Desde que, em 2010, o governo PS, após negociações com o PSD, decidiu introduzir portagens nas autoestradas Sem Custos para o Utilizador (SCUTs) e, em particular, na Via do Infante (A22), o PCP tem lutado de forma determinada e coerente contra esse objetivo. Denunciámos a opção por parcerias público-privadas para a construção e exploração das SCUTs, pois representam um modelo de negócio verdadeiramente ruinoso para o Estado, que assegura aos grupos económicos volumosas rendas suportadas por dinheiros públicos.
Alertámos para as consequências da introdução de portagens na Via do Infante, com repercussões muito negativas na mobilidade dos cidadãos e na atividade económica da região, contribuindo para o aumento das dificuldades sentidas pelas empresas, para a destruição de emprego e para o agravamento da sinistralidade rodoviária.
Rejeitámos a ideia de que a EN 125 seria uma alternativa válida à Via do Infante, já que a estrada nacional, mesmo após a conclusão das obras de requalificação, com as suas inúmeras rotundas, cruzamentos, semáforos e passadeiras de peões não possuirá características adequadas ao tráfego interurbano.
Organizámos, por todo o Algarve, múltiplas ações de luta contra as portagens, levámos o assunto a quase todos os órgãos autárquicos da região e apresentámos na Assembleia da República mais de uma dezena de propostas de abolição das portagens na A22, exigindo que esta infraestrutura fosse devolvida às populações e à região.
Esta tem sido uma intensa luta levada a cabo pelo PCP, com seriedade e sempre norteada pela defesa dos interesses das populações e da economia regional.
Esta postura do PCP contrasta com a de outras forças políticas.
Veja-se, por exemplo, o caso do PSD que, em 2010, perante a iminência da introdução de portagens na Via do Infante veio a público defender que isso seria – e cito – «uma ignomínia contra o Algarve», para uns meses depois, já no governo, impor as famigeradas portagens.
Agora, novamente na oposição, insurge-se contra as portagens e recorre a uma aritmética manhosa para tentar responsabilizar o PCP pela sua manutenção.
Se o valor das portagens foi reduzido em 15 por cento e não nos 50 por cento que o PS havia prometido nas eleições de 2015, isso deve-se única e exclusivamente a uma opção do PS e do seu governo.
O PCP continua a defender a abolição das portagens nas ex-SCUTs e prova disso é a apresentação, no âmbito do Orçamento do Estado para 2018, de uma proposta nesse sentido, rejeitada por PSD e PS.
Veja-se ainda o caso do CDS que nas eleições legislativas de 2011 se apresentou aos algarvios com um compromisso eleitoral de – e cito – «continuar a luta contra as portagens na Via do Infante», para uns meses depois, juntamente com o PSD, as introduzir e durante quatro anos, de 2011 a 2015, votar sempre contra as propostas do PCP de abolição dessas mesmas portagens.
Hoje, tenta passar entre os pingos da chuva, procurando apagar o rasto da sua recente passagem por um governo de má memória para o povo português.
Pouco séria é ainda a mais recente proposta do BE, apresentada no âmbito do Orçamento do Estado para 2018, de substituição das portagens na Via do Infante por uma taxa turística a cobrar aos visitantes da região, nacionais e estrangeiros.
É desde logo incoerente, pois foi apresentada simultaneamente com uma proposta de eliminação das portagens na Via do Infante (que mereceu o voto favorável do PCP).
É também de legalidade duvidosa, pois propõe o lançamento de uma taxa regional que só poderia ser concretizada por uma região administrativa que, como é sabido, não existe no Algarve.
É injusta, pois prevê a eliminação das portagens no Algarve, região onde há uma atividade turística pujante, mas mantém-nas nas ex-SCUTs que servem regiões com pouco turismo.
E é, sobretudo, inaceitável, pois mantém intocados os chorudos lucros da concessionária da Via do Infante à custa de mais uma taxa a onerar o turismo regional.
Tal proposta não pode merecer o apoio do PCP.
Suspeitamos que tenha surgido apenas para desviar as atenções de uma fanfarronice de um deputado do BE que há uns meses ameaçou que votaria contra o Orçamento do Estado para 2018 se as portagens na Via do Infante não fossem, entretanto, abolidas.
O que o PCP defende, de forma clara e inequívoca, é a abolição das portagens e, em simultâneo, o resgate (que, numa primeira fase, poderá passar por uma renegociação dos contratos) das ruinosas parcerias público-privadas das ex-SCUTs, medida que pouparia muitos milhões de euros ao erário público.
É esta a solução que melhor serve os interesses do Algarve e do país.
É por esta solução que o PCP continuará a lutar, com determinação e seriedade.
O Montado português é uma das mais belas paisagens do mundo.
As florestas de Sobreiros e de Azinheiras, existentes, sobretudo, no sul de Portugal, constituem um ecossistema de rara beleza, um modo de vida de muitos portugueses e a sustentabilidade de uma industria vital para o país.
Falamos, essencialmente do Sobreiro, árvore que pode viver cerca de trezentos anos e chegar aos vinte e cinco metros de altura. Tornando-se numa espécie imponente, frondosa e de beleza ímpar.
Quantos de nós não teremos já ficado maravilhados com a visão destas árvores, nos passeios, que fizemos pelo campo? Em Outubro quando estão com aquele vermelho intenso constituem uma visão única.
Eu sou um apaixonado por árvores, já plantei dezenas delas e deslumbro-me com as suas cores, afloramento e desenvolvimento, considero o Sobreiro uma árvore nobre, magnificente e esplendorosa. Dai, ser património nacional e ser um orgulho de todos nós.
É na bacia mediterrânica – Argélia, Marrocos e sul da Península Ibérica – em que há influência Atlântica e que os solos são pobres que existem estas árvores. Portugal possui a maior extensão do mundo, cerca de 730 mil hectares e 33% de toda a área.
Constitui o montado de sobro 21% da área florestal de Portugal. Está presente em todo o território nacional, embora, a grande concentração seja no Alentejo.
A grande riqueza dos sobreiros está na extracção da cortiça, processo que é realizado de nove em nove anos. O tecido vegetal que envolve a árvore - a sua casca - é cuidadosamente retirada (descortiçamento ou tiragem), de forma manual (com um machado), e por um saber que passa de gerações em gerações.
Feito no meio do Verão, quando a casca sai mais facilmente. O cheiro que liberta da extracção e a cor que apresenta são sensações únicas para os nossos sentidos.
pintura rei D. Carlos
É a única árvore do mundo em que se extrai a sua casca sem a matar.
Logo depois deste processo é feita uma marcação com cal que representa o ano da próxima tiragem.
Este processo julga-se que tenha começado à cerca de 300 anos, embora, haja indícios de que os romanos já o conheciam.
A sua utilidade é, sobretudo, para o fabrico de rolhas, onde somos o principal exportador mundial. Outras utilizações são os mosaicos e flutuadores e, cada vez mais, as pequenas utilidades: Chapéus-de-chuva, bonés, carteiras, mesas, malas, etc. Da cortiça consumida em todo o mundo 50% é portuguesa. A indústria que gira à sua volta dá emprego a cerca de 60.000 trabalhadores.
O futuro não está, no entanto, salvaguardado. Uma crescente utilização e produção de rolhas sintéticas e a denegrição da qualidade da rolha de cortiça (sabor e cheiro a rolha no vinho) puseram em causa a sustentabilidade dos montados.
Julgamos que houve uma reacção correcta dos operadores portugueses: por um lado multiplicaram e diversificaram os usos a dar à cortiça e por outro lado investiram no aumento de qualidade, na modernização e no controlo do produto.
Como é óbvio está, também, nas nossas mãos respeitar os produtos portugueses, não consumindo vinhos que não tenham rolhas de cortiça.
Mas deixemos a parte do montado, que tem que ver com a cortiça, e olhemos para outra vertente deste ecossistema maravilhoso - a sua fauna e flora.
Existe inúmera vida nestas florestas de sobreiros e azinheiras.
Desde aquela que é imposta pelo o homem: o cultivo que é feito nos espaços abertos, aos rebanhos de ovelhas, varas de porcos ou manadas da vacas (mertolengas, charolesas, cruzadas, limousines, mirandesas e barrosãs) que se alimentam neste habitat. À vegetação e explosão de flores selvagens (alfazema, orégãos, esteva, rosmaninho, hortelã-pimenta, murtas etc,) passando pelos habitantes que de forma perene ou ocasional passam pelo montado: lebres, raposas, doninhas, lobos, javalis, cobras, ratos de cabrera, salamandras, sardões, lince-ibérico (raríssimo em vias de extinção), etc.
No domínio das aves o montado é um território privilegiado, para mais de cem espécies que aqui nidificam: falcões, mochos, picanço-real, cegonhas, aguias, milhafres, abutres, piscos, tordos, tentilhões, pica-pau, garças-reais, poupas, rouxinóis, peneireiros, grifos, abelharucos, grous etc.
Para mim a mais majestosa e bela é a cegonha-preta com as suas marcas de vermelho, preto, branco e leves tonalidades de verde. Grandiosa, com o seu planar suave. Bela pela sua raridade e imponência. Impressionante. Talvez por ser beirão e um dos lugares de culto destas aves ser Monfortinho e Segura. Gosta de sítios calmos e tranquilos e evita todo o sinal de perturbação. O chamamento que faz à fêmea e a pose que coloca nos céus é indescritível.
Agora, coloquem todos os vossos sentidos em acção e visitem estes campos na Primavera. Vejam tudo florido. Ouçam a parafernália de sons do montado. Cheirem os odores intensos das flores silvestres. Observem os rituais de acasalamento dos animais. Provem a gastronomia regional. Será que o paraíso não existe? - Claro que sim - apesar dos esforços do ser humano para o contrariar.
Se, até agora nos detivemos mais no sobreiral não queremos esquecer o seu parente próximo: a azinheira. Ambas convivem no mesmo espaço, embora haja só montados de sobro e outros só de azinho.
É nesta simbiose que surgem todas as condições para a criação do porco preto alentejano – outro património português de excelência.
A bolota, que começa a cair destas árvores a partir de Outubro, constitui a alimentação favorita destes animais, conferindo à sua carne um sabor inconfundível. Esta alimentação, bem como, o andar ao ar livre pelo montado fazem a sua diferenciação.
O porco preto, desde sempre, fez parte da paisagem alentejana. Teve uma crise, profunda, nas décadas de 60, 70 e 80 do séc. XX. Vários factores contribuíram para isso:
- O despovoamento, fruto da emigração e das migrações para o Litoral em busca de trabalho com a industrialização.
- Concentração de abates e encerramento de matadouros municipais.
- Peste suína africana.
- Campanha contra estas gorduras de origem animal (facto que eu presenciei, fruto de ignorância momentânea, contra o saber milenar das populações).
Na última década deu-se um volta-face. A crescente perda de qualidade da carne e os dados científicos que provam que a carne e a gordura do porco ajudam a regular o colesterol e a prevenir as doenças cardiovasculares contribuíram para o ressurgimento do porco preto.
Sempre esteve na dieta mediterrânica. Considerada a melhor do mundo. Feita de culturas ancestrais que passaram de geração em geração. Além de ajudarem a fixar as populações no interior contribuem para a sustentabilidade do ecossistema dos montados.
Foi feito pela BBC um documentário sobre o montado que eu recomendo vivamente, aqui deixo um link:
Três nomes em sequência regular… António é António. Oliveira é uma árvore. Salazar é só apelido. O que não faz sentido É o sentido que tudo isto tem.
Este senhor Salazar É feito de sal e azar. Se um dia chove, Água dissolve O sal, E sob o céu Fica só azar, é natural. Oh, c’os diabos! Parece que já choveu… Coitadinho Do tiraninho! Não bebe vinho. Nem sequer sozinho… Bebe a verdade E a liberdade. E com tal agrado Que já começam A escassear no mercado. Coitadinho Do tiraninho! O meu vizinho Está na Guiné E o meu padrinho No Limoeiro Aqui ao pé. Mas ninguém sabe porquê. Mas afinal é Certo e certeiro Que isto consola E nos dá fé. Que o coitadinho Do tiraninho Não bebe vinho, Nem até Café.
Um fotógrafo de reis, vários médicos, um líder da comunidade israelita em Lisboa, uma Grã-Mestre da Maçonaria Feminina, uma atriz de sucesso. Esta é a história de uma família de judeus que se fixou em Portugal após a abolição da Inquisição, em 1821.
Jacob e Isaac Ruah, dois dos seis filhos de Moysés Ruah, que emigrou de Marrocos para Faro no século xix.
São uma das famílias mais influentes da comunidade judaica nacional. O médico Samuel Ruah costumava ser chamado à residência de Salazar e o seu primo Joshua foi o clínico de Álvaro Cunhal. O clã conta ainda com a atriz Daniela e com uma ex-grã-mestra da maçonaria feminina. Mas há muitas outras personagens fascinantes: um grande fotógrafo e um vendedor de pedras preciosas.
QUANDO, COM 17 ANOS, a sua família se instalou em Faro, no Algarve, deixando para trás a vida que tinham em Marrocos, não perdeu tempo. Começou logo a negociar em cortiça, que ia comprar ao Alentejo. Movimentava-se numa mula, na qual levava sempre alguns tachos pendurados. Era um religioso conservador e cumpria à risca as regras da comunidade judaica a que pertencia: as panelas serviam para cozinhar a sua comida segundo o ritual judaico (kosher), que só permite ingerir carne de animais ruminantes e abatidos de certa forma e obriga a eliminar o máximo de sangue colocando-a em água durante algumas horas. O jeito para o negócio levou-o depois a viajar para os EUA, para vender azeite e cortiça. Aos 20 anos, em dezembro de 1859, ele, Moysés Bento Ruah, apaixonou-se e casou com Ester Abitbol.
Anos depois foram para Lisboa, acabando por residir no 4º andar direito do nº 6 da Rua Ivens, no Chiado, onde morava a filha. Um apartamento de 14 divisões que se tornou o ponto de encontro de uma das mais importantes famílias judaicas do país e com grande destaque na sociedade portuguesa.
Foi nesta espaçosa casa que viveu o prestigiado fotógrafo da família real, Joshua Benoliel, casado com Simi Ruah, filha de Moysés e Ester, e onde residiu também Joshua Ruah, o conhecido urologista que veio a ser o médico de Álvaro Cunhal e que liderou durante 18 anos a comunidade israelita em Portugal. Além disso, aquele 4º andar era o local onde, em festas ou outros eventos, se cruzavam vários membros desta família judia, como o otorrino Samuel Ruah, avô da atriz Daniela Ruah, que durante o Estado Novo privou com António de Oliveira Salazar.
A história dos Ruah está cheia de surpresas e de personagens fascinantes, resultado do casamento de Moysés e Ester e dos seus sete filhos. Abraão, Hassan, José, Isaac, Simi, Jacob e Samuel. Só estes dois últimos não tiveram descendentes, segundo o livro Genealogia Hebraica, de José Maria Abecassis.
A vida dos irmãos foi dividida entre Faro e Lisboa, pois uns permaneceram no Algarve e outros optaram por se estabelecer na capital. O mais velho, Abraão, casou com uma senhora da alta sociedade de Faro, Francisca Maria Assis, e ficaram com os três filhos pelo Sul. Foi o último judeu a ser enterrado, em 1932, no cemitério daquela cidade algarvia, que foi usado pela primeira vez pelos judeus em 1838, época em que a comunidade hebraica se instalou em força no país. (Em 2011, abriu-se uma exceção para enterrar neste cemitério Ralf Pinto, que promoveu o restauro do local.)
Depois de terem sido expulsos da Península Ibérica no século XV, e de terem emigrado para o Norte de África, muitos judeus regressaram a Portugal no século XIX. Entre eles estavam os Ruah, que foram dos primeiros a fixarem-se em Faro, após a abolição da Inquisição em 1821.
