de Alexander Search. Com dezassete anos, abandona a família e regressa a Portugal,com a intenção de ingressar no Curso Superior de Letras. Em Lisboa, acaba por abandonar os estudos, sobrevive como correspondente comercial de inglês e dedica-se a uma vida literária intensa. Desenvolve colaboração com publicações (algumas delas dirigidas por si) como A República, Teatro, A Águia, A Renascença, Eh Real, O Jornal,A Capital, Exílio, Centauro, Portugal Futurista, Athena, Contemporânea, Revista Portuguesa, Presença, O Imparcial, O Mundo Português, Sudoeste, Momento. Com Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros, entre outros,leva, em 1915, a cabo o projeto de Orpheu, revista que assinala a afirmação do modernismo português e cujo impacto cultural e literário só pôde cabalmente ser avaliado por gerações posteriores. Tendo publicado em vida,em volume, apenas os seus poemas ingleses e o poema épico Mensagem, a bibliografia que legou à contemporaneidade é de tal forma extensa que o conhecimento da sua obra se encontra em curso, sendo alargado ou aprofundado à medida que vão saindo para o prelo os textos que integram um vastíssimo espólio. Mais do que a dimensão dessa obra, cujos contornos ainda não são completamente conhecidos, profícua em projetos literários,em esboços de planos, em versões de textos, em interpretações e reflexões sobre si mesma, impõe-se, porém, a complexidade filosófica e literária de que se reveste. Dificilmente se pode chegar a sínteses simplistas diante de um autor que, além da obra assinada com o seu próprio nome, criou vários autores aparentemente autónomos e quase com existência real, os heterónimos, de que se destacam - o seu número eleva-se às dezenas - Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro, cada um deles portador de uma identidade própria; de uma arte poética distinta; de uma evolução literária pessoal e ainda capazes de comentar as relações literárias e pessoais que estabelecem entre si. A esta poderosa mistificação acresce ainda a obra multifacetada do seu criador, que recobre vários géneros (teatro, poesia lírica e épica, prosa doutrinária e filosófica, teorização literária, narrativa policial,etc.), vários interesses (ocultismo, nacionalismo, misticismo, etc.) e várias correntes literárias (todas por si criadas e teorizadas, como o paulismo, o intersecionismo ou o sensacionismo). Elevando-se aos milhares de milhares as páginas já publicadas sobre a obra de Fernando Pessoa, e, muito particularmente, sobre o fenómeno da heteronímia, uma das premissas a ter em conta quando se aborda o universo pessoano é, como alerta Eduardo Lourenço, não cair no equívoco de "tomar Caeiro, Campos e Reis como fragmentos de uma totalidade que convenientemente interpretados e lidos permitiriam reconstituí-la ou pelo menos entrever o seu perfil global. A verdade é mais simples: os heterónimos são a Totalidade fragmentada [...]. Por isso mesmo e por essência não têm leitura individual, mas igualmente não têm dialéctica senão na luz dessa Totalidade de que não são partes,mas plurais e hierarquizadas maneiras de uma única e decisiva fragmentação. (p. 31) Avaliando a posteriori o significado global dessa aventura literária extraordinária revestem-se de particular relevo, como aspetos subjacentes a essas múltiplas realizações e a essa Totalidade entrevista, entre outros, o sentido de construtividade do poema (ou melhor, dos sistemas poéticos) e a capacidade de despersonalização obtida pela relação de reciprocidade estabelecida entre intelectualização e emoção. Nessa medida, a obra de Fernando Pessoa constitui uma referência incontornável no processo que conduz à afirmação da modernidade, nomeadamente pela subordinação da criação literária a um processo de fingimento que, segundo Fernando Guimarães, "representa o esbatimento da subjetividade que conduzirá à poesia dramática dos heterónimos, à procura da complexidade entendida como emocionalização de uma ideia e intelectualização de uma emoção, à admissão da essencialidade expressiva da arte" bem como à "valorização da própria estrutura das realizações literárias" (cf. O Modernismo Português e a sua Poética, Porto, Lello, 1999, p. 61). Deste modo, a poesia de Fernando Pessoa "Traçou pela sua própria existência o quadro dentro do qual se move a dialética mesma da nossa Modernidade", constituindo a matriz de uma filiação textual particularmente nítida à medida que a sua obra, e a dos heterónimos, ia, ao longo da década de 40, sendo descoberta e editada, a tal ponto que, a partir da sua aventura poética, se tornou impossível"escrever poesia como se a sua experiência não tivesse tido lugar." (LOURENÇO, Eduardo, cit. por MARTINHO,Fernando J. B. - Pessoa e a Moderna Poesia Portuguesa - do "Orpheu" a 1960, Lisboa, 1983, p. 157.)

Fernando Pessoa. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012.
wikipedia (Imagens)

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Fernando Pessoa em 1914
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"Fernando Pessoa em flagrante delitro": dedicatória na fotografia que ofereceu à namorada Ophélia Queiroz em 1929


Não sei quantas almas tenho
Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.


Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.


13
Jun17

França

António Garrochinho



A lei eleitoral francesa , construida pelas forças dominantes para se perpetuarem no  poder vai conduzir após a segunda volta , com grande probabilidade , tendo em conta as hesitações de uns e de outros , o sectarismo de uns tantos e a ausência de regras claras de desistência em favor de candidatos da oposição melhor colocados, que um partido que obteve 30% dos sufrágios venha a dispor de mais de 70% do deputados .
Quanto à representatividade, 30% de sufrágios , com 51% de abstenção significa apenas 15% do universo eleitoral .
 É esta a dita "maré cheia " que enche de jubilo os nossos comentadores caseiros beatos do Europeísmo  como se pode ver no Público de ontem, do  tipo Rui Tavares que entende que a dicotomia - talvez a acertar contas com o Bloco - é entre querer "salvar o projecto europeu ou antecipar o seu colapso  ", ou do tipo Diogo Queiroz de Andrade - digno do patrão Belmiro - que tira uma conclusão para as esquerdas- à maneira de Assis e Rangel : é preciso " mais competência e mais pragmatismo-algo em que Emmanuel Macron- revelou ser exemplar.
 Nada mais !!!. 
Pacheco Pereira no mesmo Jornal , dá-lhes em parte a resposta no" Corso , Ricorso ".
Para os que diziam que Macron não tinha tempo para formar um partido (movimento ) capaz de agregar uma maioria vê-se que tinham razão os que dizima ser claramente possível , lembrando entre outros exemplos - salvaguardando as diferenças históricas . o caso do PRD .
Com a mesma política de Hollande como tudo indica e com o albergue espanhol que é o seu Movimento não se antevê grande futuro para os trabalhadores , para o povo e para a superação dos problemas da UE.

foicebook.blogspot.pt
13
Jun17

Revolta da Amélia | “O COSTA E A GERINGONÇA QUE VÃO À MERDA!”

António Garrochinho




Feriado em Lisboa. Dia de Santo António (e ele não era nem é de Pádua). Não se come nem se bebe à fartazana. As sardinhas estão muito caras e o restante também. Os plebeus quase que nem ao preço do pão podem chegar. E sardinhas sem pão é como ter uma namorada que no corpo e na voz sai ao pai. Apesar da “crise” houve marchas em Lisboa. E arraiais. Escorreu por aí algum dinheiro para os que negociaram. Gente que também anda de cinto apertado. Viu-se isso nos bairros. Mas, senhor António Costa, senhores do PS, vocês andam a serrar presunto porque estão distraídos ou então fazem-no por desonestidade de vários tipos – entre as quais faltar à palavra, às promessas. Vocemecês já estão a ir demasiado para o centrão mas a governar a contar com o apoio de esquerda. Sabemos que os do malfadado arco da governação funcionam assim mas esta era a hora de perderem os vícios de deixarem de se abraçar aos que nos sugam até mais não poderem só porque deixamos de respirar de tanto sufoco.

Então e os offshores… Ah, este e aqueloutro pode ser, aqueles acolá é que não… Porra! Imaginem que uns quantos tipos roubam, assaltam bancos e etc. e depois vão metê-lo nos offshores. E é o que acontece, mais coisa menos coisa é assim. Mas vós, ditos socialistas, estão com fé no processo. Podem baldar-se com as massas para os offshores que nós indicamos. Que raio, isso é quase o papel do receptador nos crimes da plebe que abunda nas prisões. Os perrapados, já se vê.