Nessa altura, integravam a comunidade judaica local, composta por 60 famílias que se dedicavam em grande parte ao comércio, tendo de dia para dia cada vez mais poder, fruto da capacidade financeira e do jeito para o negócio, o que era facilitado por muitos falarem cinco línguas.
Raquel Delmar e Isaac Bentes Ruah, bisavós de Daniela Ruah, com Joshua Beloniel, encostado à parede, Simi, em frente a Joshua, e a filha destes, Ester, mãe de Joshua Ruah.
Com os anos, os Ruah foram mudando para Lisboa. E quando, em 1932, Abraão Ruah morreu, restavam poucos judeus no Algarve: só o seu filho, José Ruah, permaneceu pelo Sul. Montou uma loja de velharias e, excêntrico, vivia de noite. Muitas vezes só abria o seu negócio à meia-noite. Será em honra dele, acreditam os seus descendentes, o nome dado a um café que ainda hoje existe em Faro – O Cantinho do Ruah, na Rua do Alportel. José acabou por vir para a capital quando já tinha mais de 80 anos, ficando próximo da família.
De todos os filhos de Moysés Ruah, o negociador de cortiça que andava de mula, Isaac Bentes Ruah foi o que mais herdou o talento para o negócio. Quando tinha pouco mais de 20 anos, foi para o Brasil trabalhar na recolha de borracha feita pelos índios que habitavam perto do rio Amazonas. Depois mudou-se para Manaus, onde se tornou dono de uma ourivesaria, passando a negociar com pedras preciosas, como rubis, diamantes, esmeraldas e safiras. Voltou para Faro, continuou no negócio e pouco depois foi a Tânger casar-se com Raquel Delmar, 17 anos mais nova. Foram os dois viver para Lisboa, sem sonhar que iriam começar uma família da qual faria parte um dos médicos mais prestigiados do país e próximo de António de Oliveira Salazar e uma atriz reconhecida internacionalmente.
Daniela Ruah é uma das bisnetas do vendedor de pedras preciosas. E o otorrino Samuel Ruah um dos três filhos de Isaac e Raquel. Nenhum quis seguir o negócio familiar e ele, Samuel, preferiu ser médico, em parte pelo facto de o seu irmão mais velho, Moisés, ter morrido de febre tifóide aos 17 anos, pouco antes de entrar em Medicina.
O médico Samuel Ruah, ao centro, com o filho Carlos Ruah, à esquerda, e o primo Joshua Ruah, à direita.
Samuel formou-se em 1944, quando tinha 24 anos, mas pouco depois ficou doente com tuberculose e teve de ser internado no sanatório da serra da Estrela, onde estava também internada, com a mesma doença, uma judia que conhecia do centro israelita, Ester Buzaglo. Apaixonaram-se e quando tiveram alta saíram e casaram-se em 1949. Durante anos, Samuel dedicou-se à profissão, sendo especialista ainda não tinha 27 anos. Foi médico do irmão do então cardeal-patriarca António Cerejeira e os dois passaram várias horas juntos no quarto do Hospital Dona Estefânia onde D. Manuel Cerejeira esteve internado vários meses. O cardeal sabia que Samuel era judeu, daí nunca lhe ter beijado a mão e o anel, como era costume.
Através de uma doente, que lhe pediu um favor, acabou por se aproximar também de António Oliveira Salazar. Maria Livia Nosolini, mulher do embaixador no Vaticano, amigo próximo do ditador, veio à consulta acompanhada de uma senhora mais velha e de uma criança, que suspeitavam ter problemas nos adenoides e queriam saber a opinião do médico. Mas o otorrino percebeu que a criança tinha problemas motores e outros e sugeriu que fosse vista por pedopsiquiatras. Descobriu pouco depois que a senhora mais velha era afinal Dona Maria, a governanta de Salazar, e a pedido deste último passou a coordenar tudo o que dizia respeito aos assuntos clínicos da criança. Foi por isso várias vezes à residência oficial do presidente do Conselho e foram muitas as conversas que mantiveram ao longo dos anos, tendo até trocado ideias sobre a Guerra do Sinai em 1967. A sua proximidade a Salazar terá sido um dos motivos que o levaram a ser alvo de processos no pós-25 de Abril. «Durante anos fui perseguido. Os radicais da altura atacaram-me por ter sido médico de doentes “fascistas”», contou Samuel Ruah num depoimento que fez a José Freire Antunes para o livro Os Judeus em Portugal. «Mas no fundo sentia que havia um certo antissemitismo contra um judeu que chegara a diretor dos hospitais, abrira um clínica e adquirira prestígio», dizia. Samuel Ruah, que morreu em janeiro passado, foi diretor de serviço de otorrinolaringologia do Hospital Dona Estefânia entre 1965 e 1990, data em que saiu por limite de idade.
Conseguiu modernizar o serviço e, para isso, segundo contou aos mais próximos, ficou horas a fio durante vários dias sentado na antecâmara do gabinete do então ministro da Saúde, para este o receber e o ajudar a lançar um novo edifício para o serviço. Dos seus cinco filhos, só Carlos sentiu a mesma vocação e optou pela carreira de otorrino. Mas, desiludido com Portugal, foi viver para os EUA, onde ficou nove anos e onde nasceu a sua filha mais velha, Daniela Ruah.
«O que é giro é que quando eu era mais novo o meu pai, Samuel, gostava imenso de ver comigo as séries policiais na televisão, como os Vingadores e depois, mais tarde, estávamos a ver uma série do mesmo género, mas com a Daniela a representar», conta Carlos Ruah à NOTÍCIAS MAGAZINE. «O meu pai era o fã número um da Daniela. Não perdia um episódio e guardava tudo o que saía escrito sobre ela.»
A filha, garante, sempre teve veia artística. Daniela vive nos EUA e é hoje a estrela da série televisiva Investigação Criminal – Los Angeles. Casou-se com um duplo norte-americano e tem um filho, River Isaac, a quem tenta passar algumas das tradições judaicas, especialmente a celebração «de algumas datas mais importantes», diz. É o caso da Páscoa, que se festeja durante oito dias, período em que não se pode comer nada fermentado, usando-se para isso o pão ázimo. Nessa altura, à mesa, o patriarca deve contar a história sobre o êxodo do Egito, lendo um livro chamado Hagadá.
Daniela sempre sonhou ser atriz. Na sua infância, recorda, em casa dos Ruah, fazia teatrinhos para a família ver: «Preparava um “espetáculo” na sala com os meus primos e obrigava os tios todos a ver.» Conviveu com primos e tios da família do avô paterno, Samuel Ruah, já a família do avô materno, Max Korn, morreu quase toda no Holocasto. Quando era mais nova frequentava o centro israelita e nunca escondeu que era judia. Nas gravações das novelas percebiam que era essa a sua religião quanto tirava o fiambre das sanduíches, por não poder comer porco. E, por coincidência, o primeiro papel que teve, aos 16 anos, na novela Jardins Proibidos, da TVI, era o de uma jovem judia. Foi depois estudar para Londres, regressou a Portugal, mas em 2007 foi de vez para os EUA . Ser atriz, acredita, até é capaz de estar no seu ADN: «Sempre ouvi histórias das peças de teatro em que os meus pais e avós participavam em novos. Uma avó fez de monstro em A Bela e o Monstro, cheguei a ver fotos. A outra avó foi chamada para ir para Hollywood por um produtor americano, quando tinha 14 anos. A minha bisavó não deixou!» E até o pai «cantou ópera com uma conhecida professora, até entrar para a faculdade».
Muitos dos Ruah casaram-se entre si, com primos. Hassan, outro dos sete filhos de Moysés, o comerciante que andava de mula pelo Alentejo, escolheu como noiva a sua prima Sol Benchayal, com quem teve uma rapariga e dois rapazes. Um deles, Judah Ruah, um engenheiro eletrotécnico, acabou por, sem querer, deixar a sua marca na história religiosa portuguesa. Foi ele quem acompanhou o então conceituado jornalista Avelino de Almeida, do jornal O Século, à Cova da Iria para fazer a reportagem sobre o milagre de Fátima, a 13 de outubro de 1917. Isto porque o seu tio Joshua Benoliel, fotógrafo daquele jornal, não pôde ir cobrir o evento e pediu-lhe que o substituísse. Por isso, foi Judah quem acabou por captar as imagens que no dia 15 de outubro saíram nas páginas do diário.
Judah Ruah, um engenheiro eletrotécnico, acabou por, sem querer, deixar a sua marca na história religiosa portuguesa. Foi ele quem acompanhou o então conceituado jornalista Avelino de Almeida, do jornal O Século, à Cova da Iria para fazer a reportagem sobre o milagre de Fátima, a 13 de outubro de 1917. Isto porque o seu tio Joshua Benoliel, fotógrafo daquele jornal, não pôde ir cobrir o evento e pediu-lhe que o substituísse. Por isso, foi Judah quem acabou por captar as imagens que no dia 15 de outubro saíram nas páginas do diário.
«Tem graça ter sido um judeu a fotografar o milagre de Fátima», diz Joshua Ruah, que foi líder da comunidade israelita e descende de um outro filho de Moysés, o vendedor de cortiça: José Bento Ruah. Este chegou a ter um café em Faro, mas em 1925, depois da morte acidental da filha aos 6 anos, mudou-se para São Tomé e Príncipe, onde comprou uma roça de café. «O meu avô foi viver para África, mas o meu pai, também chamado Moisés, ficou em Portugal e casou com uma prima direita, a Ester, filha da minha tia Simi. Ou seja, o meu avô paterno (José Bento Ruah) e a minha avó materna (Simi Ruah Benodiel) eram irmãos», explica Joshua, sem lhe fazer qualquer confusão: «É normal os judeus, e os Ruah, casarem-se uns com os outros.» Joshua Ruah nasceu em 1940 e cresceu na casa da Rua Ivens, em Lisboa, e, tal como o pai, seguiu a carreira de urologista.
Aliás, os dois chegaram a ter um consultório juntos. Licenciou-se em Medicina em 1967, na Faculdade da Universidade Clássica de Lisboa, e rapidamente tornou-se um dos médicos mais conceituados do país. Foi ele quem seguiu Álvaro Cunhal nos últimos 14 anos e meio de vida do ex-líder comunista. Estava no Hospital do Barreiro quando um dia lhe ligou um dos seus doentes, Octávio Pato, também do PCP, a perguntar se podia ir ver o seu camarada. «A partir daí, passei a tratar o Dr. Cunhal», conta Joshua Ruah, recordando: «Era uma pessoa espantosa. Além de uma enorme capacidade intelectual, era humilde e tinha um humor fora de série. Em privado, não tinha nada que ver com aquela imagem dura da política.» Conversavam sobre tudo e ficaram amigos «Um dia estava no cinema com os meus netos e ele ligou-me. Estava aflito e sozinho em casa e pediu que lá fosse. Peguei nos miúdos e fomos todos ter com o Dr. Cunhal. Os meus netos ficaram fascinados.»
Joshua chegou a ser convidado para aderir ao PCP, em 1974, mas recusou e optou por ser antes militante do PS, em 1975. Foi candidato pelo partido em autárquicas, legislativas e ao Parlamento Europeu, mas sempre em lugares não elegíveis. E mais recentemente foi um dos promotores da candidatura de Maria de Belém para a Presidência da República. Pelo meio, em 1986, entrou na maçonaria pela mão do amigo José Vacondeus. Primeiro esteve na Grande Loja Legal de Portugal e depois no Grande Oriente Lusitano, onde foi um dos fundadores de uma das mais poderosas lojas maçónicas do país, a Universallis. Também a sua mulher, Mery Ruah, com quem se casou em 1963, entrou na maçonaria feminina e, entre Setembro de 2012 e setembro de 2015, foi a líder da Grande Loja Feminina de Portugal, obediência exclusiva para mulheres.
Quanto se tornou maçon, Joshua Ruah liderava a comunidade israelita de Lisboa. Integrou a direção como vogal em 1963, mas em dezembro de 1978 tornou-se presidente num primeiro período até 1992. Depois, em 1995, voltou a comandar os judeus portugueses até 2001. Durante os seus mandatos teve de enfrentar a polémica nacional em torno da primeira visita de Yasser Arafat a Portugal, o receio causado com o atentado contra o embaixador israelita em Lisboa, reivindicado por extremistas palestinianos, e a questão do ouro nazi, tendo feito parte de uma comissão de inquérito nomeada por António Guterres.
Hoje continua ligado à Comunidade Israelita, sendo presidente da assembleia geral, e frequenta a sinagoga, fundada em 1904, onde há cerimónias à sexta à noite ou ao sábado de manhã. E na sua residência mantém alguns hábitos judaicos, como o de receber sempre os filhos à sexta-feira à noite. A refeição começa com uma «bênção ao vinho e ao pão».
Estas tradições foram-lhe transmitidas pelos pais e avós, que naquele apartamento da Rua Ivens se juntavam todos ao jantar. A casa era do seu avô Joshua Benoliel, o famoso fotógrafo português, e da sua avó Simi, a única filha mulher de Moysés, o negociador de cortiça. Joshua e Simi casaram-se em 1899. Ele tinha 26 anos e ela 21. Joshua era despachante de Alfândega, mas um ano antes do seu casamento conseguiu publicar as suas primeiras fotografias na revista Tiro Civil – retratavam as «Regatas do Centenário», que comemoravam os 400 anos da viagem de Vasco da Gama à Índia. Mas o talento fez que poucos anos depois deixasse a sua anterior profissão para se dedicar em exclusivo à fotografia.
Quando morreu em 1932, com 59 anos, na casa da Rua Ivens ficaram empilhados mais de 50 mil negativos das suas fotos. Deixou-os aos seus filhos, Judah, também fotógrafo e fundador do jornal Diário Popular; David, um dos quatro primeiros anestesistas portugueses; e Ester, que gostava de conviver, resultado dos anos em que o pai tornou a casa no Chiado num centro de encontro familiar e intelectual.
Leah Ruah, Vasco Ruah, Carlos Ruah, Simi Ruah, Joshua Ruah e Luna Ruah Benoliel juntaram perto da mítica casa da Rua Ivens, no Chiado, para a Notícias Magazine. (Fotografia de Gerardo Santos/Global Imagens)
E hoje, quando os Ruah mais velhos se juntam, muitas das recordações que partilham são precisamente daquele apartamento. «As festas eram todas nessa casa», lembra Luna Ruah Benoliel, filha de David e neta do fotógrafo. «Sim, sim, e muitos dos casamentos foram feitos lá», acrescenta Joshua Ruah, que, apontando para outra sua prima direita, Lea Ruah, filha de Salomão (irmão do seu pai), recorda: «Tu até nasceste lá em casa.» Estão todos juntos a almoçar numa quarta-feira do passado mês de março, e não conseguem parar de rir das brincadeiras que o clã Ruah fazia no Chiado, em especial Joshua e o seu primo direito, Vasco, que ficou a morar também na casa da Rua Ivens, quando o seu pai foi para África.
Já da geração mais nova, muitos dos Ruah estão agora a viver no estrangeiro, como Daniela, espalhando pelo mundo o nome de família, que em hebraico significa «vento». A atriz admite que fica contente por poder «propagar a imagem positiva» do apelido Ruah: «Tenho orgulho no meu nome.»
Joshua Beloniel é considerado o pai do fotojornalismo português. Casou com Simi Bento Ruah e é o avô do médico Joshua Ruah.
JOSHUA BENOLIEL «É PARA O SÉCULO. É PARA O SÉCULO.»Quando nas ruas de Lisboa se ouvia a frase «É para O Século. É para O Século», todos sabiam que andava por ali Joshua Benoliel, o fotógrafo do matutino, para o qual começou a trabalhar em 1903. Fez dezenas de reportagens fotográficas e é considerado o pai do fotojornalismo português. Com a sua máquina registou os principais acontecimentos da época: as viagens do rei D. Carlos e de D. Manuel ao estrangeiro, a revolução de 1910, as revoltas monárquicas, a partida, em 1917, do Corpo Expedicionário Português para a Flandres e a vida das tropas lusas na I Guerra Mundial. «Só falhou duas fotos: a do milagre de Fátima, pois pediu a um sobrinho para ir no seu lugar por estar doente, e a do assassínio do rei D. Carlos», diz o neto, Joshua Ruah, recordando o que se passou no dia em que o monarca foi morto. «O meu avô estava no Terreiro do Paço a fotografar o desembarque da família real, que regressava de Vila Viçosa. Sabendo que iam para as Necessidades, meteu-se na tipóia para lá estar antes e fotografá-los a chegar. Mas, na esquina, quase ao pé do destino, o rei e o príncipe herdeiro foram mortos com tiros.»
Atriz Daniela Ruah, fotografada por Gerardo Santos/Global Imagens
DANIELA RUAH A AGENTE KENSI BLYE COMEÇOU NUMA NOVELA DA TVIQuando Daniela Ruah tinha 2 anos, os pais perceberam que tinha jeito para ser artista. «Sempre que a mãe dela começava a bater ovos numa tigela ela, com o som que ouvia, começava logo a dançar. Nós achávamos imensa graça», conta o pai da atriz, Carlos Ruah. Daniela, que cresceu nos EUA, onde esteve até aos 6 anos, com os dois pais médicos, começou a aprender sapateado e depois em Portugal ainda teve aulas de ballet. «Mas sempre nos disse que o que queria era representar», conta Carlos Ruah. Em 2000 estreou-se como a jovem Sara, numa novela da TVI, mas nove anos depois já estava nos EUA, tornando-se a agente especial Kensi Blye na série policial Investigação Criminal Los Angeles, da CBS. Pelo meio fez alguns papéis em filmes, como Red Tails, de George Lucas. «Tenho sorte que o meu trabalho tenha tido visibilidade mundial», diz Daniela Ruah.
Marcelo Rebelo de Sousa quando se tornou conselheiro
de Estado de Cavaco Silva.
O confronto político entrou cedo na vida de Marcelo Nuno Rebelo de Sousa. Aos 6 anos foi corrido do camarote presidencial do Centro Hípico da Gandarinha, em Cascais, naquele que seria o primeiro acto oficial do pai. Nem a imagem da criança, de calças curtas e casaco, impediu o então Presidente da República, Craveiro Lopes, de se dirigir rispidamente a Baltazar Rebelo de Sousa. – Quem é o senhor? – O novo subsecretário de Estado da Educação, que acaba de tomar posse. – E o menino? – É meu filho. – Filho de subsecretário não é subsecretário. O menino faz o favor de sair.
Começava aqui a relação do filho mais velho dos Rebelo de Sousa com o poder. Uma relação que se estendeu aos outros dois irmãos (na foto, em baixo, com Pedro e António, junto ao pai) e que torna impossível contar a história da família sem fazer o retrato político do País, desde o Estado Novo até à democracia. A partir do momento em que se alistou na Mocidade Portuguesa, em Abril de 1936, até ao dia em que partiu para o exílio, em Junho de 1974, Baltazar dedicou quase quatro décadas da sua vida à política. E quando caiu, com o regime, deixou dois filhos a trabalhar na construção da democracia. O terceiro havia de herdar outra vocação paterna: o sonho da lusofonia. Este último, Pedro, foi, durante anos, a companhia preferida de Oliveira Salazar.
A história começou a 8 de Dezembro de 1960, dia de Nossa Senhora, quando a criança foi levar um ramo de flores ao Presidente do Conselho, numa homenagem da Mocidade Portuguesa. Os discursos deram-lhe sono e adormeceu na cadeira de Salazar. Divertido, o ditador acordou-o e perguntou-lhe o que estava ali a fazer. Pedro, estremunhado, disse que não sabia, limitando-se a estender as flores. Salazar sorriu e murmurou algo como: "Deve ser o único, aqui, que diz a verdade…".
Semanas mais tarde, Pedro recebia um telefonema da governanta de Salazar, convidando-o para acompanhar o patrão num passeio. A amizade durou até aos 14 anos do rapaz, a quem o chefe de Estado chamava Zé Povinho. Todos os domingos, às 10h30, Salazar ia buscá-lo no carro oficial e daí seguiam até S. João do Estoril. O Presidente do Conselho perguntava-lhe pelos estudos e pedia-lhe que lhe contasse anedotas. No Natal, oferecia-lhe discursos autografados em troca de castanhas caramelizadas. Iam quase sempre sentados no banco de trás, com as cortinas corridas. Mas às vezes o governante afastava-as para acenar às pessoas. "Sempre com uma enorme timidez", recorda Pedro Rebelo de Sousa. E frisa a lucidez da figura. "Lembro-me de passarmos debaixo da ponte Salazar, hoje 25 de Abril, e ele dizer: ‘Esta ponte vai ter o meu nome mas isto não dura muito.’"
Quando chegava a casa, o rapaz era sujeito aos interrogatórios do irmão mais velho. Um dia, Marcelo encomendou-lhe uma pergunta: se a pessoa mais importante se senta à direita, porque é que Salazar ia à esquerda no carro? A resposta do político deixou Pedro aterrado: "São os homens da segurança que mandam. Se vier um tiro, atinge-te a ti."
Maria das Neves Duarte (em baixo com os filhos) costumava ilustrar as diferenças dos três filhos com uma história deliciosa. Dava 20 escudos a cada um para fazerem o que quisessem: Marcelo comprava livros, António guardava o dinheiro e Pedro ia com os amigos à pastelaria Tentadora e gastava tudo em pastéis de nata.
Talvez a mania dos livros seja uma herança genética. Em 1875, Manuel Joaquim Rebelo de Sousa, bisavô de Marcelo, gastou umas centenas de réis para imprimir o livro Conselhos de um Pai Extremoso, espécie de bíblia familiar para os dois filhos que se preparavam para emigrar para o Brasil. O lavrador e comerciante de Cabeceiras de Basto foi apanhado pela crise de 1870 e viu o negócio tremido. Com seis filhos para criar, não teve outro remédio senão separar-se de dois: Baltazar Joaquim e António Joaquim, que depois do Brasil partiram para Angola. Baltazar, o mais velho, não resistiu à malária e ao paludismo e morreu cedo. António sobreviveu e pôs-se a caminho do interior, onde acabaria a trocar bugigangas por café. Ao fim de 30 anos, fez fortuna e instalou-se em Luanda, onde abriu uma casa emblemática: o Catonho Tonho (expressão africana para "Ir à Loja do António").
Este homem tenaz (que enviuvou aos 50 anos e ficou com cinco herdeiros) casaria em segundas núpcias com Joaquina Leite da Silva (na foto, em baixo, nos anos 70), uma mulher 35 anos mais nova, natural de Celorico de Basto mas com sangue africano. Ironia das ironias, o primeiro herdeiro do casal , que dedicou a vida ao regime, chegou ao mundo um mês após a fundação do PCP: Baltazar Leite Rebelo de Sousa nasceu a 16 de Abril de 1921.
Órfão de pai desde os 6 anos, fez o liceu no Pedro Nunes, onde foi colega de Adriano Moreira. Sem ser um miúdo popular, organizava festas, jogava futebol e ia às matinés do Tivoli. Acabou inscrito na Associação dos Escuteiros de Portugal, onde tropeçou num amigo inseparável: Jorge Jardim, pai das irmãs Jardim e um dos homens mais influentes de Moçambique nos anos 60. Quando a Acção Escolar Vanguarda se converteu em Mocidade Portuguesa (MP), em Abril de 1936, Baltazar foi dos primeiros voluntários, ao lado do economista António Ricciardi e do historiador José Hermano Saraiva. A adesão à MP ditou-lhe o caminho político: o da ditadura militar, na defesa de ideias nacionalistas e republicanas.
Entre 1940 e 1944, Baltazar frequentou a Faculdade de Medicina de Lisboa sem entusiasmo. Queria seguir Direito mas o padrasto (o comerciante Joaquim Tenroso) contrariou-lhe a vocação. Foi por essa altura também que se apaixonou por Maria das Neves Fernandes Duarte, aluna interna do Colégio de Odivelas, órfã de pai e de mãe, que veio para Lisboa à guarda de um tio padre, Monsenhor António Fernandes Duarte. Como em todas as histórias de amor, não tardaram a chegar contrariedades – as famílias opunham-se ao namoro. Mas a 5 de Abril de 1947 foi deles a última palavra: casaram-se na igreja da Pena, em Lisboa. Como padrinhos, Marcello Caetano e a mulher, Teresa; e José Augusto Soares Franco (da família que detém a produtora de vinhos José Maria da Fonseca) e a mulher, Carlota. Não houve um único familiar presente na cerimónia.
O primeiro filho nasceu no número 102 da Rua de São Bernardo (à Estrela), a 12 de Dezembro de 1948. Foi Marcelo por causa do outro Marcello, Caetano (de quem Baltazar fora ajudante na Mocidade), que à última hora declinou o convite para padrinho, alegando ser mais velho do que o pai da criança e incapaz de o substituir se fosse preciso. A 21 de Maio de 1952 nasceu António Jorge. Herdou o nome de Monsenhor António Fernandes Duarte, entretanto reconciliado com a sobrinha.
Quando Baltazar entrou para o governo, a 21 de Julho de 1955, como subsecretário de Estado da Educação, passaram a ser seis, em vez de quatro: nasceu Pedro, a 29 de Abril, e arranjaram uma empregada, que levava os meninos à escola, ou melhor, ao Lar da Criança, um colégio moderno que abriu numa sexta-feira 13, em Outubro de 1950, com 13 alunos – entre eles Ruben de Carvalho (do PCP), Nuno Fernandes Thomaz (do CDS-PP), João Caraça (filho do matemático Bento de Jesus Caraça) e o próprio Marcelo.
"Era uma criança mimada, mas sem excessos. Calmo, amigo dos outros. Não me lembro de o ver fazer uma birra", garante Berta Ávila de Melo (Bertinha para os alunos), fundadora da escola, hoje com 90 anos [na foto, em baixo, tirada em 2006]. Os olhos brilham-lhe quando fala dos Rebelo de Sousa. "O Marcelo era óptimo aluno. Já tinha o dom da palavra."
Sempre que se portava bem, ganhava uma pastilha de açúcar. Também se perdia pelo bacalhau amarelo (à Brás) e por hambúrgueres com esparguete. A certa altura, deu-lhe para ser importante. Berta não esquece o raspanete que lhe deu quando o viu a dar ordens. "O teu pai foi para o governo mas tu não és ministro. Não quer dizer que não venhas a ser, mas agora és igual aos outros." António, o filho do meio, era mais difícil. "Tinha mais mimo porque era asmático". Já Pedro continua íntimo da casa. "Não falta a uma festa da escola."
Nem nos períodos mais conturbados Baltazar descurou a família. Jantava quase sempre com as crianças e ao serão davam uso à caixa enorme que o governo lhes mandara para casa: uma televisão para assistirem às primeiras emissões regulares da RTP, que foram para o ar a 7 de Março de 1957. Também receberam uma telefonia Siemens e dois telefones, um normal e outro branco, para as chamadas de Estado.
Quando acompanhava o marido nos programas oficiais, Maria das Neves socorria-se da sua imaginação e bom gosto para reciclar toilettes. O ordenado de Baltazar não chegava para os modelos da Candidinha, a loja da moda, ou para os chapéus da Gardénia. Mesmo assim, tinham vida social. Marcelo descreve-a, na fotobiografia dedicada ao pai. "Uma ida por mês ao Mónaco ou à Choupana [restaurantes da linha de Cascais], onde o regime envelheceria ao som de Shegundo Galarza. E quando o rei faz anos, uma ida ao Parque Mayer."
Viagens ao estrangeiro eram impensáveis. Mas nada disto tirava o sono a Baltazar, que continuava fiel ao estilo de vida espartano. "Até o meu pai ir para o governo, vivemos com algumas dificuldades. Mudávamos as solas aos sapatos, virávamos os colarinhos às camisas e púnhamos remendos nos cotovelos", conta Marcelo à SÁBADO. Um dos seus melhores amigos, Carlos Pires, entretanto falecido, nascera em berço de ouro. "Tinha uma casa com jardim e muitos carros." Foi lá que o professor jogou pela primeira vez Monopólio. No Verão de 1959, quando estava de cama com gripe, pediu ao pai que lhe comprasse um. Baltazar não se pôde dar a esse luxo: o jogo custava quase um décimo do seu ordenado. Marcelo ficou triste mas nunca se sentiu inferior. "Percebia que os meus pais faziam outras coisas." A mãe acompanhava-os nos estudos e ensinava-os a pensar. "Possuía uma inteligência muito masculina. Foi ela que nos falou de sexo. Tinha jeito para as tarefas domésticas mas discutia política com os homens", recorda. O irmão mais novo confirma o clima erudito. "Os meus pais recebiam o L’ Express, o Nouvel Observateur e o Le Point. Aos 7 anos ouvia e participava em discussões sobre a independência da Argélia."
Em Maio de 1961 Salazar remodelou o governo e Baltazar (marcelista) saiu de cena, como o próprio Marcello Caetano. O jejum político teve um lado bom. No Verão desse ano, Jorge de Mello, um dos donos do grupo CUF, convidou-o para administrador da seguradora Império. A extravagância da família foi alugar o segundo andar do prédio e ligá-lo ao primeiro. Manuel Botto, vizinho e amigo (tratava os Rebelo de Sousa por pais) diz que mantiveram a modéstia. "O pai Baltazar nunca deixou de ir à mercearia. E falava com toda a gente no bairro."
Marcelo parece ter herdado esse despojamento. "Sou desprendido, mas chateiam-me um bocadinho os ricos. No Pedro Nunes, era colega do filho do Jorge de Mello, patrão do meu pai, e pegámo-nos muitas vezes. Não sei se não era por causa disso..." Nessa altura, almoçavam quase todos os dias juntos. Pedro recorda: "O meu pai dava créditos por notas. Quem tinha ‘Bom’ ganhava um soldadinho, ‘Bom Mais’ dava direito a dois e ‘Muito Bom’ a três. Fizemos um exército." Tinham aulas particulares com professoras de línguas. E não é por acaso que, no ano em que coincidiram no Liceu Pedro Nunes, ficaram os três no quadro de honra. À medida que foram crescendo, os prémios evoluíram. "No início do quarto ano, o Marcelo propôs-se tirar 18 valores em troca de uma mota. E conseguiu." Ganhou uma Pachancho, produzida em Braga.
O bom humor de Baltazar estava de volta. Aos fins-de-semana levava a família a passear no seu BMW em segunda mão e cantava músicas brasileiras. A seguir vieram as férias pela Europa, de carro, com casais amigos. Marcelo tinha um estranho hábito. "Trazia as manteigas dos restaurantes no bolso. Em Paris, saiu do carro com o casaco cheio de nódoas", conta António. No liceu, Marcelo dava nas vistas. Namoradeiro, andou aos beijinhos com a actriz Ana Zanatti, mas o primeiro amor chamava-se Isabel Alvez. Era morena. "Sempre tive tendência para morenas, embora com afloramentos…" Mais loura, bonita, era Teresa Beleza, irmã da ex-ministra Leonor. A paixão durou ano e meio. Criativo, Marcelo esmerava-se. "Fiz loucuras. Preparava jantares e era imaginativo nos presentes."