Mas não é só nisto que o PS, e Costa, anda a meter os pés pelas mãos e a baralhar-se limpando os lábios quando defeca. Enunciar seria fastidioso e a boa-vontade em acreditar num PS à esquerda está a terminar. Vejam lá as multas para os que não têm dinheiro para pagarem os transportes. Valores de centenas de euros por causa da inexistência de um título de transporte que custa 2 euros? E já pensaram que os que não pagam é porque não têm emprego, não têm dinheiro, mas têm de se deslocar para ir a entrevistas, entregar currículos, labutar para encontrar emprego? E depois no primeiro mês, se encontrarem emprego, onde têm o dinheiro para comprar o passe de transporte? Vão a pé? Quilómetros e quilómetros? Pois. Isso é sempre muito fácil de dizer e aos burocratas de decidir porque andam em automóveis pagos por todos nós, com gasolina paga por todos nós, com motoristas pagos por todos nós. Que salvaguarda têm os desempregados? E os velhos com reformas de miséria mas que têm de andar em transportes públicos, ir a médicos, aos hospitais, fazer exames aqui e ali… Pois. Como ainda há dias dizia a senhora Amélia, idosa educada enquanto não lhe chega a mostarda ao nariz: “O Costa e a Geringonça que vão à merda, cada vez se estão a parecer mais com o Passos, o Portas e o Cavaco”.

Como diriam os plebeus que andam a ficar desiludidos: "Pois é, Costa. Aprende, que a vida custa, Costa. Ou isso, ou serás promovido a manjerico do arco da governação. E a luta continua também contra um PS que é do centro e da direita. Que só desonestamente se afirma socialista."

Senhor Costa, mire-se no exemplo do PS francês. Pois.


Pronto. Chega, por agora.

MM | PG


paginaglobal.blogspot.pt

13
Jun17

FLORES ESPECTACULARES PARECEM TER O UNIVERSO ESTAMPADO NAS SUAS PÉTALAS

António Garrochinho
Com seus muitos padrões, cores, formas e tamanhos diferentes, não é incomum contemplar uma planta peculiar e perceber que ela lembra algo completamente diferente. Uma flor que levou este fenômeno para o próximo nível é uma petúnia conhecida como Céu Noturno, uma flor roxa linda que parece ter as galáxias estampadas em suas pétalas, literalmente. Alguns sites indicam que é cientificamente conhecida como Petunia cultivars, só que não consegui encontrar correspondência desta espécie e tudo leva a crer que é mesmo uma Petunia × hybrida.

Flores espetaculares parecem ter o universo estampado em suas pétalas
O caso é que a flor cósmica possui marcas únicas que relembram um céu estrelado. Cada planta única possui cachos de flores roxas manchadas de pontos brancos luminosos que se parecem com corpos celestes. Esta característica hipnotizante fez da Petúnia do Céu Noturno uma planta particularmente popular entre os jardineiros e entusiastas de flores.

Então, o que causa esses padrões etéreos? Segundo a loja de botânica Burpee, as cores variadas são produto de uma grande variação entre as temperaturas diurnas e noturnas, que provoca a formação de corantes temporários nas flores. Assim, para garantir que as suas Petúnias do Céu Noturno estejam sempre brilhando, você deve tentar mantê-las quentes durante o dia (cerca de 37ºC) e arrefecer a noite (cerca de 12°C).

Se você quiser tentar cultivar a sua própria petúnia das galáxias, busque no Google, Amazon, Ebay, AliExpress e outros por suas sementes com as seguintes palavras chaves "Night Sky Petúnia Seed".
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Via: Chicory8892
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Via: Breezer102
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Via: RainbowJaguar
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Via: Wild day lilies
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Via: Magpie feathers
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Via: J. Parker

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13
Jun17

As multas antigas por transgressões nos transportes públicos que não são cobradas desde janeiro de 2014 poderão ser pagas voluntariamente com desconto de 75%. O Governo

António Garrochinho
Há mais de 57 milhões em coimas nos operadores por cobrar e Governo vai mudar lei para permitir pagamentos voluntários.
As multas antigas por transgressões nos transportes públicos que não são cobradas desde janeiro de 2014 poderão ser pagas voluntariamente com desconto de 75%. O Governo, que vai alterar o regime instituído pelo Executivo de Passos Coelho, dará aos operadores três meses para notificarem os clientes, apanhados a viajar sem bilhete válido nos últimos três anos e meio. Os infratores terão a oportunidade de regularizar a situação, a custo muito mais baixo.

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13
Jun17

INTERVENÇÃO DE RITA RATO NA ASSEMBLEIA DE REPÚBLICA «O combate à precariedade não se faz de palavras, faz-se de medidas concretas»

António Garrochinho



Sr. Presidente, Sr. Deputados,
Um contrato a termo, é, como de resto o próprio nome indica, para uma necessidade a prazo ou limitada no tempo.
É, ou pelo menos deveria ser.
Porque na verdade, no nosso país, o uso abusivo da contratação a prazo para responder a necessidades permanentes das empresas é o pão nosso de cada dia.
Empresas de trabalho temporário, como de resto o próprio nome indica, deveriam existir apenas para responder a necessidades transitórias ou provisórias de actividade de outras empresas a quem prestam serviços.
Deveriam, mas não. O recurso a empresas de trabalho temporário e ao regime de out-sourcing para responder a necessidades permanentes de outras empresas a quem prestam serviços é uma realidade crescente atingindo mais de 100 mil trabalhadores e um volume de negócio de 1.2 mil milhões de euros em 2010.
Será aceitável que uma empresa apenas por estar a iniciar actividade contrate todos os seus trabalhadores através de um vínculo precário?
Será aceitável que um jovem, apenas por ser jovem possa ser contratado através de um contrato a prazo, mesmo que responda a necessidades permanentes de uma empresa até 9 anos e depois confrontado com a não renovação do contrato e despedimento?
Como aconteceu a 170 trabalhadores do Call Center da PT quando foi comparada pelo Oi?
Será aceitável que um trabalhador desempregado de longa duração, apenas por estar desempregado possa ser contratado através de um contrato a prazo, mesmo que responda a necessidades permanentes de uma empresa?
Será aceitável a uma cadeia de hotéis de luxo despedir trabalhadores do quadro e subcontratar trabalhadores, através de empresas de trabalho temporário, para realizar exactamente o mesmo trabalho, que de temporário nada tem mas sim de funcionamento diário? Como tem acontecido no Ritz em Lisboa.
Será aceitável que grupos económicos do sector da energia, telecomunicações, praticamente não tenham trabalhadores no quadro e subcontratem através de empresas de trabalho temporário, os trabalhadores que todos os dias lhes amassam os lucros, no apoio ao cliente, facturação, avarias…? Como nos Call Centers da EDP onde existem trabalhadores nestas condições há mais de 25 anos?
Não, senhores deputados, não é aceitável.
E a opção por estas formas de precariedade tem apenas uma justificação: pagar salários mais baixos e com menos direitos.
Sr. Presidente, Sr. Deputados,
A precariedade não é de hoje nem de ontem, mas nos últimos anos conheceu agravamentos inquestionáveis:
Um estudo recentemente divulgado pelo Observatório sobre Crises e Alternativas (CES/UC) confirma o que os dados do INE e outras fontes já vinham apontando: a recuperação do emprego está a ser feita com uma maior generalização da precariedade.
Apesar de a criação de emprego não ser ainda suficiente para recuperar para os valores anteriores a 2008, o peso dos contratos sem termo a tempo inteiro nos novos contratos não chegava a 20% até 2015.
Apesar de uma evolução positiva no último ano e meio, os contratos efectivos representam apenas um terço nas novas contratações.
O restante corresponde a vários tipos de contratos precários e, uma parcela marginal, a trabalhadores contratados sem termo a tempo parcial.
Do universo de contratos em vigor e que foram assinados depois de Novembro de 2013, mais de metade são precários – a termo certo (45%) ou a termo incerto (18,4%).
Os dados sobre as remunerações mostram que os salários dos trabalhadores com contratos precários são, em média, de 600 euros – um valor que se aproxima ainda mais do salário mínimo nacional quando se trata de trabalho temporário.
Na verdade, pelas piores razões estes dados não são surpreendentes.
Este é o resultado de sucessivas alterações à legislação laboral.
Pagar menos por mais trabalho e menos direitos, foi o verdadeiro objectivo de sucessivas alterações às leis laborais (sempre para pior) e em particular a anterior promovida por PSD e CDS.
É esse objectivo que está na base da estratégia de substituição de trabalhadores com direitos por trabalhadores sem direitos.
A excepção transformou-se em regra e a precariedade na realidade de todos os dias:
contratos a prazo, falsos recibos verdes, trabalho temporário, out-sourcing, estágios profissionais, bolsas de formação e investigação, contratos de emprego-inserção.
Porque o que alguns apresentam e anunciam como “reformas de sucesso” é a instabilidade e o empobrecimento de milhares de trabalhadores no nosso país.
Não há como esconder e iludir:
A precariedade de muitos representa os lucros escandalosos de alguns.
Veja-se o caso da EDP, PT, SONAE, Jerónimo Martins, NOS, Vodafone, entre outros.
Sr. Presidente, Sr. Deputados,
É de elementar justiça garantir que a um posto de trabalho permanente corresponda um vínculo efectivo.
A alternativa ao desemprego não é a precariedade, mas sim o emprego com direitos.
E o combate à precariedade deve ser colocado ao nível do compromisso do Estado, como se fez no passado com a erradicação do trabalho infantil.
Por isso mesmo, o PCP apresenta hoje propostas de combate efectivo à precariedade:
- Facilitar o reconhecimento do contrato de trabalho e reforçar os direitos dos trabalhadores;
- Reduzir as situações em que é possível recorrer à contratação a termo;
- Extinguir os contratos especiais de muito curta duração;
- Aumentar o período em que a entidade patronal fica impedida de proceder a novas admissões através de contrato a termo ou temporário, para as mesmas funções desempenhadas, impedindo a substituição de trabalhadores para necessidades permanentes;
- Reduzir a duração do contrato a termo certo e incerto para o máximo de 3 anos, incluindo renovações, não podendo ser renovado mais do que duas vezes;
- Impedir o recurso a empresas de trabalho temporário e garantir a contratação directa com direitos, quando se trata de necessidades permanentes da empresa a quem é prestado serviço;
- Penalizar através de sanções económicas, fiscais e contributivas as entidades patronais que recorram a formas de contratação precária.
O combate à precariedade não se faz de palavras, faz-se de medidas concretas.
A defesa do emprego com direitos obriga a tomar medidas efectivas de valorização do trabalho e dos direitos dos trabalhadores e este é um combate inadiável.
Disse.