A 17 de Junho de 1968, depois de mais uma remodelação política, Baltazar chegou ao cargo da sua vida: governador-geral de Moçambique (no país, com Marcelo, na foto em baixo). Em dois anos fez coisas impensáveis. "Abriu as portas do palácio da Ponta Vermelha aos negros. Recebeu gente como o pintor Malangatana ou o poeta José Craveirinha, que tinha estado preso pela PIDE em condições terríveis", conta o jornalista Rui Cartaxana, então director da revista O Tempo em Moçambique e opositor do regime.
Baltazar queria integrar-se nas classes mais baixas e dar um sinal de abertura. Autorizou a circulação de livros proibidos, tirou intelectuais da prisão e preparou um plano de viagens por toda a província, para ir ao encontro de civis e militares. Almeida Santos, na altura chefe da oposição democrática, e seu rival, reconhece-lhe a determinação. "Éramos adversários mas tínhamos uma admiração mútua. Tive um grande acidente de carro e ele foi ver-me ao hospital. Foi um escândalo." O casal não encaixava nos cânones da altura. "A direita, conservadora e patriótica, achava que eles eram malucos. A esquerda pensava que estavam ali a fazer um frete", diz Cartaxana.
Marcelo ficou em Lisboa. Pedro e António não: estudavam no Liceu Salazar e viviam num palácio com 40 empregados. Mas nem assim o pai amolecia. "Tínhamos piscina, campo de ténis, mas não podíamos convidar amigos", diz António. Iam a festas a clubes e ao hotel Polana, onde dançavam com as irmãs Jonet e as Jardim [Xenica e Patucha]. O filho mais novo acompanhava a mãe nas obras sociais. "Organizámos aulas de português para os empregados do palácio, fizemos concursos de reabilitação de palhotas. E íamos visitar muitas obra de freiras." Cartaxana confirma: "Maria das Neves dedicou-se muito a ajudar os desfavorecidos." O seu nome ficou numa das maiores creches de Moçambique, no Caniço. Mesmo após a independência, Samora Machel quis mantê-lo. Também por isso o casal teve uma multidão de negros a despedir-se no aeroporto.
O Portugal a que Baltazar regressou para ministro das Corporações e Previdência Social, da Assistência e depois da Emigração tinha mudado. E muito. A intriga política fervilhava e a classe média estava farta de sacrifícios. Em casa, as cores políticas começavam a distingui-los. Prestes a iniciar o quinto ano de Direito, Marcelo formou um núcleo de reflexão cristã, o Grupo da Luz, com António Guterres. O irmão do meio, que estudava no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF), era o mais radical. "Para chocar o meu pai, usávamos gravata preta nos actos eleitorais", conta António.
No Verão de 70, Marcelo conheceu a mulher, Ana Cristina Motta Veiga, filha de outro ministro de Salazar, António Motta Veiga. O namoro começou de forma pouco convencional: "Ela entrou numa festa de braço dado com o antigo namorado e saiu minha namorada." A futura educadora de infância afastava-se do seu padrão feminino. "Talvez tenha sido uma reacção de cansaço às mulheres que conheci, politicamente activas e intelectuais. Quis complementaridade".
Também nessa altura, António conheceu Maria Henriqueta Trigueiros de Aragão Pinto de Mesquita, herdeira dos fundadores da farinha Branca de Neve. Foi Marcelo que arranjou o encontro. "Convenceu-me a ir com ele, a namorada e a Mariazinha à Choupana." Não se arrependeu. A 7 de Fevereiro de 1971 pediu-lhe namoro em frente aos pastéis de Belém." Casaram no Verão Quente de 1975. Pedro desenrascou-se sozinho. Tinha 16 anos quando viu Ana Margarida Lobato de Faria Sacchetti, "Bi", na praia do Estoril. Foi amor à primeira vista. "Além de bonita, ela lia e recitava de cor Eugénio de Andrade e David Mourão-Ferreira."
Reencontraram-se para tomar chá. "Disse-lhe que tínhamos de começar a namorar. Levei-a a casa e no dia seguinte mandei-lhe cravos." Durante semanas, insistiu nas flores. Até que a mãe da cortejada, a escritora Rosa Lobato de Faria, interveio. "Telefonou-me a dizer que não tinha jarras para tantos cravos e a pedir-me que parasse."
Na madrugada de 25 de Abril de 1974, Marcelo Rebelo de Sousa ia a sair do jornal onde trabalhava, o Expresso, quando soube do golpe de Estado. À mesma hora, o ministro do Ultramar, Baltazar Rebelo de Sousa, foi avisado pelo major Silva Pais, director da PIDE, de que o Presidente do Conselho ia para o quartel do Carmo. Era quase meio-dia quando conseguiu falar com Marcello Caetano e passar-lhe alguma informação que o outro Marcelo ia dando à mãe. À hora do jantar, Baltazar tentou falar com Américo Thomaz, mas o secretário-geral da Presidência mandou-o entender-se com o primeiro-ministro. Percebeu que a sua vida política tinha acabado.
A 30 de Junho, ele e a mulher embarcaram para o Brasil com menos de 20 contos. Para trás ficavam os três filhos e um neto. Marcelo já era pai. Nuno nasceu de cesariana em Agosto de 73, no Hospital Particular. O professor assistiu ao parto. A sua modernice começara na gravidez. "Ia com a minha mulher fazer ginástica respiratória."
A revolução ameaçou a harmonia conjugal. "Foi aí que deixei de dormir. O Expresso fazia-se às tantas da manhã. De dia tinha aulas, à tarde havia reuniões partidárias e à noite ia fazer comícios até de madrugada." A mulher chegou a trabalhar de borla no partido para estar mais perto dele, mas não chegou. "Ela era do antigo regime e tudo isto lhe fazia confusão – o empenhamento político, os sustos. Houve períodos em que ela e o meu filho não podiam dormir duas noites no mesmo sítio." A época das perseguições revolucionárias foi complicada.
O dinheiro faltava (chegaram a fazer uma minicooperativa e a vender fruta e vinho a amigos de Cascais) e os estilos eram diferentes. O casamento acabou em 1981, quatro anos depois de nascer Sofia.
Entretanto, António, fundador e primeiro presidente da Juventude Social Democrata (JSD) e deputado pelo PSD, entrou em rota de colisão com Sá Carneiro, por defender um bloco central com o PS. Saiu do Parlamento com Sousa Franco em 1979. "Fiquei numa situação difícil, apesar de me terem acusado de oportunismo." Entrou para o PS em 1982 e um ano depois voltava a S. Bento. Mas não ficou muito tempo. Voltou-se então para a actividade empresarial. Primeiro com André Jordan, na operação de recompra da Quinta do Lago, depois com António Gonçalves da Silva, na empresa de estudos de mercado Euroexpansão. A seguir veio um negócio que correu mal – o projecto de Vale Navio, um dos primeiros empreendimentos de time-sharing do Algarve, que deu origem a vários processos.
Baltazar e Maria das Neves recompunham a vida em São Paulo. Foi um pupilo da Mocidade Portuguesa, José Pinto da Motta, que deu emprego ao político, como administrador numa fábrica de pneus. Durante anos, Baltazar acumulou estas funções com aulas na Faculdade de Direito de Pinhel. Duas vezes por semana, à noite, fazia 360 quilómetros para ir ensinar.
A 12 de Junho de 1982 Marcelo recebeu um telegrama da professora Bertinha a felicitá-lo pelo novo cargo: ministro dos Assuntos Parlamentares. Nesse dia, o cirurgião Eduardo Barroso recordou a infância. "Aos 10 anos disse a um primo meu que o Marcelo era a pessoa mais inteligente do mundo e que havia de ser Presidente da República ou primeiro-ministro." As funções de Estado apanharam o professor num novo papel: pai divorciado. "O Nuno reagiu bem, mas a Sofia era mais pequena e levou em cheio com o divórcio. Durante muito tempo, só comeu ovo cozido com esparguete." Nas férias de Verão de 82, levou-os para o Algarve. Pelo caminho, falou-lhes de sexo. "Foram umas férias loucas. Faltou-me dinheiro, esqueci-me dos cartões, a Sofia teve uma angina."
O Nuno reagiu bem, mas a Sofia era mais pequena e levou em cheio com o divórcio. Durante muito tempo, só comeu ovo cozido com espargueteMARCELO REBELO DE SOUSA
Em 1989 defrontou Jorge Sampaio nas eleições para a Câmara de Lisboa. Em campanha, guiou um táxi, recolheu lixo e nadou no Tejo. Perdeu as eleições num debate televisivo. "Foi esmagado porque se armou em politicamente correcto", diz Barroso.
Aos 74 anos, Baltazar regressou de vez a Portugal. Nessa altura António mudou-se para as Torres do Restelo com a mulher e os três filhos. Miguel, hoje com 29 anos, economista, a trabalhar na EDP; Luís, 27 anos, também economista, na Price Waterhouse Coopers; e Mafalda, de 23 anos, que está a acabar Direito.
Pedro Rebelo de Sousa ganhou fama como advogado no estrangeiro, primeiro no Brasil, depois em Nova Iorque. Foi fazer 30 anos a Manhattan, onde ocupou a vice-presidência do Citibank. Vizinho de Liza Minelli e Anthony Quinn, trocou os luxos por Portugal, onde veio privatizar o Banco Fonsecas & Burnay, em 1984. Hoje é sócio da Simmons & Simmons Rebelo de Sousa e pai de Afonso, 23 anos, designer, e de Mariana, 27, formada em Direito.
Marcelo acumulou todos os cargos, até chegar à liderança do PSD, em 1996. Sentiu, então, na pele, o peso da intriga. E pagou bem cara a factura. "Perdi brutalidades. Em 1995 ganhei uns 120 mil contos, o que dava uma média de 10 mil por mês. Como presidente do PSD passei a receber menos de mil."
Nos bastidores, engoliu uma zanga antiga com Paulo Portas em nome de uma nova AD. O sonho ficou pelo caminho. Em ruptura com o então líder do PP, demitiu-se e acusou-o de traidor. Dois dias depois, ao ler a crónica do então director do Expresso, José António Saraiva (com quem mantinha relações próximas há anos) ficou possesso. O próprio Saraiva recorda: "Tendo-se ele demitido do PSD acusando Paulo Portas de falta de carácter, eu dizer que eles eram iguais foi terrível." À distância dos anos, o arquitecto corrige: "Enquanto o Marcelo faz tropelias mas tem princípios morais, Portas é um lobo que vai até onde for preciso e mata. Nisso são diferentes, com vantagem para Marcelo."
O que tinha a dar já lhes dei [aos filhos]: educação, cultura, viagens. Não vai haver herança (...) Não tenho sentido de propriedade. Vivo numa casa alugada, passo férias num hotel e até o carro é aluguer de longa duraçãoMARCELO REBELO DE SOUSA
As tropelias de que fala Saraiva fazem parte do retrato psicológico traçado pelos inimigos. "É cerebral e destruidor, até com ele. Se chegasse a Presidente da República, fazia um golpe de Estado contra si próprio", diz um antigo dirigente do PSD. Os amigos pintam outro homem. "É generoso, quase sempre de forma secreta. Ajuda pessoas que ninguém imagina", garante Leonor Beleza.
Marcelo não perdeu a veia de casamenteiro. Em 1996 foi passar a Páscoa com os filhos ao Algarve e arranjou namorada para Nuno: Rita Megre de Sousa Coutinho, filha de uma das primeiras gestoras portuguesas, Isabel Antas Megre, e de um descendente de D. Francisco de Sousa Coutinho, conde do Funchal. "Fui ter com ela e disse-lhe que caso tivesse namoro devia acabar para começar com o meu filho." Nessa noite, Marcelo jantou em casa dos pais dela, velhos amigos. "Passei o tempo a vender o Nuno. Quando os mais novos chegaram de uma ida a Vilamoura, avisei: ‘Está combinado. Casam daqui a três anos e meio.’" Casaram três anos, cinco meses e um dia depois desta conversa.
Formado em Economia na Católica e a trabalhar na Portugal Telecom, Nuno tem descendência – Francisco, de 3 anos, e Maria Teresa, que completa 1 em Maio.
A filha Sofia, animadora educativa em bairros de lata, continua solteira. "Tem um grande temor de se comprometer."
Nenhum deles está à espera de enriquecer com o pai. "O que tinha a dar já lhes dei: educação, cultura, viagens. Não vai haver herança." Percebe-se. "Não tenho sentido de propriedade. Vivo numa casa alugada, passo férias num hotel e até o carro [um BMW] é aluguer de longa duração." Apego, só aos livros. Teve uma arquivista em casa para tratar de 33 mil exemplares, até mandar a biblioteca para Celorico de Basto. A sua nova mania é o vinho tinto. "Fiz uma garrafeira. Quando janto em casa de amigos, levo as minhas garrafas." Ao almoço prefere água e Trinaranjus de ananás. Na comida, é frugal. "Janto sempre mozarela com tomate para experimentar azeites e vinagres balsâmicos."
Apreciador de música, apaixonado por ópera, cultiva hábitos que já são mitos: como nadar no Guincho, dormir cinco horas por noite e fazer telefonemas às três da manhã.
É viciado em gelados Santini, devora jornais e televisão e adora fazer rir. Católico, com as missas sempre em dia, namora com Rita Amaral Cabral (na foto, em baixo), cunhada do patrão da TVI, Miguel Pais do Amaral, com quem se zangou, mas nunca pensou voltar a casar.
Dono de "uma inteligência felina", como diz José António Saraiva, é um homem só. "Vive em permanente tensão. E no meio desta algazarra toda, é um solitário", confirma Manuel Botto.
Inesperado num país onde se espera sempre o pior, já deixou de fazer previsões políticas, mas não se dá por vencido. Aos 6 anos foi enxotado por um Presidente da República e não baixou a cabeça. Isto quer dizer alguma coisa.
Artigo originalmente publicado a 30 de Março de 2006.
Salazar ficou internado no quarto nº 68, protegido por uma brigada da PIDE, enquanto o Governo decretou censura total. Quando entrou em coma, o hospital comprou um ventilador sueco, bem como uma cama especial.Clique para aceder ao dossiê Salazar morreu há 40 anos
Oliveira Salazar foi internado no dia 6 de Setembro de 1968 no Hospital da Cruz Vermelha, onde foi submetido de urgência a uma intervenção cirúrgica. A governanta de Salazar, D. Maria de Jesus Freire, manifestou o desejo que fosse no Hospital de Jesus, em Lisboa. A opção dos médicos, ditada sobretudo pelo chefe da equipa de cirurgia, Vasconcelos Marques, recaiu sobre a Cruz Vermelha. Este era, na altura, "talvez o hospital mais bem apetrechado e onde Vasconcelos Marques operava habitualmente a sua clínica particular" - explicou numa entrevista ao Expresso Maria Cristina Câmara, que fazia parte da equipa, como anestesista.
SEIS QUARTOS RESERVADOS, NO 6º PISO DO HOSPITAL
A 9 de Setembro - dois dias após a cirurgia -, o diretor clínico do hospital, Luís Lopes da Costa, fez saber por escrito que "a ala direita do 6º piso (até ao quarto 75) não deverá ser ocupada, até nova ordem". Ao todo, seis quartos.
Salazar ficou internado no quarto nº 68; os outros foram adstritos a Vasconcelos Marques, Cristina da Câmara, pessoal de enfermagem, outros clínicos - sem esquecer uma brigada da PIDE, encarregue da segurança ao presidente do Conselho.
CENSURA TOTAL À IMPRENSA
Desde o internamento do seu chefe que o Governo decretou a censura absoluta. No dizer do biógrafo de Salazar, Franco Nogueira, o subsecretário de Estado da presidência do Conselho, Paulo Rodrigues, deu "ordem aos serviços de censura para cortarem qualquer notícia sobre a saúde do presidente do Conselho".
O blackout viria a ser levantado parcialmente, com a divulgação de um primeiro boletim médico, distribuído aos órgãos de informação no dia da própria operação, 7 de Setembro. O presidente do Conselho "foi operado esta noite de um hematoma, sob anestesia local, encontrando-se bem", ouviu-se, logo às nove horas da manhã, no noticiário da Emissora nacional, pela voz do locutor Pedro Moutinho.
Segundo Franco Nogueira, o texto original do boletim sofreu duas alterações. A pedido do Presidente da República, Américo Tomás, os médicos haviam escrito "esta madrugada", o que foi emendado para "esta noite". Já por solicitação do subsecretário de Estado Paulo Rodrigues, quando se falava do "hematoma intracraniano", foi suprimida a segunda palavra.
"ESTOU MUITO AFLITO. AI, MEU JESUS!"
Os boletins saíram diariamente. Secos, lacónicos, mas sempre com um pontinha de otimismo, justificada pelas sensíveis melhoras detetadas no doente. A 15 de Setembro foi emitido o que prometia ser "o último boletim médico". A razão era simples: "O sr. presidente do Conselho entrou em franca convalescença e regressará brevemente à sua residência de Lisboa".
No dia seguinte, porém, o quadro alterou-se radicalmente. Franco Nogueira escreve que, findo o almoço, Salazar "sente um golpe de dor na cabeça, leva a mão direita à testa, diz: 'Estou muito aflito. Ai, meu Jesus!' E abandona-se sem sentidos na poltrona". Recorda o médico Eduardo Coelho, nas suas memórias, que "quando se desencadeou o violento acidente vascular cerebral com hemorragia no hemisfério direito, o doente entrou imediatamente em coma".
O quadro clínico não deixava margem para dúvidas. Ouvido o Conselho de Estado, o Presidente da República, Américo Tomás, tomou a decisão mais difícil da sua vida: a exoneração de António de Oliveira Salazar. Para o cargo, nomeou Marcello Catano, que tomou posse como presidente do Conselho a 27 de Setembro de 1968.
Em sério risco de vida, Salazar foi então entregue aos cuidados da médica Cristina Câmara. A anestesista durante a operação era agora a sua intensivista, responsável pelo difícil e problemático trabalho de reanimação. "Criei, na prática, uma Unidade de Cuidados Intensivos no quarto do dr. Salazar", contou Cristina Câmara.
UM VENTILADOR PARA O DOENTE DO QUARTO Nº 68
O Processo Clínico de Salazar no Hospital da Cruz Vermelha conserva os principais documentos relativos à cirurgia e doença
NUNO BOTELHO
Sem possuir um ventilador para poder dar assistência ao doente do quarto nº 68, o Hospital da Cruz Vermelha tratou de adquirir um, junto da empresa Alves & CA. (Irmãos), Lda.. A escolha recaiu sobre um ventilador de fabrico sueco, Engström, modelo 200.
Após mais de 31 mil horas de trabalho, o aparelho, já não está em uso e encontra-se num armazém do hospital. A última revisão, feita pela Iberdata, foi efetuada em 1998.
O registo de entrada do ventilador no hospital é de 1 de janeiro de 1970. É uma data fictícia: por essa altura, ventilador já acudira a Salazar e a outros doentes, além de que 1 de Janeiro é dia feriado.
Miguel Brandão Alves, o atual gerente da Alves & CA. (Irmãos), Lda., confirma que foi a empresa, então administrada pelo pai e avô, que forneceu o ventilador. "E também uma cama especial. O meu avô foi buscá-la no seu próprio carro, a Espanha ou a França, munido de um documento especial, para evitar complicações na fronteira".
47 MIL EUROS, PAGOS PELO MINISTÉRIO DA ECONOMIA
Na Alves & CA. não foi possível saber o custo quer do ventilador, quer da cama.
Numa "Conta de despesas" do Hospital da Cruz Vermelha, que faz parte do processo clínico de Salazar, há a indicação de um gasto efetuado com a Alves & CA. (Irmãos), Lda., no montante de 170 mil escudos - ou seja, cerca de 47 mil euros.
Tal como aconteceu na fase inicial do internamento, esta despesa esteve a cargo do Ministério da Economia - que viria mais tarde a ser ressarcido mediante um subsídio especial do Secretariado-Geral da Defesa Nacional, um departamento dependente do ministro da Defesa e que acabou por pagar o grosso das despesas de saúde de Salazar.
SEMIPARALISADO DO LADO ESQUERDO
O processo clínico conserva exemplares de quase todos os boletins médicos, desde 18 de Setembro a 6 de Novembro. Os documentos iam dando conta das flutuações do estado de saúde do fundador do Estado Novo. A de 24 de Outubro, por exemplo, os médicos Eduardo Coelho, Vasconcelos Marques, Almeida Lima e Miranda Rodrigues garantiam: "Acentuaram-se as melhoras do presidente Salazar, que já não está em coma". A 1 de Novembro, contudo, houve uma marcha-atrás: "Agravou-se o estado do Presidente Salazar (...) A respiração voltou a ser assistida permanentemente".
O boletim mais extenso foi o de 4 de Novembro, sete semanas volvidos sobre o AVC, e que era taxativo sobre o real estado de Salazar: "O período já decorrido após o acidente vascular, sem recuperação apreciável, não permite prever quaisquer melhoras das lesões do sistema nervoso". Semiparalisado do lado esquerdo, Salazar é o que na linguagem médica se designa de um "grande inválido".
ALTA DADA A 15 DE DEZEMBRO
O chefe da equipa de cirurgia, António Vasconcelos Marques (à esquerda), e o Presidente da República, Américo Tomás
GESCO
A 15 de Dezembro, Vasconcellos Marques, o chefe da equipa de cirurgia, comunicou por escrito à direção clínica do hospital que Salazar poderia ter alta ainda naquela semana.
Fê-lo em nome do Presidente da República, Américo Tomás: "Por decisão de Sua Excelência o Senhor Presidente da República, e de acordo com os Médicos assistentes, o Senhor Presidente Salazar deverá ter alta dessa Clínica e regressar à residência de S. Bento ainda durante esta semana. Igualmente por decisão de Sua Excelência, o serviço de Enfermagem a prestar" a Salazar na sua residência deverá continuar a cargo "do mesmo grupo de enfermeiras", devendo o hospital fornecer "todo o material necessário".
MÉDICOS CORTAM RELAÇÕES
Entretanto, as relações entre o cirurgião e o médico pessoal de Salazar azedaram - a um ponto que dariam lugar, já depois do 25 de Abril, a um muito controverso processo judicial. Vasconcelos Marques decidiu mesmo afastar-se do caso. A 19 de Dezembro, comunicou à direção do hospital que "dá por terminada a assistência clínica" que vinha prestando ao ex-Presidente do Conselho desde 6 de Setembro. "Em consequência de factos ocorridos e por motivos que pessoalmente expus a Sua Excelência o Senhor Presidente da República, fui autorizado, a meu pedido e desde esta data, a dar por terminada a assistência clínica" a Salazar. Assim sendo, Marques declarou-se "desligado de qualquer responsabilidade".
O chefe da equipa de cirurgia foi acompanhado, nesta atitude, pelos seus colaboradores, que "resolveram também e desde hoje cessar a Assistência que vinham prestando ao Presidente Salazar, atitude que é do conhecimento do Senhor Presidente da República com a qual concordou e deu a sua autorização".
Apesar da alta ter sido dada a 15 de Dezembro, Oliveira Salazar só deixou o hospital a 5 de fevereiro de 1969. Viria a falecer em S. Bento, a 27 de Julho de 1970, com 81 anos.
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É precisamente nestes add-ons que, para muitos, o problema do Kodi reside. Nem todos os conteúdos são legais e agora o Kodi pode estar a espiar os utilizadores, detetando quem usa esses add-ons para aceder a esses conteúdos.
As permissões que as apps têm dentro dos sistemas operativos servem para balizar os componentes a que têm acesso, evitando problemas de segurança. Nem sempre funciona de forma perfeita, mas a verdade é que, no geral, sistemas conseguem garantir que as app não acedam ao que não devem.
Um investigador descobriu agora uma falha grave no iOS, que mostra que mesmo com acesso às permissões certas, qualquer app pode deixar vulnerável o utilizador, ao ter acesso indiscriminado às câmaras fotográficas.
Grande parte das comunicações é hoje realizada através do telemóvel ou então dos muitos serviços que existem online. Apesar de normalmente serem usadas contas pessoais, a verdade é que durante o horário de expediente a entidade patronal pode aceder aos e-mails dos empregados.
De acordo com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), o patrão tem direito a verificar se os empregados fazem o seu trabalho durante o horário laboral…no entanto é preciso informar o empregado que está a ser “monitorizado”.
Os últimos meses têm sido complicados para a CIA. Todas as suas ferramentas secretas, dedicas a espiar os cidadãos americanos e, provavelmente, de outros países, acabaram por ser tornadas públicas, revelando assim um dos seus mais bem guardados segredos.
Uma nova ferramentas foi revelada, mostrando desta vez que nem o Linux estava imune e que também podia ser espiado pela CIA.
Estranho e triste, ás vezes, mas majoritariamente emocionante, o vídeo acompanha a história de dois jovens russos: Ekaterina Nezhentseva, 19 anos, e Kiril, 8. Mas as imagens não condizem com sua idade, os dois, além da própria mãe de Kiril, Irina, padecem de uma rara doença genética que se caracteriza pela ausência do tecido adiposo sob a superfície da pele, fazendo com que pareçam ter muito mais idade.
Suas vidas são marcadas pela estranha doença chamada dermatocalásia, muito parecida a lipodistrofia, que lhes faz parecer idosos, ainda que estejam na flor da idade.
É muito estranho vê-los no meio de jovens de sua idade, sobretudo porque tem a mesma idade e experiência, mas nossos olhos insistem em nos pregar peças de que estão totalmente fora do contexto. Se isso é estranho para aquele que vê em terceira pessoa, imaginem só quem vive isso, literalmente na pele.
Mesmo que seus organismos não registram maiores danos, suas aparências são de idosos desde uma idade muito precoce. Mas no fundo Irina é apenas uma jovem mãe; Ekaterina, uma pós adolescente cheia de sonhos, fascinada e predestinada a levar a frente sua primeira gravidez; e Kiril, uma criança que só quer saber de brincar como todas as outras. Corações jovens que são forçados a viver por detrás da estranha aparência de pessoas muito mais velhas.
Não deixe de ver até o fim que reserva uma surpresa de 53 centímetros e 3 kg, Gleb.
VÍDEO
Aproximadamente duas mil pessoas em todo mundo contraem esta doença, que é contraída principalmente de forma hereditária, mas também há casos relacionados com efeitos colaterais de certas terapias medicamentosas. O transtorno não tem cura e pode se manifestar com maior ou menor grau de envelhecimento, mas alguns pacientes podem melhorar seu aspecto físico mediante intervenções estéticas.
«Marx não foi nem profeta nem um criador de utopias: foi um teórico rigoroso e o essencial das suas descobertas permanece o fundamento necessário para a análise da sociedade contemporânea.»
Vista por muitos como “a bíblia” da revolução, há 150 anos era lançada a obra O capital, de Karl Marx (1818-1883). Em nome do intelectual alemão e sua obra maior, muitas batalhas políticas e ideológicas são travadas até hoje. Em entrevista ao Brasil de Fato, concedida por e-mail, o professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) José Paulo Netto, que se define como comunista, desmistifica a obra.
Netto defende o conteúdo como um “programa analítico que deve ser sistematicamente desenvolvido”. Além disso, fala dos principais pontos de análise estruturados por Marx no livro, das crises do capitalismo como oportunidades para mudança social, do poder da conscientização dos trabalhadores e, por fim, das questões de raça e gênero, tidas como “pós-modernas”, que ganham novas leituras e esquentam os debates sobre a luta de classe
Brasil de Fato: Como vê a importância da obra e o que ela representa?
José Paulo Netto: A meu juízo, o caráter clássico dessa obra de Marx reside em que ela, centrada na análise social da produção econômica capitalista e evidenciando as suas inextirpáveis contradições, permitiu-lhe elaborar uma teoria sobre a gênese, a constituição e a dinâmica da sociedade burguesa. Depois de Marx, nenhuma outra construção científica foi capaz de explicar e compreender tão rigorosamente, numa perspectiva histórica e crítica, as condições objetivas que propiciam a vida social cada vez mais diversificada e complexa da sociedade em que vivemos. O que Marx nos oferece n’O capital (e o livro I contém a sua fundamentação) é a teoria que expressa, nas suas tendências mais essenciais, o movimento histórico real do que chamamos capitalismo.
Nas pesquisas que realizou, à base da dialética de Hegel, Marx descobriu o mecanismo fundamental sobre o qual se ergue a sociedade burguesa: a exploração do trabalho pelo capital. Evidentemente, corridos um século e meio desde a publicação d’O capital, a organização econômica e social da nossa sociedade se transformou profundamente — o capitalismo do século XXI não é o capitalismo do século XIX. Mas o capitalismo, uma vez constituído, só pode assentar na exploração do trabalho — não existe capitalismo sem a exploração do trabalho pelo capital. Marx não foi nem profeta nem um criador de utopias: foi um teórico rigoroso e o essencial das suas descobertas permanece o fundamento necessário para a análise da sociedade contemporânea.
Brasil de Fato: Quais seriam os principais pontos estruturados por Marx n’O capital?
José Paulo Netto: Mediante uma exaustiva pesquisa, coube a Marx demonstrar n’O capital que: 1. O capitalismo dispõe de extraordinário dinamismo para a produção de riquezas materiais e exerceu, historicamente, um papel civilizador; 2. Na medida em que se desenvolve, o capitalismo revela contradições que se manifestam nas suas crises periódicas; 3. Nessa mesma medida, o papel civilizador do capitalismo se atrofia e se converte no seu antípoda, a barbarização da vida social; 4. O capitalismo, a partir da sua plena maturação, engendra fortes tendências ao bloqueio da sua própria dinâmica; 5. O capitalismo não é a expressão de uma pretensa ordem natural nem, menos ainda, o fim da história: é uma modalidade temporária, transitória e substituível de organização da produção e distribuição das riquezas sociais.
Brasil de Fato: O capitalismo estudado por Marx é diferente do capitalismo de hoje?
José Paulo Netto: Já observei que o capitalismo contemporâneo está longe de ser aquele estudado empiricamente por Marx. Ao longo dos seis primeiros decênios do século XX, o regime do capital experimentou modificações ponderáveis. Mas é especialmente a partir dos anos 1970 que suas alterações se tornam muito mais substantivas — e, desde então, explicitamente operadas sob o comando do capital, com o movimento das classes trabalhadoras claramente na defensiva. Trata-se de todo um quadro histórico-social e cultural muito diverso daquele com o qual Marx se defrontou.
No entanto, no tocante aos processos diretamente conexos à organização econômico-política da sociedade contemporânea, parece-me que Marx tem muito a contribuir. A dinâmica mundial protagonizada pelas mega-corporações é inexplicável sem o recurso aos textos d’O capital que abordam as tendências à concentração/centralização do capital; a planetarização do capitalismo (o que vulgarmente se popularizou sob a rubrica de “globalização”), bem como a sua financeirização. O atualmente crônico problema do desemprego (sob todas as suas várias formas) e suas sequelas sobre dezenas de milhões de homens e mulheres só se torna inteligível se recorrermos à marxiana concepção da “lei geral da acumulação capitalista”.
Brasil de Fato: É correto se voltar a Marx para entender e reagir às recentes ameaças aos trabalhadores, a exemplo da precarização dos direitos trabalhistas?