www.pcp.pt
13
Jun17

Nota do Gabinete de Imprensa do PCP Sobre as opções do Governo para o conselho de administração da TAP

António Garrochinho

A TAP, uma empresa estratégica no plano nacional, responsável por uma parte significativa das exportações, incluindo no turismo, assume um papel determinante na coesão do território e na ligação à diáspora. Foi tudo isto que o anterior governo pôs em causa quando, já numa situação em que se encontrava demitido, procedeu à privatização de 66% da empresa, entregando-a a uma multinacional brasileira - AZUL, tal como entregou outras importantes empresas estratégicas ao capital estrangeiro de que é exemplo a ANA aeroportos, condicionando assim o futuro da TAP e de todo o sector da aviação civil.
A reversão parcial da privatização da TAP (ficando o Estado com 50%) adoptada pelo Governo PS, no quadro da nova fase da vida política nacional, não respondeu ao que a defesa do interesse nacional exigia: a recuperação do controlo público total da empresa, desenvolvendo-a, modernizando-a e colocando-a ao serviço do País.
Para o PCP, a escolha dos representantes do Estado quer para altos cargos da administração pública, quer para as empresas do sector público empresarial, quer ainda para empresas, como a TAP, onde o Estado assume elevadas responsabilidades, deve ser ditada pela defesa dos interesses nacionais.
Os nomes indicados para a TAP, onde se inclui Miguel Frasquilho, quadro do PSD que esteve ligado ao BES e à política de privatizações de anteriores governos ou de Lacerda Machado ligado a discutíveis opções de gestão da TAP, entre outros, merece crítica do PCP, tal como mereceu a nomeação de Paulo Macedo, antigo ministro do PSD para a Caixa Geral de Depósitos.
O PCP reafirma que a opção de defesa do interesse público, designadamente no sector da aviação civil exige uma outra política que enfrente os interesses do capital monopolista, sejam os da AZUL na TAP, sejam os da Vinci nos aeroportos nacionais e pressupõe também a escolha de pessoas que dêem essas garantias.

Foto de Cecília Dias.

13
Jun17

Tribunal Constitucional. Moreira não declarou interesses na Selminho

António Garrochinho


Moreira defende que a declaração entregue no Constitucional está correta e que “teria mentido” se dissesse que era sócio da Selminho
Autarca tinha participação indireta em empresa imobiliária familiar que já estava em litígio com município quando foi eleito

No momento em que Rui Moreira chegou à Câmara Municipal do Porto, a 22 de outubro de 2013, a empresa da sua família Selminho Imobiliária já mantinha um litígio com a autarquia portuense, desde 2005, mas o presidente da Câmara recém-eleito não declarou explicitamente esses interesses na declaração de rendimentos que deu entrada a 18 de dezembro de 2013 no Tribunal Constitucional (TC). Segundo o seu assessor, Rui Moreira "não tinha, em 2013, qualquer participação direta na empresa e nunca fez parte dos seus órgãos sociais".
A participação de Moreira (que o próprio assumiu em várias declarações públicas) fazia-se através da Morimor SGPS, SA, uma sociedade detida pela família. Na resposta ao DN, a assessoria do seu gabinete argumenta: "Outra coisa é o dr. Rui Moreira, pela sua participação indireta, via SGPS familiar, nunca ter ocultado o seu interesse na empresa. Assim, quando o tema se levantou politicamente, o dr. Rui Moreira sentiu-se impedido, declarando ter uma participação indireta. Logo, quer a declaração ao TC quer todas as declarações públicas do Dr. Rui Moreira são verdade e inatacáveis."
Para Moreira basta a referência à Morimor na declaração entregue ao TC. "A Selminho é uma gaveta da Morimor. O dr. Rui Moreira declarava todas as empresas que eram da Morimor", interpelou o assessor, quando questionado pelo DN sobre o facto de não estar explícita a pertença da Selminho. "Se tivesse declarado que era sócio da Selminho, teria mentido ao TC", argumentou a fonte oficial. "O que é legal e tem que estar na declaração é que se diga o que se tem", insistiu.
Moreira agora tem quota direta
A empresa - a que Moreira se referiu, numa entrevista ao Público, a 26 de abril, como "uma sociedade de que faz parte assumidamente, que é da família, em que está envolvido há mais de 16 anos" - era detida até quinta-feira, dia 8, em 95% pela Morimor SGPS, SA (quota de 142 500 euros) e em 5% pela mãe de Rui Moreira, Maria João de Almeida Brandão de Carvalho.
Ontem a sociedade que detinha a Selminho foi dissolvida em Santa Maria da Feira e os ativos passaram para os seus acionistas. Rui Moreira tem uma quota de 17 812,50 euros, resultante da divisão da quota da Morimor, que era de 142 500 euros no total. Ou seja, o presidente da Câmara do Porto é agora sócio da Selminho, com participação direta.
Rui Moreira teve de entregar uma primeira declaração, "na qualidade de gestor público", quando assumiu a presidência do Conselho de Administração da Porto Vivo SRU-Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense SA. Na altura, em carta enviada a 8 de fevereiro de 2012, indicou no ativo patrimonial participações na Morimor SGPS (com uma quota de 150 mil euros) e na Morimor Prestação de Serviços (uma quota de 30 mil euros).
A sua participação nestas empresas alterou-se na declaração entregue a 18 de dezembro de 2013, já na qualidade de presidente do município portuense: Moreira detinha 50 mil euros na Morimor SGPS e outros 50 mil na Morimor Prestação de Serviços.
Na referida entrevista ao Público, o autarca recusa o ditado sobre a seriedade da mulher de César. "Gosto muito mais da lógica da rua do que desta lógica de que enferma a mulher de César. Na rua, o que as pessoas dizem é: "Se o presidente se quisesse orientar, não se orientaria certamente com um terreno que é da família"."
O Caso Selminho
A empresa da família de Moreira, Selminho, reclama direitos de construção num terreno. O caso arrasta-se há anos e estava em tribunal.
O terreno de 2260 m2, na escarpa do Douro, junto à ponte da Arrábida, foi registado por usucapião por um casal que ali residia. Um mês depois esse casal vendeu à Selminho a propriedade por 30 mil contos (cerca de 150 mil euros).
Em 2014, a Câmara do Porto e a Selminho, assinaram acordo com base no compromisso camarário de rever duas normas do PDM. Segundo o Público, o compromisso nunca existiu. Os serviços da Câmara dizem que parcela dos terrenos é, afinal, da... Câmara.


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13
Jun17

Dono da Douro Azul quer levantamento da imunidade de Ana Gomes por se sentir caluniado

António Garrochinho

Mário Ferreira, o dono do grupo Douro Azul, sente que foi caluniado por Ana Gomes Foto LUCÍLIA MONTEIRO

Mário Ferreira, o dono do grupo Douro Azul, sente que foi caluniado por Ana Gomes

Mário Ferreira, o empresário que comprou o navio Atlântida ao Estado por €8,7 milhões para depois vendê-lo pelo dobro do preço oito meses mais tarde, acusa Ana Gomes de cometer crimes de ofensa e calúnia por ter dito que o negócio era um “caso flagrante” de corrupção. É a segunda vez que a eurodeputada é alvo de um processo por causa dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo

O Parlamento Europeu vai ter de decidir se levanta a imunidade da eurodeputada Ana Gomes para poder responder em tribunal num novo processo-crime por difamação de que a socialista é alvo. Mário Ferreira, dono da empresa de cruzeiros Douro Azul, interpôs uma queixa-crime a 31 de maio de 2016 — há mais de um ano — no tribunal de Peso da Régua contra Ana Gomes e o tribunal fez um pedido de levantamento da imunidade parlamentar a Bruxelas.
O pedido foi formalmente apresentado ao Parlamento Europeu pelo Ministério Público do Peso da Régua e tem como objetivo constituir Ana Gomes como arguida, para que possa ser interrogada por alegados crimes de “ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva” e de “publicidade e calúnia”.
Em causa estão declarações feitas por Ana Gomes ao jornal “Diário de Notícias” a 29 de abril de 2016 que o empresário considerou difamatórias. Nesse dia, o Departamento Central de Investigação e a Ação Penal (DCIAP) fez buscas nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC), no Ministério da Defesa e na Douro Azul no âmbito de um inquérito-crime batizado “Operação Atlantis” (saiba mais AQUI), em que estavam a ser investigadas suspeitas de corrupção, participação económica em negócio e administração danosa relacionadas, segundo o comunicado divulgado na altura, com “a subconcessão dos ENVC e a venda do navio Atlântida”. Ficou a saber-se que o navio — cujos custos de construção ascenderam a 40 milhões de euros — foi comprado àqueles estaleiros do Estado por 8,7 milhões de euros por Mário Ferreira, que depois o vendeu oito meses mais tarde por 17 milhões de euros.
Ao comentar o significado da realização das buscas, a eurodeputada disse ao “Diário de Notícias” que o grupo Douro Azul tinha “muito que contar” às autoridades e que a operação em curso pelo DCIAP era “um sinal de que algo está a mexer num caso flagrante de corrupção” (notícia AQUI).

O inquérito-crime sobre a subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e a venda do Atlântida foi aberto em 2014 e está ainda em curso Foto RUI DUARTE SILVA
O inquérito-crime sobre a subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e a venda do Atlântida foi aberto em 2014 e está ainda em curso 
"A Drª Ana Gomes tem um papel importante na sociedade Portuguesa, tinha até uma grande admiração pelo seu trabalho, mas não pode fazer acusações falsas a torto e a direito, sem fundamentos", justificou Mário Ferreira quando confrontado pelo Expresso sobre a queixa-crime que apresentou contra a eurodeputada. "Ela terá que se retratar neste caso, pois a compra que fiz e posterior venda decorreu dentro da maior legalidade. A compra, em concurso público, foi como a Dra Ana Gomes sabe, auditada por um membro do Ministério Público e decorreu com a maior transparência. Quanto à mais valia, ela deve-se ao conhecimento dos mercados internacionais e ao investimento de milhões realizado por nós na embarcação após a sua compra."
Não há uma sem duas
Já em 2014 o Parlamento Europeu tinha recebido um outro pedido de levantamento da imunidade parlamentar de Ana Gomes por causa dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC), depois de o então ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, ter apresentado uma queixa-crime contra a socialista por difamação. O plenário do Parlamento Europeu rejeitou esse pedido a 13 de novembro de 2014. Na origem do processo movido por Aguiar-Branco estavam declarações feitas por Ana Gomes à TVI em novembro de 2013, que disse que deviam ser investigados supostos negócios entre o grupo Martifer, a quem foi atribuída a subconcessão dos ENVC, e a sociedade de advogados de que o então ministro fazia parte.
É expectável que o Parlamento Europeu volte a chumbar o novo pedido de levantamento de imunidade, já que esse tem sido sempre o entendimento em Bruxelas, no sentido de proteger os seus membros de eventuais retaliações por emitirem opiniões em público na sua qualidade de eurodeputados. Mas, para já, o assunto terá de ser apreciado pela comissão jurídica do Parlamento Europeu, que depois fará uma recomendação para ser votado no plenário. “Explicarei porque e como atuei, em cumprimento dos meus deveres de cidadania e do meu mandato como parlamentar europeia, neste como noutros processos de luta contra a corrupção e a criminalidade económica organizada contra interesses do Estado Português”, diz Ana Gomes numa nota divulgada esta segunda-feira.
Ana Gomes disse esta segunda-feira que vai passar a ser assistente na investigação do Ministério Público sobre a venda do navio Atlântida Foto TIAGO MIRANDA

Ana Gomes disse esta segunda-feira que vai passar a ser assistente na investigação do Ministério Público sobre a venda do navio Atlântida 
A eurodeputada aproveitou para anunciar que vai constituir-se assistente no inquérito-crime em curso no DCIAP — o que significa que poderá colaborar com os procuradores e ter acesso aos autos assim que termine o segredo de justiça interno do caso. A Operação Atlantis teve início em 2014 com base numa denúncia entregue ao Ministério Público precisamente por Ana Gomes, a 20 de dezembro de 2013, em conjunto com queixas também apresentadas pelo presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, José Maria Costa, e pelo advogado e político António Garcia Pereira.
Quando a socialista entregou a sua queixa-crime em 2013, fê-lo contra incertos, sendo que o seu foco era a forma como o então governo de coligação PSD/CDS liderado por Pedro Passos Coelho aprovara a subconcessão dos ENVC ao grupo Martifer, num momento em que os estaleiros estavam a despedir dezenas de trabalhadores. Na nota divulgada esta segunda-feira, o gabinete de Ana Gomes recorda que essa queixa-crime tinha uma única referência a empresas de Mário Ferreira, a propósito de um “negócio de venda, muito abaixo do custo, de aço certificado destinado a construção de navios para a Marinha Portuguesa, venda que foi efetuada pelos ENVC, antes da subconcessão, a um estaleiro da Navalria/Martifer”, sendo que “o aço terá servido para construir dois barcos destinados ao Grupo Douro Azul”. Mais tarde, em 2015, Ana Gomes veio a apresentar uma segunda queixa-crime pelo facto de o Estado ter adjudicado diretamente — sem concurso público — a construção de navios para a Marinha à WestSea/Martifer, a empresa à qual os ENVC foram subconcessionados.
Uma passagem por Malta
A 7 de maio de 2016, o Expresso revelou que o negócio do Atlântida levou à operação de buscas organizada pelo Ministério Público depois de os procuradores terem descoberto que os estaleiros navais tinham alegadamente ignorado uma proposta misteriosa de 21 milhões de euros para a compra do navio, acabando por aceitar o valor de 8,7 milhões de euros oferecido por Mário Ferreira. “Perguntem aos anteriores donos dos estaleiros. Eles é que saberão a resposta”, disse na altura o empresário ao Expresso, quando confrontado sobre a existência da tal proposta. “Seriam uns empresários russos que queriam pagar o Atlântida em dez prestações. As condições não eram boas.”