José Paulo Netto: É importante afirmar que Marx não foi profeta nem visionário. Sua obra está marcada pelo seu tempo histórico e toda uma série de questões que hoje problematizam a ordem do capital, em especial questões de natureza política e cultural, não foram, nem poderiam, ser equacionadas por ele. O capital não é uma bíblia nem um receituário: é um programa analítico que deve ser sistematicamente desenvolvido. É fato que questões como as indicadas na pergunta não receberam dele um tratamento direto e/ou conclusivo. Mas é igualmente factual que o cuidado para com elas tem encontrado por parte de marxistas contemporâneos abordagens fecundas e esclarecedoras — o que é uma prova cabal de que o método de análise empregado por Marx continua se apresentando como válido no confronto com o capitalismo contemporâneo.
Brasil de Fato: Pode contar um pouco sobre a visão de Marx sobre a importância das crises do capitalismo e como elas devem ser vistas pelos trabalhadores?
José Paulo Netto: O Capital, fruto de décadas de pesquisa, apresenta uma análise rigorosa do processo de constituição e desenvolvimento da ordem do capital. Desta análise, Marx extraiu a compreensão das crises econômicas como componente necessário da dinâmica do capital – nas crises se expressa o caráter contraditório do movimento do capital: elas não são sinais episódicos de uma “disfunção” qualquer, mas um constitutivo da regência do capital sobre a vida social. Numa palavra, não existe capitalismo sem crise. Por isso mesmo, entendo que, para Marx, das crises periódicas, ou cíclicas, do capitalismo o que resulta, como derivação econômica, é mais capitalismo. Aquilo que uma crise de maior dimensão – digamos: uma crise estrutural-sistêmica – pode oferecer aos trabalhadores é a possibilidade de encontrarem e viabilizarem para ela uma solução política. Aqui, a alternativa a mais capitalismo só pode ser o de uma reestruturação radical da organização política, que suprima o poder político do capital. Em síntese: a passagem do poder político do controle do capital ao poder político dos trabalhadores, a revolução.
Brasil ne Fato: A revolução para Marx seria produto da ação dos trabalhadores. Ele mesmo além de teórico foi militante, pode contar um pouco sobre isso?
José Paulo Netto: Marx sempre a compreendeu a revolução como uma variável resultante do nível de consciência social dos trabalhadores e das suas vanguardas. Não separemos o Marx “teórico” do Marx “político”; em 1847-1848, ele animou a Liga dos Comunistas; e durante a elaboração da sua obra principal, jogou todas as suas forças na Associação Internacional dos Trabalhadores/AIT. Ao longo de toda a sua vida, a consigna Liga pareceu-lhe válida (Proletários de todo o mundo, uni-vos!), bem como nunca duvidou de que a emancipação dos trabalhadores seria obra deles mesmos. E Marx jamais estabeleceu uma muralha chinesa entre a luta pelas reformas possíveis para melhorar a condição de vida dos trabalhadores e a perspectiva revolucionária – basta pensarmos como ele acolheu a limitação da jornada de trabalho conquistada pelo proletariado inglês. Ademais, Marx, como dirigente da AIT, nunca concebeu a ação revolucionária exclusivamente como processos insurrecionais.
Brasil de Fato: Há análises que apontam que a questão de gênero tem lugar marginal em O Capital. Como enxerga isso?
José Paulo Netto: Já é coisa velha. Notadamente no âmbito acadêmico, o barato senso comum de afirmar-se que Marx não deu atenção significativa à esfera da cultura e dos valores. Ora, a leitura atenta de vários textos de Marx revela o seu cuidado para com esta esfera das objetivações humanas. Quanto a’O capital – que não é um tratado de antropologia e, menos ainda, de psicologia: é a fundação da teoria social a partir da crítica da economia política -, sugiro que se examine a paixão e o ódio com que Marx trata a exploração do trabalho feminino (e também infantil) no sistema fabril do seu tempo para averiguar da sua atenção para com a mulher (trabalhadora). Por outra parte, desde 1848, quando Marx tinha George Sand em alta conta e o movimento sufragista dava os seus primeiros passos, o programa político de Marx para a Alemanha reclamava o direito ao voto universal para todos os maiores de 21 anos. E, para além de Marx, no que toca aos “clássicos”, parece-me merecer uma leitura atenta, sem preconceitos, o Engels d’A origem da família, da propriedade privada e do Estado, para constatar que, no horizonte desses “clássicos” do século XIX, a crítica ao patriarcado e a defesa das aspirações femininas não foi adjetiva.
Brasil de Fato: Há análises que declaram, por exemplo, que não há capitalismo sem racismo. Como isso está presente ou não na obra de Marx?
José Paulo Netto: Quem domina a análise marxiana do processo da acumulação originária (ou primitiva) bem sabe da relevância da escravatura moderna, dos africanos submetidos ao tráfico e dos povos originários do que se chamou Novo Mundo, para a constituição do capitalismo. E conhece o ódio de Marx contra toda e qualquer forma de opressão — em Marx, a emancipação humana é o objetivo que deu sentido e significado à sua vida e à sua obra. Outro problema é o do racismo moderno. Embora deitando raízes na expansão comercial euro-ocidental iniciada nos séculos XVI e XVII, ele está diretamente vinculado ao erguimento e consolidação dos impérios coloniais ao largo dos finais do século XVIII e de todo o século XIX e ganha, com a emergência do imperialismo, a sua feição mais abjeta. Parece-me que é correta a afirmação, em face deste racismo, que ele é um corolário do capitalismo.
Brasil de Fato: Os movimentos de mulheres e movimentos negros recentes, vêm articulando a ideia da importância do tripé de gênero, raça e classe inseparáveis e com o mesmo peso nas construções sociais. Como vê isso?
José Paulo Netto: Responderei com um episódio da minha vida acadêmica. Há trinta anos, a professora Heleieth Saffioti, estudiosa já falecida e que sempre respeitei, expôs-me a ideia à qual você alude — e ela ressalvava que, no “tripé”, havia que ponderar cuidadosamente os seus suportes. Diante da minha observação de que julgava que a dimensão da classe constituiria o momento determinante, Heleieth sorriu e argumentou: ‘Para verificá-lo, necessitamos de avançar na pesquisa’. Considero que o programa de pesquisa a que Heleieth se referiu há trinta anos fez grandes progressos desde então — mas eu, que não sou um conhecedor profundo de tais avanços, ainda continuo cético diante dos resultados de estudos que equalizam a ponderação dos componentes do “tripé”.
A Maçonaria é uma Ordem iniciática e ritualistica, universal e fraterna, filosófica e pregressista, baseada no livre-pensamento e na tolerância, que tem por objectivo o desenvolvimento espiritual do homem com vista á edificação de uma sociedade mais livre, justa e igualitária.
A Maçonaria não aceita dogmas, combate todas as formas de opressão, luta contra o terror, a miséria, o sectarismo e a ignorância, combate a corrupção, enaltece o mérito, procura a união de todos os homens pela prática de uma Moral Universal e pelo respeito da personalidade de cada um. Considera o trabalho como um direito e um dever,valorizando igualmente o trabalho intelectual e o trabalho manual.
A Maçonaria é uma Ordem de duplo sentido: de instituição perpétua e de associação de pessoas ligadas por determinados valores, que perseguem determinados fins e que estão vinculadas a certas regras.
É Iniciática, porque só pode nela ingressar quem se submeta á cerimónia de iniciação, verdadeiro “baptismo” maçónico, que significa literalmente o começo, e simboliza a passagem das trevas á “Luz”.
É ritualista, porque as suas reuniões obedecem a determinados ritos, que traduzem simbólicamente, sinteses e sabedoria, remontando aos tempos mais recuados.
É universal e fraterna, porque o seu fim ultimo é a fraternidade universal, ou seja, o estabelecimento de uma única familia na face da Terra, em que os Homens sejam, no seio da Ordem, verdadeiramente irmãos, sem qualquer distinção de raça, sexo, religião, ideologia e condição social.
Como escreveu Fernando Pessoa, “a Nação é a escola presente para a Super-Nação futura”. Amar a Pátria e a Humanidade é outro dos deveres dos Maçons.
É filosófica. porque, ultrapassada a fase operativa (coorporações de arquitectos/construtores medievais), transformou-se numa associação de caracter especulativo, procurando responder às mais profundas interrogações do Homem. Conserva contudo, o vocabulário, os utensilios e a simbologia dos pedreiros construtores dos antigos templos.
Afinal, o fim último da Maçonaria é a construção de um Homem novo e de uma Sociedade nova. Por isso, todos os seus ritos assentam na ideia de construção e são baseados na geometria, a mais nobre das artes, porque só ela permite compreender a medida de todas as coisas. Assim se justifica que a régua, o esquadro e o compasso continuem a ser instrumentos previligiados do pensamento maçónico.
É progressista, porque visa o progresso da Humanidade, no pressuposto de que é possível um homem melhor numa sociedade melhor. Encurtar as desigualdades e reduzir as injustiças sociais é um dos seus objectivos, através da elevação moral e espiritual de cada individuo. Porém a Maçonaria não é uma instituição política e, muito menos, partidária. Está acima de todos os partidos, coexistindo nela pessoas das mais diversas sensibilidades, crenças e ideologias… A Maçonaria é assim um espaço de diálogo e de tolerância. A sua influência na Sociedade não se exerce directamente,… mas apenas indirectamente, através do exemplo, da pedagogia e da influência individual dos seus membros nos locais ondem exercem a sua actividade: no emprego, nos partidos, nas organizações cívicas e sociais…
É livre pensadora, porque não aceita dogmas, pratica a tolerância e respeita a liberdade absoluta de consciência. O Maçon tem o direito de examinar e de criticar todas as opiniões e de discutir todos os problemas, sem quaisquer peias ou limitações. A Maçonaria é anti-dogmática, tanto no aspecto politico como religioso ou filosófico. A política e a religião pertencem ao foro intimo de cada um e não podem ser discutidas, salvo nos termos genéricos acima referios, para não abalar a união do povo maçónico, pois, como se disse, a instituição congrega pessoas de todas as crenças ou sem crença nenhuma, de todas as ideologias não totalitárias.
Assim é rotundamente falsa a acusação que vem dos tempos do “Santo Oficio” e que foi retomada pela ditadura deposta em 25 de Abril de 1974 devque os Maçons, ou pedreiro livre, é contra a religião. Muitos e ilustres membros da Ordem foram e são crentes e , até, bispos e cardeais.
A Maçonaria aceita, aliás, a existência de um princípio superior, simbolozado pelo “Grande Arquitecto do Universo” (G.A.D.U.), que não tem definição e que cada um interpreta segundo a sua sensibilidade ou convicção. Para uns será o Deus em que acredita, para outros o Sol, fonte de vida, a própria natureza, a lei moral ou ainda a resultante de todas as forças que actuam no Universo. Esta ideia implica o respeito por todas as religiões, pois todas são igualmente verdadeiras, sem prejuizo do necessário combate ao fanatismo e à superstição.
Nos tempos remotos e medievais, o Maçon era obrigado a perfilhar a religião do seu País. Mas depois do Iluminismo, e das formas modernas, considerou-se mais adequado, apenas lhe impôr a religião sobre a qual todos estão de acordo, e que consiste em amar o próximo, fazer o bem e ser homem bom, de honra e probidade. Deste modo a Maçonaria é uma casa de união entre ateus, agnósticos e pessoas dos mais diversos credos.
Deve porém dizer-se que a Maçonaria Regular, Tradicional ou de Via Sagrada, por oposição ao ramo Liberal ou Laico, impõe, a crença em Deus e na imortalidade da alma, excluindo também as mulheres. No entender de alguns Maçons este facto viola os principios maçónicos e contitucionais de igualdade (art.13º da Constituição da Republica Portuguesa). Ao manter uma velha tradição de 300 anos, que teima em não adequar aos valores ético-humanistas do nosso tempo, o ramo tradicional ou anglo-saxónico exclui da dignidade maçónica três quartos da Humanidade.
Importante base naval e quartel-general da armada norte-americana do Pacífico desde 1887, situada na costa sulda Ilha Oahu, Hawai, 10 km a oeste de Honolulu. Entre 1898, altura em que os Estados Unidos anexaram as ilhas do Hawai, e 1911 registaram-se importantes trabalhos de melhoramento das condições portuárias, sendo construído um canal que possibilitou a utilização do porto por navios de grande calado.Na manhã de 7 de dezembro de 1941, submarinos japoneses e aviões de combate lançados de porta-aviões atacaram a frota americana do Pacífico estacionada em Pearl Harbor. Apesar de a base se encontrar defendida por sofisticados dispositivos antiaéreos, foi incapaz de se defender do ataque surpresa da aviação imperial japonesa. Também os aérodromos vizinhos foram alvo dos ataques da aviação nipónica. Dezoito navios, entre os quais oito vasos de guerra, foram afundados ou gravemente atingidos, cerca de 200 aviões americanos foram destruídos e aproximadamente 3 mil marinheiros, soldados ou pessoal militar, foram mortos ou feridos. O ataque causou profunda indignação, pois foi efetuado sem uma declaração prévia de guerra. Marcou a entrada do Japão na IIGuerra Mundial ao lado da Alemanha e da Itália e a dos Estados Unidos ao lado das forças aliadas.Pouco depois desta ação, o presidente Franklin D. Roosevelt nomeou uma comissão de inquérito para esclarecer se a negligência dos comandos americanos contribuiu para o sucesso dos japoneses; o relatório da comissão foi particularmente severo para com os responsáveis militares; o contra-almirante Husband Kimmel e o general Walter Short foram considerados negligentes e culpados de "erros de julgamento". Estas conclusões foram polémicas eas investigações prosseguiram para lá de 1945. Em julho de 1946 foram retiradas as acusações de negligência e mantidas apenas as que indiciavam erros de julgamento; de qualquer modo, este ataque trouxe à evidência uma certa falta de comunicação entre os diferentes ramos das forças armadas norte-americanas e, seguindo as sugestões da última comissão de inquérito nomeada para estudar o caso, foram unificadas. Em Pearl Harbor, oUSS Arizona National Memorial, erguido nos restos daquele navio, destruído durante o ataque, homenageia os americanos mortos naquele dia.
Pearl Harbor. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. wikipedia (Imagens)
Fotografia tirada de um avião japonês ao início do ataque. A explosão no centro é o resultado de um ataque torpedeiro contra o USS Oklahoma
O USS Arizona em chamas após ser bombardeado pelos japoneses VÍDEO
Artur Virgílio Alves dos Reis nasceu em 1896, em Lisboa, no seio de uma família modesta. Ainda começou um curso de Engenharia, mas não passou para além do 1.º ano, devido ao casamento com Maria Luísa Jacobetty de Azevedo, em 1916, facto que o livrou da mobilização para a Primeira Guerra Mundial. Nesse mesmo ano parte para Angola, onde trabalhará nas Obras Públicas, chegando a ser inspetor. Foi também diretor dos Caminhos de Ferro naquela colónia. Este cargo foi obtido a partir da sua primeira burla conhecida, quando forjou um diploma de Engenharia pretensamente obtido em Oxford, com capacidades para gestão industrial e financeira. A partir de 1919, Alves dos Reis dedicou-se ao comércio de produtos entre a colónia e a metrópole, sempre com golpes e ilegalidades. Acumulou algum capital, regressando a Lisboa em 1922, onde criou a firma Alves dos Reis, Ldª. Investiu também numa empresa mineira em Angola, assumindo-se cada vez mais como um grande empresário.