Foto RUI DUARTE SILVA
Já em maio deste ano, o Expresso publicou um artigo que revelava como o dono da Douro Azul acabou por vender o navio a uma estrutura montada por si em Malta antes de o vender finalmente a uma sociedade na Noruega. A revelação foi feita no âmbito dos Malta Files, um projeto do consórcio europeu de jornalismo de investigação EIC, de que o Expresso faz parte. O esquema de venda do navio através de Malta permitiu ao empresário reter cerca de quatro milhões de euros em Valeta, podendo pagar apenas 5% de imposto efetivo sobre esse valor no caso de não repatriar o dinheiro para Portugal. Mário Ferreira desmentiu ao Expresso que tenha usado Malta para poupar no fisco, sublinhando que as razões para essa escolha “estão relacionadas com o prestígio internacional de Malta na área da navegação”. De qualquer forma, as duas empresas criadas por si em Valeta, uma delas chamada International Trade Winds Limited e uma outra, a International Trade Winds Holding Ltd, que só serve para ser dona da primeira, correspondem a uma típica solução sanduíche vendida por escritórios de advogados locais como uma forma de evitar o pagamento de impostos.

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13
Jun17

O CAPITALISMO A PRODUZIR PRECÁRIOS - Precários. Sindicatos querem saber como será contabilizada a antiguidade

António Garrochinho



Estruturas sindicais concordam com integração dos precários por concurso, mas exigem tratamento diferenciado consoante a realidade. Nova reunião dia 19

O governo quer usar a experiência da integração de 35 mil precários na função pública, em 1997, e replicá-la, agora, no programa de regularização extraordinária dos vínculos precários na administração pública (PREVPAP), em discussão com os sindicatos. A integração dos falsos recibos verdes através de concurso não merece contestação por parte dos sindicatos, que lembram que a lei estabelece que a entrada na administração pública se faz, sempre, por procedimento concursal. No entanto, insistem que há que ter em conta as várias realidades em causa, designadamente em termos de antiguidade. "A integração de precários ao abrigo do decreto-lei 81A foi um processo eficaz e o governo prepara-se para adotar um processo semelhante agora. Mas é preciso adaptá-lo à realidade que vivemos. O governo diz que o tempo de precariedade contará para efeitos de antiguidade, mas falta saber como", adiantou o secretário-geral da Federação dos Sindicatos da Administração Pública (Fesap).
José Abraão, que falava ao DN/Dinheiro Vivo à saída da reunião que ontem manteve com os secretários de Estado da Administração Pública, Carolina Ferra, e do Emprego, Miguel Cabrita, no Ministério das Finanças, assume a sua preocupação com o facto de apenas 15 mil trabalhadores terem requerido a análise da sua situação, para posterior regularização, quando estamos a pouco mais de duas semanas do fim do prazo. "Era expectável que o número de requerimentos fosse já muito superior", diz João Abraão, que "apela" aos precários para que "não deixem para a última hora" o seu pedido. O dirigente da Fesap considera, no entanto, que os 116 mil trabalhadores identificados como precários no levantamento feito pelo governo "é um número que não tem pés nem cabeça" e "mistura verdadeiros com falsos prestadores de serviços, bem como contratos a termo que o são, efetivamente". 40 a 50 mil é o número mais aproximado da realidade, defende. Para além dos requerimentos apresentados pelos próprios, em julho será a vez dos dirigentes dos serviços indicarem quais os precários que estão em condições de ser integrados.
Para Ana Avoila, da Frente Comum de Sindicatos da Função Pública, o baixo número de precários a requerer a análise do seu vínculo resulta de "medo" de perderem o emprego, pelo que "o governo tem de pedir aos serviços que façam uma circular a dizer para todos os trabalhadores se inscreverem para verem o seu vínculo valorizado".
Sobre a eventual exclusão de alguns grupos de trabalhadores precários deste processo de regularização - como os contratos emprego-inserção (para os desempregados), os bolseiros e contratos de prestação de serviços e os estágios remunerados -, Ana Avoila diz que não há exclusões à partida e que só se verá isso após serem conhecidas as condições que o governo irá definir no diploma que regulará a entrada dos precários. Na segunda-feira, 19 de junho, haverá novas reuniões, devendo o executivo apresentar já um projeto de diploma do decreto-lei para que os sindicatos possam analisar.
Helena Rodrigues, presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE), admite a integração dos precários por concurso, mas considera que os procedimentos terão de ser diferentes consoante as condições. A dirigente sindical explicitou que "o concurso é um chapéu", dentro do qual haverá "procedimentos diferentes consoante as carreiras que cada um vai integrar" e a sua situação laboral perante o Estado.
"Quando o próprio serviço vem dizer que aquela pessoa cumpre funções que tem em vista necessidades permanentes do serviço, com certeza que há procedimentos concursais que são feitos de forma diferente de alguém que entra agora para a administração pública e tem de fazer um caminho, até para apreender a cultura e aquilo que é a administração pública", sublinha. As reuniões prosseguem dia 19.


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13
Jun17

INFELIZMENTE O RACISMO EXISTE DOS DOIS LADOS ! - "É preciso descolonizar Portugal"

António Garrochinho




Mamadou Ba, assessor parlamentar do BE, diz que a esquerda tem “falhado estrondosamente” na luta dos negros pela igualdade


Num país de maioria branca os negros veem-se logo, mas ninguém repara quando não estão. E não estão em muitos sítios: no Parlamento, nas TV, nas profissões "boas", nas universidades, nos governos. Uma invisibilidade invisível que a ONU quer combater com a proclamação da década dos afrodescendentes, 2015/24; um apartheid informal que cada vez mais negros portugueses denunciam e tentam "furar". Vai ser agora, com a terceira geração, dizem
"Tive uma professora negra na escola primária." A frase de João é recebida com espanto. "Sério?";"Nunca tive";"Que sorte". Estamos na sala da associação de estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde decorre o período de debate após uma conferência da socióloga Cristina Roldão, intitulada "Perpetuação do Colonialismo: Afrodescendentes e o Acesso ao Ensino". A investigadora do ISCTE, ela própria afrodescendente, veio falar do que denomina de "racismo institucional" e cujas consequências no percurso dos alunos negros estudou com o colega Pedro Abrantes num trabalho pioneiro, apresentado há um ano. E no qual se conclui que a escola portuguesa discrimina os estudantes negros, mais vezes chumbados e encaminhados para cursos profissionais do que os colegas brancos, mesmo quando a origem socioeconómica é a mesma.
Esta primeira tentativa científica de explicar a rarefação de portugueses negros nas universidades terá surgido como resultado do trabalho de campo que é a história de vida da socióloga, nascida em 1980 no bairro social de Faceiras, em Tires. "Havia muitos negros na minha escola mas fui progredindo e foram desaparecendo. Da minha geração, daquele bairro, mais ninguém chegou à faculdade. Ficaram todos pelo 5.º, 6.º ano. E não era porque não fossem inteligentes." Uma pausa breve sublinha a amargura. "As baixas expectativas são recebidas da sociedade. Desde o infantário sabia que havia racismo, porque as educadoras me tratavam de forma diferente. Tenho quase 40 anos e não vejo isso mudar. Afinal, Portugal deixou de ser uma potência colonial ontem. Não conseguimos apagar isso de um momento para o outro. Mas é preciso olhar para o problema e enfrentá-lo."

"Há quanto tempo estás cá?"
Na assistência, entre 16 pessoas, seis são negras, todas universitárias: foram elas que se manifestaram face ao que João, 18 anos, aluno da licenciatura de Línguas, Literaturas e Culturas e também negro, disse. Afinal, a conferencista acabara de frisar que é preciso formar os docentes para não excluírem. E João prossegue: "Essa professora, que era a única negra na minha escola, teve um papel muito importante na minha vida. Dizia-me que havia muitos negros em África que não tinham as mesmas oportunidades que eu. Que tinha de aproveitar."
João, de apelido Mendes, é do Seixal. A mãe e o pai nasceram na Guiné. Vive com a mãe, ajudante de cozinha, e com a irmã, um ano mais velha. O pai, que era ajudante de pedreiro e tirou um curso de Direito depois de adulto, regressou ao país de origem. "Acho que aquela professora foi tão importante por constituir um incentivo constante", explica ao DN. "Havia um elo, uma ligação. Não vou dizer que os alunos negros devem ser ensinados por professores negros, isso seria um disparate. Mas não posso negar que entre os muitos professores não negros que tive vi alguns exibir um viés. E fui avançando na escola e, como a Cristina, vendo cada vez menos negros à minha volta. Podemos achar, claro, que é por conformismo, desistência, falta de esforço. Mas muitos dos que nem sequer tentam foram atingidos pelo racismo institucional. Porque não é uma questão de chegar ao 10.º ano e desistir - a vontade foi cortada antes. A falta de ambição, a ausência de amor-próprio, são construídas. Numa fase de construção de carácter, a criança sente que não acreditam nela, que não se puxa por ela. Convence-se de que não merece. Interioriza uma imagem que não é boa."
A imagem de não pertencer, de não conseguir, de ter tudo contra si, sem referências positivas, sem modelos que permitam acreditar que ser negro não é uma condenação a trabalhar nas obras ou limpar casas ou - se se tiver sorte na lotaria genética e no talento - a jogar futebol, fazer atletismo, ser músico de hip-hop ou kizomba. Para não falar do estigma da delinquência. Daí que uma professora negra, ou outra figura de referência que permita alargar e concretizar o horizonte de ambição, possa fazer tanta diferença.
Não terá sido o caso com Sofia Iala Rodrigues, 23 anos, estudante de mestrado de Antropologia e Culturas Visuais, outra das negras que veio ouvir a conferência. Filha de dois angolanos - ela contabilista, ele reformado de um cargo administrativo na Tudor - é a primeira pessoa da família com curso superior e atribui o feito, em grande parte, aos pais. "Fiz o ensino básico na Damaia, numa escola complicada. Depois mudámo-nos para o Barreiro. Quando entrei no sexto ano só havia outra rapariga negra na turma. Mas os meus pais tinham um controlo muito grande sobre o meu percurso, puxavam muito por mim e tinham muita atenção a pequenas agressões que foram acontecendo. E acho que acabei por ter sorte com os professores." Aliás, o episódio de racismo mais explícito que refere associado à escola é vindo dos colegas, tendo-a a si e uma professora como alvo. "Ela era mestiça e acho que sofreu um bocado. Quando estávamos a dar a origem da humanidade e havia as imagens dos antepassados do homem eles diziam que éramos nós, que éramos parecidas com os macacos." A professora, conta Sofia, não reagia. "Creio que não sabia como reagir. Eu também não." Suspira. "Foi crescendo em mim a noção de que nasci cá e me considero portuguesa mas as outras pessoas - as pessoas brancas - não me veem como fazendo parte do país."
Em criança, ouviu muitas vezes o clássico "preta vai para a tua terra". E recentemente, conta, num projeto de voluntariado com crianças "elas perguntaram: "Há quanto tempo estás cá?" E: "Falas tão bem português". Desde tão pequenos têm esta atitude. Ainda temos de progredir muito em Portugal. Mas espero que esta iniciativa da ONU, da década dos afrodescendentes, seja o princípio de uma nova era."
"Um negro nunca será português"
Será? João só soube da proclamação da década, iniciada em janeiro de 2015, há seis meses. "A maioria das pessoas não sabe. Louvo a iniciativa, claro, mas acho que está ainda um pouco verde." Na verdade, a nível institucional e mediático nada se passa; foi na movimentação cívica que as coisas mexeram. Criaram-se novas associações, entre as quais a Djass, Associação dos Afrodescendentes, e uma plataforma que reúne todas, a qual em dezembro enviou uma carta aberta à ONU, protestando contra o racismo institucional do Estado português. E, a partir de um discurso pouco rigoroso e desculpabilizador do PR sobre a escravatura, no antigo entreposto negreiro de Gorée (Senegal), iniciou-se nos jornais um debate sobre o colonialismo português e o que dele subsiste na sociedade portuguesa.
Mas, ironia, a maioria dos protagonistas - quase todos académicos - do debate que decorre nos jornais são brancos. De novo a invisibilidade: o que explica que, 42 anos após a descolonização, continue a viver-se em Portugal nesta espécie de apartheid informal e haja tão pouca discussão, protesto e reivindicação em relação a isso? Como se explica que o Estado possa dar-se ao luxo de, num relatório sobre discriminação enviado à ONU (ver texto nestas páginas) no primeiro ano da década dos afrodescendentes, elencar uma série de políticas dirigidas a imigrantes e ciganos e, quanto aos negros, declarar que estes beneficiam de uma "abordagem holística", ou seja, não existem políticas específicas para eles?
João reflete. "Na minha opinião a razão pela qual estamos tão atrasados em meter mais o pé e defendermos os nossos direitos é a forma como o nosso país encara a situação. Faz-nos viver numa realidade dúbia, em que parece que não existe o problema enquanto sofremos as consequências. Tendemos a vê-lo como individual em vez de estrutural." Mas, crê, isso vai mudar. "Só agora é que estamos a ter este pico de negros filhos de pessoas que já nasceram cá, e que estão a sentir em pleno o conflito do que é ser português e negro. Porque quando éramos miúdos sentíamo-nos portugueses, mas à medida que crescemos vemos que não é assim tão simples. Estamos a apalpar terreno."
Não, não é simples. Qual é a imagem que o negro tem de si próprio numa sociedade maioritariamente não negra, pergunta Carmelino Cassessa, 32 anos, outro dos presentes na conferência de Cristina Roldão. E conta, à guisa de ilustração, uma história passada numa turma de que fazia parte. "A professora perguntou: se um negro se naturalizar português será português? Ficou tudo calado. E de repente houve uma corajosa, branca, que disse "Não, nunca será português." A brutalidade caricatural da sentença faz soar risos na sala. "Ao menos teve a coragem de dizer o que a maioria pensa", conclui Carmelino.
A coragem do racismo: Carlos Pereira, que se assume como "o único humorista negro português", também fala dela. "Acho que os portugueses são racistas mas é um racismo mais subtil que o de há uns anos atrás. Faço piadas com o racismo e a audiência ri, nem que seja para disfarçar o desconforto. Mas já me sucedeu estar uma família toda a rir e o pai muito sisudo. Fui perguntar-lhe o que se passava e ele respondeu: "É que não acho piada a pretos." Foi estranho, não estava à espera de ouvir aquilo. Mas gabo-lhe a coragem de dizê-lo à frente de tanta gente."
Coragem ou ódio? Carlos hesita. "Há uma coisa um bocado ingrata. Vivo cá há dez anos [nasceu em São Tomé, onde ficou com os avós até aos 15, quando veio viver com a mãe, médica] e sinto muito pouco racismo. Se calhar porque sou bonito, simpático. As pessoas dizem-me muito "tu não pareces preto". Porque há um conjunto de atributos que são atribuídos aos brancos. Chegam a tecer comentários racistas sobre outros negros comigo ao lado. Já os negros dizem que gosto de fado como os brancos, que não sei dançar kizomba, que como pão à refeição, tudo "coisas de branco". Os estereótipos acabam por existir dos dois lados. Porque há uma separação tão grande que é como se houvesse duas sociedades completamente distintas. Como se os negros dissessem: "Não nos querem com eles, vamos fazer a nossa cena.""