No entanto, tanto Portugal como a sua colónia de Angola, sentiam de forma profunda a grave crise económica europeia resultante da Grande Guerra. Alves dos Reis ressentiu-se imenso dessa situação difícil, embora tenha encontrado maneiras de a superar. Como sempre alimentara o sonho angolano, acreditava firmemente que seria aquela colónia a sua rampa de lançamento para negócios em maior escala, fosse de que maneira fosse. Assim, virou-se para a Ambaca, empresa ferroviária estatal de Angola, a qual queria controlar através da posse da maior parte das suas ações. Estas, conseguiu-as adquirir através de uma nova fraude, um cheque sem cobertura do National City Bank, de Nova Iorque, onde tinha conta. Alves dos reis pretendia vender as ações a um preço mais alto antes do cheque chegar ao seu destinatário. O principal comprador que Alves dos Reis tinha em vista era Norton de Matos, comissário-geral de Angola. Mas o negócio não se concretizou, e Alves dos Reis foi arrastado para os tribunais, com um processo judicial que lhe valeria uma detenção na prisão, entre 5 de julho e 27 de agosto de 1924, data do julgamento. Foi absolvido da acusação de desvio de fundos, mas culpado da emissão de um cheque sem cobertura.
Em 1925, todavia, Alves dos Reis entraria na história de Portugal como o seu maior burlão, a partir de uma gigantesca operação de fraude financeira. Nesse ano, Alves dos Reis montara um plano para criação de um banco - o Banco Angola e Metrópole - através da obtenção de fundos de que não dispunha. Formara uma equipa de especialistas: José dos Santos Bandeira, vigarista e irmão do embaixador português na Holanda; Karel Ysselveere, negociante holandês; Adolf Hennies, alemão, também negociante, profundo conhecedor dos meandros da diplomacia internacional. Então, Alves dos Reis, em Inglaterra, mandou imprimir 580 000 notas de 500 escudos, fingindo-se de governador do Banco de Portugal, para além de ter falsificado uma chapa de nota, documentos e credenciais várias. Utilizou ainda as matrizes e serviços da empresa inglesa Waterlow & Sons, Ltd, a qual executava a impressão das referidas notas. Através de Ysselveere, obteve do administrador da empresa inglesa o reconhecimento da autenticidade de dois contratos, pelos quais o Banco de Portugal autorizava o governo de Angola a emitir 580 000 notas de 500 escudos (290 000 000 de escudos/1 446 514 de euros), ficando Alves dos Reis encarregado de tratar do negócio. Assim, Ysselveere recebeu da Waterlow, em fevereiro de 1925, a primeira parte das notas. José Bandeira, através da embaixada portuguesa em Haia, fez chegar a Portugal esse primeira parte da encomenda. As restantes remessas foram chegando ao País, suscitando então desconfianças nos meios financeiros, perante tantas notas em circulação. Contudo, as investigações do Banco de Portugal nada clarificaram, desmentindo mesmo a existência de dinheiro falso.
Alves dos reis pretendia com toda esta fraude gigantesca fundar o Banco Angola e Metrópole, para investir em Angola e, posteriormente, tentar controlar a maioria das ações do Banco de Portugal, situação que esteve prestes a conseguir. Entretanto, a burla foi descoberta, estando Alves dos Reis em Angola. A bordo de um navio alemão, foi preso a 6 de dezembro de 1925, acusado de falsificação de notas. Foi aberto um processo judicial, que se prolongou até 30 de junho 1930, quando foi condenado a 20 anos de prisão. Manteve-se encarcerado na Penitenciária de Lisboa até 1945, sofrendo a pena mais pesada do grupo de falsificadores por ele dirigido, em que se incluía a sua mulher.
A justiça condenou Alves dos Reis, mas o povo absolveu-o desde o início do processo. Era uma figura conhecida do grande público, um indivíduo elegante e vaidoso, considerado por muitos um génio, um aventureiro romântico, um homem capaz das mais impensáveis artimanhas para alcançar fortuna e notoriedade, até alguém capaz de salvar o País do seu estado depauperado. A fraude que organizara teve repercussões em todo o País e em muitas figuras públicas e do governo, levando algumas a tribunal e mesmo à prisão, como o governador e o diretor do Banco de Portugal. O governo foi ridicularizado e contestado pela opinião pública durante o processo, que arrastou inúmeras personalidades para a ignomínia e para as "ruas da amargura".
Mas mesmo depois da maior fraude da história portuguesa, este campeão das ilegalidades voltou a reincidir, quando a 12 de fevereiro de 1952, sete anos depois de sair da prisão, burlou em 60 mil escudos (299.27 euros) um negociante de Lisboa, a quem prometera 6 400 arrobas de café angolano, inexistentes. Em 1955 foi condenado a quatro anos de prisão, pena que não chegou a cumprir, pois morreu em 9 de julho desse ano, na pobreza e no esquecimento geral.
O Festival Eurovisão da Canção lembra um pouco a emoção e o calor dos festivais de música brasileiros dos anos 70, que revelaram cantores como Toni Tornado, Maria Alcina, Djavan, Fagner, Tetê Espindola e Oswaldo Montenegro, entre outros. Depois de 53 anos, Portugal se sagrou campeão do certame em 2017, disputado em Kiev, Ucrânia, com a deliciosa canção "Amar pelos Dois", de Luísa Sobral e interpretada por seu irmão Salvador. Para celebrar esta apoteose, o grupo português Spell Choir decidiu criar um cover a cappella da canção. Simplesmente imperdível!
Há muito que Portugal tem um problema chamado água. Durante décadas a importância da água foi ignorada, foi considerado um recurso gratuito e que poderia ser usado ou destruído sem regras e sem limites, de vez em quando o Alentejo queixava-se de sede, mas os alentejanos são poucos e pesavam pouco nos partidos do poder, durante duas décadas foi ignorado pró Cavaco Silva, apesar de em meados dos anos 80 ter enfrentado uma seca que levou a região a receber ajuda alimentar.
Durante décadas indústrias como as celuloses, os curtumes ou a pecuária usaram os rios e ribeiras como se fossem esgotos a céu aberto, o imenso oceano acabaria por tudo limpar. Onde não havia águia em abundância cultivava-se em sequeiro, onde esta chovia generosamente usava-se sem cuidado e penas era retida para produção de energia elétrica.
Agora que a excitação presidencial anda em níveis mais suportáveis e compatíveis com alguma reflexão séria dos problemas nacionais, é preciso dizer que Portugal tem um problema grave com este recurso. Usa-o de forma descuidada, não promove a sua retenção e redistribuição. Mas acima de tudo tem um problema de falta de visão coletiva, porque não é possível falar de florestas, de desenvolvimento do interior, da agricultura, do ambiente e das florestas sem falar da água. Nenhum destes problemas pode ser analisado ou resolvido isoladamente e todos passam pela água.
A agricultura, as populações, o equilíbrio ecológico, a instalação de indústrias carece de água em qualidade, quantidade e a preços aceitáveis, falar de fixação de populações, de investimento, de agricultura e florestação ignorando a importância e o custo da água evidência falta de inteligência no debate. Não há prioridades isoladas em todos aqueles capítulos, e muito menos prioridades absolutas definidas nas televisões em cima de acontecimentos mais ou menos dramáticos.
É necessário reter a água, avaliar os seus stocks e prever a necessidade de promover a sua redistribuição desenvolvendo uma rede de transvases que assegure segurança no seu abastecimento. É preciso levar a sério o combate à poluição e condenar proporcionalmente as indústrias poluidoras, que devem suportar os custos económicos e ambientais, que ascendem a valores muito superiores às multas que lhes são aplicadas.
É preciso ter água em quantidade, com segurança, com qualidade e com preços aceitáveis e a seca que o país enfrenta mostra que os recursos disponíveis são escassos e incompatíveis com níveis adequados do interior. Uma boa parte da seca atual não se explica apenas pela escassez da água, mas também pela sua procura crescente, consequência do desenvolvimento económico ao longo de décadas, durante as quais se ignorou este problema.
O Festival Eurovisão da Canção lembra um pouco a emoção e o calor dos festivais de música brasileiros dos anos 70, que revelaram cantores como Toni Tornado, Maria Alcina, Djavan, Fagner, Tetê Espindola e Oswaldo Montenegro, entre outros. Depois de 53 anos, Portugal se sagrou campeão do certame em 2017, disputado em Kiev, Ucrânia, com a deliciosa canção "Amar pelos Dois", de Luísa Sobral e interpretada por seu irmão Salvador. Para celebrar esta apoteose, o grupo português Spell Choir decidiu criar um cover a cappella da canção. Simplesmente imperdível!
Christopher David White é um escultor que habilmente engana o olho humano com suas esculturas surreais de cerâmica que se parecem com pedaços de madeira em decomposição. Acreditando que "a humanidade está inextricavelmente ligada ao mundo natural", o trabalho de Christopher possui partes do corpo humano -como mãos, braços, rostos e torsos- semelhantes a uma árvore, que parecem ter sido encontrados em uma floresta mítica. Surpreendentemente, cada escultura incrível é artesanalmente feita com argila, que, segundo ele, é um material com uma habilidade inata de imitar uma grande variedade de materiais.
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As esculturas texturizadas, com texturas de madeira como pele são levadas mais ainda à vida com tinta acrílica em tons quentes. Alguns apresentam símbolos da vida sob a forma de ovos azuis e dourados e delicadas flores cerâmicas, embaladas em mãos cobertas de casca. Em outra peça uma mão segura o que parece um planeta terra derretendo, o que poderia aludir aos nossos problemas atuais de aquecimento global.
As impressionantes obras de Christopher encorajam o espectador a pensar sobre o relacionamento humano com a natureza e o meio ambiente e, nesse sentido, ele insiste que é "necessário encontrarmos um novo equilíbrio que promova um relacionamento pensativo e sustentável com a natureza".
Se gostou do que mostramos aqui (é bem possível que sim), você pode encontrar mais do trabalho de Christopher em seu site ou no seu perfil do Instagram.
Seguramente você já viu esta foto em algum lugar. Em um documentário, em um livro, em uma compilação, em alguma loja à venda em formato pôster ou nas várias vezes que foi postada aqui no MDig. No entanto, muito poucos conhecem a história real por trás desta fotografia, intitulada "Lunch atop a Skyscraper", que desafiava à morte, mas que tinha um pequeno truque. Para começar, há várias ideias equivocadas a respeito do que vemos na fotografia e algumas ainda são incertas na atualidade.
A mítica foto colorizada por Zak Kogut
A primeira de todas e a mais repetida: que foi feita por Lewis Hine em 1932 no Empire State Building quando estava sendo construído. No entanto, não é correto.
Efetivamente, foi feita em 1932, exatamente em 20 de setembro, durante o apogeu da Grande Depressão. Posteriormente, a imagem foi publicada pela primeira vez no New York Herald-Tribune em 2 de outubro de 1932. Sua localização? Rockefeller Center.
Via: Time
Muita gente pensava que foi Hine no Empire State Building porque efetivamente se encontrava nessa data documentando a construção do mítico arranha-céu, tal e qual vemos na imagem acima. Ademais, podemos observar semelhanças pela época em ambas as construções.
Via: Time
Então, quem foi? Não se sabe com certeza, alguns pensam que foi Charles C. Ebbet, mas o New York Timespublicou uma reportagem faz algum tempo e chegou à conclusão de que ninguém sabia. Em qualquer caso, Ebbets é uma opção bastante lógica: foi nomeado Diretor Fotográfico para o desenvolvimento do Rockefeller Center em 1932, no mesmo ano em que foi feita a emblemática fotografia.
Seja como e quem for, os arquivos do Rockefeller denominam o fotógrafo da famosa imagem como "Desconhecido", e quem queira que fosse teve que desafiar à morte para fazê-la, assim como os trabalhadores que ficaram imortalizados.
Via: Time
Na foto logo acima podemos ver como o fotógrafo teve que levar as placas de vidro para a câmera em uma bolsa de couro nas costas. Isso significava trocá-las enquanto se equilibrava a centenas de metros do chão sobre uma ridícula viga de aço. Um trabalho não apto para pessoas com vertigem.
Via: Time
Sabe-se com certeza que foi tomada no 69° andar do edifício a 240 metros de altura, no final de sua construção. Ademais, e aqui está o pequeno "truque" que muitos não conhecem, ainda que em aquele dia teve que resultar perigoso, a captura da mítica imagem não era tão arriscada como poderíamos pensar, já que alguns metros mais abaixo tinham um andar completamente terminado.
VÍDEO
Obviamente, não há nada casual na instantânea. Os trabalhadores agem como se almoçassem a cada dia com as melhores vistas da cidade, mas em realidade a imagem foi uma campanha para promover propriedades imobiliárias. Mal sabiam que mais tarde a imagem poderia se tornar um ícone que foi replicado em uma escultura em tamanho natural pelo escultor Sergio Furnari.
Escultura de "Lunch atop a Skyscraper", de Sergio Funari. Via: Pierre Gutreau
Portanto, estes tipos arriscaram suas vidas para ganhar um dinheiro extra para suas famílias em um momento onde a economia causava estragos sem precedentes. Onze valentes dos aproximadamente 250.000 que participaram em algum aspecto da construção do lendário Rockefeller Center.
Trabalhadores extenuados recorrerem cada vez mais à ajuda médica por efectuarem dez horas de trabalho diário no atendimento e distribuição
No dia 24 de Novembro decorreu uma acção de denúncia junto aos CTT em Ponte de Sôr, distrito de Portalegre, que juntou vários dirigentes sindicais do sector. Durante a acção foi distribuído um comunicado em que se denuncia a perseguição a dois trabalhadores para que aceitem propostas de rescisão amigável.
O SNTCT denuncia ainda que, a nível nacional, têm sido verificadas «situações semelhantes com o intuito de reduzir o número de trabalhadores» ou então substituí-los por «trabalhadores com contrato de trabalho a termo certo» ou «agências prestadoras de serviços, com trabalhadores a recibos verdes».
Os CTT – Correios de Portugal, considerada uma empresa histórica e reconhecida internacionalmente pela sua excelência entre os serviços de correio do mundo, foram privatizados em 2014 pelo governo do PSD e do CDS-PP.
Desde então têm-se somado as críticas dos trabalhadores e das populações que têm notado uma acentuada degradação na qualidade do serviço público que a empresa fornece. O SNTCT apresenta como exemplos as «constantes anomalias, com efectiva responsabilidade dos CTT» que se traduzem no fim da distribuição diária do correio, no aumento dos tempos de espera e dos casos de atrasos na correspondência, em trabalhadores extenuados, no fecho de muitos postos de correios e na falta de trabalhadores que leva a longos tempos de espera nas estações.
O mesmo sindicato também assume como «urgente a reversão da privatização dos CTT» como forma de garantir a qualidade deste serviço público que em mãos privadas traduziu-se na «degradação de um dos melhores serviços públicos do País».
Na semana passada, 23 e 24 de Novembro, os carteiros do Centro de Distribuição Postal de Alverca e Vila Franca de Xira estiveram em greve pelos mesmos motivos. Segundo o sindicato a taxa de adesão foi de 85%.