    A começar pelos lugares de convívio. Carlos, que está no último ano da licenciatura de Ciência Política no ISCTE, é também barman no Rive Rouge, no lisboeta Mercado da Ribeira. "Praticamente não vejo lá negros. E os que frequentam esses sítios são os que não são considerados negros." Como ele - mesmo se acaba por, em contradição com o que afirmou antes, contar episódios de racismo de que foi alvo: os pais de uma namorada branca que diziam à filha "não andes com ele porque em África têm sida"; a vez que, criança, estava com o avô num supermercado, pegou num pacote de gomas e voltou a pô-lo na prateleira, e ouviu uma mãe branca dizer à filha, que pegou no mesmo pacote: "Larga isso, o preto mexeu."
    Crê aliás que uma das coisas que pode explicar a sua resiliência, o facto de se ter proposto ser o primeiro negro no stand up e de não desistir, é não ter vivido sempre cá. "A minha mãe diz que se eu tivesse crescido aqui já me teria perdido, seria um marginal." E diz mais: "Ias mesmo ser tu a conseguir. Está mais que visto que o humor em Portugal não é para pretos." Carlos tem riso na voz. "Estou numa espécie de missão. Como sou o único, gosto de deixar claro que estou a abrir caminho. Tem funcionado também por isso. Mas há muitos africanos que não aprovam, é como se fosse um desertor. Como se certas coisas não fossem para nós, não nos pertencessem. Já houve tanta coisa vetada no panorama nacional que às tantas o pessoal desiste, autoboicota-se. Há um preconceito enorme dos negros em relação a si próprios. E acho que se fôssemos mais unidos podíamos conseguir mais coisas."
    "Assumir o meu lugar de fala"
    Pode ser, acha Beatriz Gomes Dias, presidente da Djass-Associação de Afrodescendentes, que, finalmente, a união esteja a acontecer e a questão a ficar exposta. "Fui na semana passada a uma escola secundária no Vale da Amoreira na qual a maioria dos alunos é negra. E levei um exercício sobre racismo que se faz no Brasil. Mostramos fotos de brancos e negros com indumentárias diferentes e perguntamos o que os miúdos acham que fazem aquelas pessoas. Nos resultados do Brasil, um negro de fato é segurança, por exemplo, enquanto um branco de fato é advogado. Naquela escola os miúdos não estabeleciam distinção, o que é muito bom. Mas depois em conversa diziam "os portugueses isto, os portugueses aquilo", e não se incluíam nesse coletivo. Como se não fossem portugueses, apesar de, quando lhes perguntei se se sentiam portugueses, me terem dito que sim."
    O sentimento de não pertença em miúdos tão novos, a assustadora oposição entre a resposta racional e a emocional são terríveis, mas correspondem a uma capacidade de dizer que é também um empoderamento. "Os brasileiros chamam a isto "assumir o meu lugar de fala". Há uma discussão nova, uma consciencialização nova. A discussão sobre o que é ser negro e ser português não tinha ainda acontecido. Eu própria, há 20 anos, quando enquanto estudante universitária me inscrevi no SOS Racismo, não estava a pensar nisso de forma estruturada. A reivindicação do que é ser negro como categoria política surge-me nos últimos anos e está muito ligada à formação da associação. O centro da nossa ação é a reivindicação de que somos portugueses e negros. Que existimos, que queremos ser reconhecidos."
    "Ocupar o meu lugar de fala"
    Professora de Biologia no secundário, no agrupamento de escolas Filipa de Lencastre, em Lisboa, Beatriz, 46 anos, é a única docente negra da sua escola. Alunos negros tem poucos; o ano passado três, este ano só uma. "É um agrupamento do centro, associado à classe média, e há uma segregação territorial e social muito marcada entre negros e brancos." Em todo o caso, nota alguns progressos em relação ao seu tempo de estudante: "Os alunos negros parecem-me mais bem integrados. Esta que tenho este ano, apesar de ser única na turma, participa bastante, não se inibe, defende muito bem os pontos de vista dela." Ao contrário de Beatriz nessa altura da vida. "Olhando para trás vejo uma rapariga muito tímida. Queria passar despercebida, misturar-me, não chamar a atenção para o ser negra. Talvez porque estava sempre em minoria: vivia no centro da cidade, porque o meu pai, médico, quis escolher um contexto em que nos habituássemos ao discurso da maioria. Esteve ligado aos movimentos de libertação na Guiné e tinha uma reflexão sobre o colonialismo, uma forma combativa de olhar para a sociedade portuguesa que passou para mim e para os meus irmãos. Só a recuperei depois de adulta."
    Ainda assim, vê uma diferença fundamental entre ela e os pais: "Era-lhes reconhecida nacionalidade portuguesa por terem nascido numa colónia e vindo para Portugal antes do 25 de Abril. Mas na verdade não se sentem portugueses; o meu pai, por exemplo, quer passar o fim da vida na Guiné. Já a minha geração sente-se identitariamente portuguesa, e a seguinte ainda mais. Daí que ocuparem o seu "lugar de fala" seja cada vez mais natural, que surja uma série de associações e de reivindicações. Porque mesmo os negros da minha idade, que como eu acreditaram numa sociedade pós-racial, percebem que continuamos a ser alvo das mesmas observações que ouvíamos em crianças. Nada mudou, ou mudou muito pouco."

      E o que mudou pode ser usado para "provar" que tudo mudou. "Por ser professora, classe média, faço parte dos negros usados como exemplo de que não há racismo em Portugal, que estamos bem integrados e que se não há mais em lugares de visibilidade é por falta de mérito." A ministra Francisca van Dunem, desde novembro de 2015 na pasta da Justiça e a primeira governante negra da história do país, é outro caso. "Um colega perguntou-me, quando ela foi nomeada: "Então, ainda achas que há racismo cá?""
      Num país que em 2006 assumiu as quotas de género nas listas eleitorais, o argumento soa a requentado: usou-se em relação às mulheres. A discriminação das mulheres é mais grave do que a dos negros? A diferença estará na dificuldade de avaliar a taxa de representação dos negros: ninguém sabe quantos são porque o Estado recusa contabilizar cidadãos por características étnicas.
      "Há uma política de negros"
      Claro que esta contabilização levanta várias questões paradoxais - desde logo, a do regresso da noção de "raça", da "diferença" em função da cor. Mamadou Ba, dirigente do SOS Racismo, sorri. "Como diz Catherine Samary, "a raça não existe mas mata". Um dos problemas no debate sobre racismo é a dificuldade de nomear. Mas a denominação tem que ver com a contingência cultural de situar uma pessoa no seio de uma sociedade em que é minoritária."
      Ba, de 43 anos, nascido no Senegal e em Portugal desde 1997, sabe do que fala. Veio com uma bolsa de mestrado do Instituto Camões mas trabalhou nas obras para se sustentar. O melhor amigo, também senegalês e também aluno de mestrado, morreu nas obras do Teatro Aberto. "Costumo dizer aos meus amigos que me acusam de ser obcecado com a questão do racismo que não tenho alternativa", comenta este assessor parlamentar do BE, que considera "essencial afirmar a categoria do afrodescendente e separá-la da de imigrante [mesmo se ele próprio acumula as duas]. A palavra tem de entrar no léxico." Trata-se, explica, de a estabelecer como categoria operativa, política, à imagem do que sucedeu com a categoria LGBT; de assumir no discurso a separação para lutar pela igualdade. Uma luta da qual considera que os partidos, incluindo os de esquerda, têm estado ausentes. "Nos programas eleitorais, a igualdade remete para género e orientação sexual. Há uma lacuna programática. A esquerda tem falhado estrondosamente nisto. E tirando o CDS, que tem há anos um deputado negro [Hélder Amaral], nenhum partido coloca negros em lugar elegível. Os partidos de esquerda querem continuar a ser os procuradores políticos dos negros, mas não os colocam em situação de poderem fazê-lo por si. Nunca vamos conseguir responder à desigualdade que afeta os portugueses negros enquanto não houver representação."
      Negros a fazer política de negros, para os negros: algo que nunca aconteceu no país. "É preciso perceber-se que humanamente somos pessoas, mas politicamente somos negros. Existe uma política de negros, e não fomos nós que a criámos." Quem fala é Rui Estrela, 38 anos, nascido em Portugal de pais nascidos em Portugal - os avós vieram em 1968 de Cabo Verde -, representante mais velho da terceira geração que, crê, tem as condições para mudar as coisas. "A geração nova é que pode reclamar-se de cidadania plena, Só esta esta geração é que pode virar-se para o país e dizer "então?". É este o espaço onde eles querem ter tudo aquilo a que têm direito. E começam a ter consciência de que é preciso fazer esse combate crítico." Membro da Plataforma Gueto, Rui está a trabalhar numa tese de mestrado, no ISCTE, que passa "pela entreajuda como forma de emancipação". E tem uma certeza: "Não é só a discutir dentro da academia que isto se resolve. Há muita coisa para fazer. O colonialismo perdura, a descolonização está por fazer aqui, ainda. É preciso descolonizar Portugal. Como? Não sabemos exatamente, mas parados não vamos ficar."

      www.dn.pt
      13
      Jun17

      ENTRE ELES

      António Garrochinho
      VÃO TAPANDO OS OLHOS AO POVO E DISTIBUINDO OS TACHOS ENTRE ELES
      O FASCISTA PASSOS COELHO PRIVATIZA A TAP PELA CALADA DA NOITE, DEPOIS FRASQUILHO VINDO DO BES É NOMEADO PRESIDENTE E AGORA UM AMIGO DE ANTÓNIO COSTA, DIOGO LACERDA TAMBÉM É PREMIADO COM UM GULOSO TACHO.
      TUDO NEGOCIADO NAS COSTAS DO POVO E DEPOIS ADMIRAM-SE DE DE SEREM PREMIADOS COMO IGUAIS.
      PS E PSD TUDO A MESMA MERDA.
      AG
      Foto de António Garrochinho.