Trump "abriu as portas do Inferno" Hamas (partido palestiniano maioritário na Faixa de Gaza)
"Jerusalém é a capital eterna do Estado da Palestina. Esta declaração significa que os EUA estão a abdica do papel de mediador" Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana
"Peço a retirada [palestiniana] das absurdas e infindáveis negociações com Israel depois de o princípio da inviolabilidade do estatuto de Jerusalém ter sido quebrado. Peço que se ponha fim à coordenação de segurança com Israel e com os EUA" Mohammed Dahlan, antigo líder da Fatah (partido de Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana) em Gaza
"Não posso permanecer calado acerca da minha profunda preocupação com a situação que se desenvolveu nos últimos dias. Jerusalém é uma cidade sagrada, para judeus, cristãos e muçulmanos, com uma vocação especial para a paz. Rezo ao Senhor que essa identidade seja preservada e reforçada para benefício da Terra Santa, do Médio Oriente e de todo o mundo, e que prevaleça a sabedoria e a prudência." Papa Francisco"As aspirações de ambas as partes devem ser satisfeitas e deve-se encontrar uma forma, através de negociações, de resolver o estatuto e Jerusalém como futura capital de ambos os Estados [Israel e Palestina)"
Federica Mogherini, Alta Representante da UE para as Relações Exteriores
"Esta é uma decisão lamentável que a França não aprova e que vai contra a lei internacional e todas as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas" Emmanuel Macron, Presidente de França
Este é um "acordo histórico. Qualquer acordo de paz com os palestinianos tem de incluir Jerusalém como capital de Israel" Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel
"Tenho-me pronunciado consistentemente contra qualquer medida unilateral que ponha em causa a perspectiva da paz para israelitas e palestinianos.Neste momento de grande ansiedade, quero deixar claro que não há alternativa à solução dos dois Estados. Não há plano B." António Guterres, secretário-geral da ONU
"Condenamos a declaração irresponsável da Administração dos EUA, que ouvimos com grande preocupação. É uma decisão que vai contra a lei internacional e as resolução do Conselho de Segurança da ONU". Ministério dos Negócios Estrangeiros da Turquia
"Apelamos a protestos de massa contra esta declaração de guerra." UGTT, Central sindical da Tunísia muito representativa
"O Irão condena a decisão dos EUA de mudar a sua embaixada para Jerusalém, o que viola as resoluções internacionais". Ministério dos Negócios Estrangeiros do Irão
"Todos os gestos unilaterais que pretendam criar factos novos no terreno são nulos e vazios. A declaração do Presidente dos EUA viola resoluções aprovadas pelo Conselho de Segurança da ONU que estipulam o não reconhecimento da ocupação israelita da Cisjordânia e do sector oriental de Jerusalém". Porta-voz do Governo da Jordânia
"É uma escalada perigosa e uma sentença de morte para a paz." Mohammed bin Abdulrahman al-Thani, Ministro dos Negócios Estrangeiros do Qatar
"Discordamos da decisão dos EUA de mudar a sua embaixada para Jerusalém e reconhecer Jerusalém como a capital antes de haver um acordo final sobre o estatuto da cidade. Acreditamos que não ajuda as prespectivas de paz na região". Theresa May, primeira-ministra britânica
Era uma vez um homem feito de poesia. Um homem cuja origem burguesa não o impediu de identificar injustiças e de se associar aos trabalhadores e ao povo, para junto deles lutar pela paz e pela liberdade – a «palavra mais alta», que José Carlos Ary dos Santos proclamou sempre em letras garrafais.
A todos chegou através dos textos poéticos que escreveu e declamou, e também pelos seus cantados por outros. Paulo de Carvalho é um desses artistas que trabalhou com Ary dos Santos canções alheias à passagem do tempo, tais como «Lisboa, Menina e Moça», «Os Putos» ou «O Homem das Castanhas».
«Ele escrevia poemas para músicas que eu ia fazendo. Eu fiz muita música com ele, sobretudo para o Carlos do Carmo, muitas canções», descreve Paulo de Carvalho. No total foram mais de 600 as letras escritas por Ary dos Santos para intérpretes como Amália Rodrigues, Carlos do Carmo, Fernando Tordo, José Afonso, Paulo de Carvalho e Simone de Oliveira, entre os mais conhecidos.
Em qualquer caso, e tal como atestou numa entrevista, «a poesia é, em primeiro lugar, a maneira que eu tenho de falar com o meu povo». Através desta forma de linguagem, o poeta tornou-se popular, democratizou o acesso à cultura e revelou-se um homem «grande»«Se tiver que definir o Zé Carlos numa frase pequena diria que ele era grande em tudo. O que é que eu quero dizer com isto: era grande no talento que tinha para fazer o que faz como escritor. O que fez e o que faz, para mim a obra está aí», prossegue Paulo de Carvalho.
A obra bebeu do povo a inspiração, retribuindo-lhe a capacidade de sonhar e de lutar. «Ser operário é apenas saber dar mais um pouco de nós ao que nós fomos», eternizou Ary no poema «A Fábrica».
«Poeta do povo e da Revolução», foi a nomenclatura que se lhe colou e que tanto terá agradado a este homem bom. «O Zé Carlos tinha um enorme amor pelos outros e traduzia isso nas dádivas, na forma de conviver. Mas quando não gostava de qualquer pessoa seria bom sair da frente porque ele não fingia», assume Paulo de Carvalho.
Frontal e irreverente, Ary tinha uma ímpar capacidade de criar. «Era muito engraçado. Quantas vezes ele fazia um texto para uma cantiga e, chegávamos ao fim, todos nós estávamos maravilhados com o que ele tinha feito. Ele agarrava o papel, rasgava aquilo tudo e dizia: "Não gosto disto!", e depois fazia melhor. Essa capacidade era uma coisa incrível, era incrível», recorda o intérprete de «E Depois do Adeus».
Poeta revolucionário
Nascido a 7 de Dezembro de 1937, José Carlos Ary dos Santos recorreu às metáforas para sobreviver ao fascismo e ao PCP para lutar pela liberdade e fraternidade. Foi em 1969 que aderiu ao «melhor partido» (como reconhece no poema «Tomar Partido»), a quem deixou os direitos de autor de toda a sua obra.
Esse mesmo ano haveria de marcar a sua vida e o seu trabalho, que passou a ter desde então um cunho revolucionário. Publica a obra Insofrimento in Sofrimento e o seu poema «Desfolhada», escrito um ano antes (patenteado primeiro como Desfolhada Portuguesa), vai ao Festival RTP da Canção pela voz de Simone de Oliveira.
A prestação, já o sabemos, ficou em primeiro lugar. Digno de registo é o génio de Ary dos Santos, capaz de passar o crivo da censura com um poema cuja mensagem se insurgia contra os ditames conservadores da ditadura.
O gozo que o acontecimento terá dado ao poeta voltou a repetir-se, estavam ainda cerradas «As portas que Abril abriu». Em 1973, novamente a partir desse festival, a voz de Fernando Tordo levou a todo o lado o poema «Tourada».
As várias participações no festival da canção permitiram a Ary um reconhecimento alargado. O poeta valorizava, no entanto, a «pedrada no charco» que as suas letras representavam, numa altura em que o País vivia asfixiado pela ditadura de Salazar.
«Ao contrário do que pensavam certos puritanos da pena e do papel, eu já nessa altura entendia que a popularidade, utilizada de uma maneira correcta, podia conduzir, nas condições que existiam, a uma intervenção poética e política mais eficaz», revelou mais tarde.
Um criativo da palavra
Reconhecido por Natália Correia como um «dinamizador da matéria poética», Ary congregou no discurso poético a história do País, antes e depois do Abril por que lutou («Só nos faltava agora que este Abril não se cumprisse», exclamou no poema «As Portas que Abril Abriu»).
A guerra colonial, a carência de pão e de liberdade, a reforma agrária, as nacionalizações e as lutas dos trabalhadores foram parte da realidade que sempre interpretou.
Manuscrito do poema «A Bandeira Comunista»Créditos
Mas o poeta destacou-se também no teatro e na publicidade, carreira que inicia em 1958. Por essa altura (finais da década de 50), outros intelectuais portugueses como Alves Redol, Alexandre O’Neill e Urbano Tavares Rodrigues recorrem ao mundo publicitário para poderem pagar contas.
LPE Morrison, Zeiger, Suíço-Português e Espiral são as empresas de publicidade que integram o currículo de Ary dos Santos. Na Espiral, onde começou a trabalhar em 1970, criou alguns dos slogans mais marcantes da época.
«Minha Lã, Meu Amor», criado para a Woolmark, «Knorr é naturalmente melhor» ou «Mais seguro, mais futuro», cujo cliente era o Grémio Nacional dos Seguradores, foram alguns dos mais reconhecidos.
Outro slogan que permaneceu durante anos foi o de um purificador de hálito, que Ary terá criado a meio de uma reunião, «Halazon, a melhor invenção depois do beijo», e também «Cerveja Sagres, a sede que se deseja».
«Foi muito popular e isso não é bem aceite»
Cantou a força do País e admitiu ser «tudo o que disserem», mas foi pouco o que se escolheu dizer do génio e da obra. A tarefa de remeter ao esquecimento o poeta incómodo começou logo após o seu falecimento.
Isso mesmo atestou o jornalista e crítico de televisão, Correia da Fonseca, a 20 de Janeiro de 1984, no jornal O Diário: «Anteontem ao fim da noite, acabara o poeta de morrer, a RTP, saqueando-lhe a biografia, não reconheceria nele mais que o "publicista" e o autor de canções. De facto, foi como se tivesse querido ofuscar-lhe a imagem».
Paulo de Carvalho justifica o apagar da memória com a existência de um preconceito relativamente à popularidade de Ary, um sentimento radicado entre os intelectuais. «O meio intelectual é um bocado estranho, no mínimo estranho. Acham que ele é um fazedor de versos menores e nunca falam de toda a sua obra. Porque ele não fez só cantigas, antes pelo contrário».
O caixão de Ary dos Santos foi coberto com a bandeira do PCP, de acordo com a sua vontadeCréditos
Acrescenta que «o meio intelectual ou não gosta ou não aceita a grande popularidade das pessoas. O Zé Carlos, para além do talento que tinha, foi muito popular e isso não é bem aceite. É raro estar numa dessas antologias da poesia portuguesa, isso para mim quer dizer muita coisa». «Utilizando uma linguagem à Zé Carlos, quer dizer muita "dor de corno"», remata.
José Carlos Ary dos Santos faleceu a 18 de Janeiro de 1984, era ainda «menina» a Revolução dos Cravos, onde «o povo de Portugal deu o poder a quem quis».
O funeral, conforme reconheceu O Diário, foi o maior que algum poeta teve até então. Com o caixão coberto pela bandeira que cantou, foi seguido por muitos milhares de pessoas, certamente «com uma pedra de lua no lugar do coração», desde a Sociedade Portuguesa de Autores até ao Cemitério de S. João, em Lisboa.
CRAVINHO O XUXA POLÉMICO, UMAS VEZES APONTADO COMO SENDO DA ALA ESQUERDA DO PS, OUTRAS COMO XUXA DEMAGÓGICO E DE DIREITA, ANDA MUITO NA RIBALTA. TALVEZ E AINDA NÃO CANSADO DOS TACHOS QUE OCUPOU (ESTA GENTE NUNCA SE FARTA) QUERERÁ NOVO LUGAR EM FUTURA GOVERNAÇÃO.
QUANDO A MERDA VEM AO DE CIMA ELA ACABA SEMPRE POR TRANSBORDAR E ATINGIR OS QUE NÃO A QUEREM.
CLARO QUE DENTRO DO PS, O ANTRO MAIS TRAIDOR E ENGANOSO DA POLÍTICA PORTUGUESA, JÁ QUE SE AUTO ROTULANDO DE DEMOCRATA, DO SOCIALISMO, DA SOCIAL DEMOCRACIA, DA TOLERÂNCIA E DA SABEDORIA NADA ME SURPREENDE.
O PS É O CARRO DE RECOLHA DE LIXO NÃO RECICLADO E DA SUA PRÁTICA POLÍTICA DE LIXEIRA TODOS NÓS JÁ PAGAMOS BEM CARO E CONTINUAMOS A PAGAR ENQUANTO NÃO PENALIZARMOS QUEM NOS LIXA E INFERNIZA A VIDA..
TEM O PS NAS SUAS FILEIRAS PEQUENO/MEDIA/ BURGUESAS A GENTE MAIS DESONESTA, VIGARISTA E CONSPIRADORA ANTI CONSTITUCIONAL QUE RETALHOU O LIVRO DAS LEIS COLOCANDO-O AO SERVIÇO DOS GRANDES CAPITALISTAS.
AO SABOR DAS ASPIRAÇÕES NEO LIBERAIS/FASCISTAS NAVEGA O PS, E AO FAZÊ-LO, EM DISCURSOS DEMAGÓGIGOS E ALTAMENTE ILUSÓRIOS, TEM VINDO A DIVIDIR E CONFUNDIR A OPINIÃO DE MUITOS PORTUGUESES E A DETURPAR A REALIDADE SOCIAL CONSPURCANDO E TRAINDO TUDO O QUE PODERÃO SER AVANÇOS POR PARTE DOO NOSSO POVO.
NEM MESMO O DESCALABRO RESULTANTE DAS TRAIÇÕES E DAS POLÍTICAS DE DIREITA DOS PS(s) DA GRÉCIA (O PASOK) DO PSE DE ESPANHA, O FRANCÊS ETC, PERMITIRAM UMA ANÁLISE POR PARTE DO ELEITORADO NO SENTIDO DE DESMASCARAR DE VEZ ESTE REGABOFE DE GOZO E MENTIRA POR PARTE DA SACANAGEM QUE CONTINUA DESTRUINDO AS ASPIRAÇÕES DE QUEM QUER O VERDADEIRO SOCIALISMO.
CABEM NO CAIXOTE DO LIXO DO PS ABENÇOADO PELO CANCRO MALIGNO DE MÁRIO SOARES, TODAS AS TENDÊNCIAS POR MAIS OBSCURAS QUE SEJAM, AS LEBRES COMO ANA GOMES, O RENEGADO VITAL MOREIRA, A FILHA FASCISTA DO ADRIANO, O FRANCISCO ASSIS, E TODA UMA CÁFILA DE BANDIDOS E OPORTUNISTAS COMO GUTERRES, VITORINO, E VÁRIOS CONDENADOS POR CORRUPÇÃO E GATUNICE COMO SÓCRATES, ARAMANDO VARA ETC.-
ESPERAR DO PS, HONESTIDADE, TRANSPARÊNCIA, RESPEITO OU GOVERNAÇÃO DEMOCRÁTICA ,SÓ CABE NA CABEÇA DE LOUCOS, DOS PRIVILEGIADOS OU DOS QUE SOFREM DE AUSÊNCIA DE SISO POLÍTICO.
A famosa história de Romeu e Julieta, eternizada por Shakespeare no final do século 16, continua inspirando pessoas ao redor do mundo. Apesar de nunca ter sido comprovada a existência do casal, Verona incorporou-a como verdadeira, tendo criado até mesmo um túmulo para a jovem.
A cidade costuma atrair milhares de turistas, que chegam até lá para conhecer as casas que teriam sido das famílias rivais Montéquio e Capuleto. Mas como não é privilégio de todos ir até a Itália, há também a opção de enviar uma carta para as “secretárias” da Julieta – voluntárias que recebem as cartas deixadas no túmulo da jovem e respondem de volta aos remetentes.
Estima-se que mais de 50 mil cartas sejam enviadas todos os anos, sendo que 70% delas são escritas por mulheres. E a maioria dos textos, como era de se esperar, pedem conselhos amorosos à Julieta. “Elas quase sempre começam com ‘só você pode me ajudar’”, contou uma secretária.
Em 2001, o Clube da Julieta, como é chamado, contava com 7 voluntárias, que respondiam aproximadamente 4.000 cartas anualmente, além de um gato chamado Romeo. Hoje, são 45 secretárias, sendo na sua maioria moradoras locais, mas também há voluntárias que vêm dos quatro cantos do planeta para viver essa experiência especial.
O Clube criou até uma premiação, a “Dear Juliet” (Querida Julieta), que premia as melhores cartas e a melhor história de amor. Se você ficou com vontade de escrever uma carta, basta endereçá-la para Julieta, em Verona, na Itália, que ela chegará aos cuidados das secretárias. E, caso tenha se interessado pelo assunto, há um filme inspirado nessa história, a comédia romântica Cartas para Julieta, de 2010.