      13
      Jun17

      Câmara de Cascais obrigada a retirar anúncio das televisões

      António Garrochinho


      A Câmara Municipal de Cascais tem 48 horas para retirar das televisões generalistas a publicidade sobre o MobiCascais. A decisão é da Comissão Nacional de Eleições, que considera "ilegal" este anúncio.

      A decisão a Comissão Nacional de Eleições (CNE) surge na sequência de queixas de munícipes, avançou, domingo, o jornal online Cascais24, que teve acesso à deliberação.
      Segundo a deliberação da CNE, o anúncio sobre o MobiCascais "integra publicidade institucional proibida, pelo que, se ordena ao Senhor Presidente da Câmara Municipal de Cascais que providencie, no prazo de 48 horas, a suspensão da emissão dos anúncios publicitários nos canais generalistas de televisão, relativos à divulgação da nova rede de transportes públicos e sistemas de pagamento de estacionamento com a designação 'MobiCascais', nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho, uma vez que já está em curso o processo eleitoral, sob pena de incorrer em responsabilidade contraordenacional nos termos e para os efeitos do artigo 12.º daquele diploma legal".
      Autarca discorda da decisão da CNE
      Desde há algumas semanas que os canais generalistas, em horário nobre, têm divulgado publicidade com cerca de 30 segundos relacionada com a nova rede de transportes públicos e sistema de pagamento de estacionamento no concelho de Cascais, conhecido por "MobiCascais".
      Contactado pela Lusa, o presidente da Câmara de Cascais, Carlos Carreiras, confirmou que a notificação da CNE chegou à autarquia na passada sexta-feira e esclareceu que "a referida divulgação é da exclusiva responsabilidade da Cascais Próxima, um operador municipal de transportes" e que "a Câmara Municipal não tem nenhuma interferência nesse processo".
      O autarca refere ainda que "a necessidade de uma campanha de divulgação foi proposta em sede de Assembleia Municipal por uma Comissão de Acompanhamento, composta por todas as forças políticas autárquicas, e votada unanimemente".
      Carlos Carreiras diz discordar da decisão da CNE, uma vez que "não faz nenhuma menção a responsáveis políticos da câmara e não tem nenhuma referência institucional à câmara". Ainda assim, acrescenta, "com o objetivo de cumprir de forma célere a deliberação", o autarca solicitou à Cascais Próxima que suspendesse de imediato a campanha.
      O autarca acusa "um agente político ligado a uma candidatura partidária" de ter feito a denúncia à CNE, "o que mostra um incómodo grande da oposição relativamente ao sucesso do programa MobiCascais"
      Publicidade institucional é proibida após marcação da data das eleições
      De acordo com a análise da CNE, "as entidades públicas estão sujeitas em todas as fases do processo eleitoral a especiais deveres de neutralidade e imparcialidade, nomeadamente estando-lhes vedada a prossecução de outros interesses que não sejam os interesses públicos postos por lei a seu cargo".
      Diz ainda a CNE que "tal, não pressupõe, logicamente, a inatividade e passividades das entidades públicas, pois estas têm o dever de cumprir as competências que lhe são confiadas", mas acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho, o legislador consagrou expressamente, no n.º 4 do artigo 10.º, a proibição de publicidade institucional por parte dos órgãos do Estado e da Administração Pública de atos, programas, obras ou serviços, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública", pretendendo-se "obstar a que, por via da publicidade institucional, os órgãos autárquicos favoreçam determinadas candidaturas em detrimento de outras, violando assim os deveres de neutralidade e imparcialidade".
      "A publicidade institucional é proibida a partir da publicação do decreto que marque a data da eleição ou do referendo, cf. n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho.", explica a CNE no documento ao qual o Cascais24 teve acesso.


      www.jn.pt
      13
      Jun17

      Morreu Alípio de Freitas

      António Garrochinho




      Foi padre português, revolucionário brasileiro, cooperante em Moçambique. Privou com os grandes do mundo em Moscovo e partilhou a sorte dos camponeses no sertão nordestino. Preso, torturado, libertado, voltou a Portugal e foi jornalista da RTP. Morreu hoje, aos 88 anos de idade.



      Alípio Cristiano de Freitas nasceu em 1929, em Trás-os-Montes. Ordenado padre em 1952, desde logo quis viver junto das comunidades a quem se dirigia. Instalou-se primeiro junto dos camponeses pobres na Serra de Montesinho.

      Foi depois para o Brasil, a convite do arcebispo do Maranhão. Deu aulas na universidade e fundou uma paróquia. Queria ser entendido e recusou dizer missa em latim. Disse-a depois em português, desafiando uma Igreja que ainda tinha por fazer o aggiornamentodo Concílio Vaticano II.

      Mas a mensagem nada valia sem a acção: Alípio de Freitas empenhou-se em organizar a criação de uma escola e de um posto médico. Envolveu-se na luta política e apoiou a candidatura de Miguel Arraes ao governo do Estado de Pernambuco, numa ampla coligação de comunistas, trabalhistas e social-democratas. Essa ousadia valeu-lhe um primeiro sequestro por um grupo paramilitar e detenção durante mais de um mês à ordem do Exército. 

      A detenção não o intimidou, antes acresceu a sua determinação. Naturalizou-se brasileiro e, ao lado de Francisco Julião, tornou-se co-fundador das Ligas Camponesas. Organizou a ocupação de latifúndios no que era um sinal precursor do actual Movimento dos Sem Terra.

      O dirigente bloquista Alberto Matos, que militou com Alípio na fase final da vida deste, recordou recentemente a indignação que ecoava ainda na voz do amigo, várias décadas depois, sobre os pistoleiros pagos pela oligarquia terratenente para matarem camponeses pobres, que queriam terra para dar de comer aos filhos.

      Depois de ter enterrado vários desses pacíficos ocupantes de terras, Alípio cada vez mais se foi decidindo a organizar a auto-defesa do movimento: pistoleiros e mandantes deveriam doravante recear as consequências dos seus crimes. Viria a ser citado anos mais tarde com o apelo: "Trabalhadores, ontem vos ensinei a rezar e hoje aqui estou para ensinar-vos a pegar em armas e lutar". 

      Com o golpe militar de 1964, o ex-padre partiu para Cuba, onde recebeu instrução de guerrilha. Antes, em 1962, estivera na URSS, para participar no Congresso Mundial da Paz. Aí conheceu o dirigente soviético Nikita Kruchev, o poeta chileno Pablo Neruda e a lendária dirigente espanhola Dolores Ibarruri.

      Na clandestinidade, foi dirigente do Partido Revolucionário dos Trabalhadores. Em maio de 1970 foi capturado e sujeito a intensa tortura. Recusou sempre prestar declarações e apenas deve a vida à ampla campanha de solidariedade internacional de que foi alvo. Nessa campanha se inscreve a canção que lhe dedicou Zeca Afonso, no álbum Com as Minhas Tamanquinhas.

      Libertado em 1979, após várias intervenções da diplomacia portuguesa, foi viver para Moçambique, e pôs a sua expriência nas Ligas Camponesas ao serviço da reforma agrária no novo país lusófono. Foi alvo de um atentado dos serviços secretos sul-africanos, que, por engano, vitimou um companheiro da mesma cooperativa onde trabalhava.

      Regressou a Portugal ainda na década de 1980, tendo trabalhado na RTP até 1994. Foi co-autor de vários programas (“Fim de Semana”, com Mário Zambujal, Carlos Pinto Coelho e José Nuno Martins, “À procura do socialismo”, com Mário Lindolfo). Foi também eleito para a Comissão de Trabalhadores da RTP. A actual CT fez-se representar ao lado de centenas de pessoas, algumas delas trabalhadores da RTP, numa homenagem a Alípio de Freitas, em janeiro de 2017, recordando esse seu mandato precursor.

      Embora tivesse perdido completamente a visão nos últimos anos, Alípio de Freitas continuava a ser uma presença constante, sempre guiado pela sua companheira Guadalupe, em movimentos de solidariedade internacional ou de protesto cívico. Ainda há poucos dias, recém-saído de um internamento hospitalar, interveio de forma marcante numa cerimónia realizada no Museu do Aljube.

      www.rtp.pt

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