Intervenção de Vasco Cardoso na inauguração do busto de José Vitoriano
Caros camaradas
Estimados amigos
Em nome do Partido Comunista Português gostaria por começar por saudar esta importante homenagem do Povo de Silves, promovida pela Câmara Municipal, àquele que foi um dos mais ilustres cidadãos que esta terra viu nascer.
Justa e merecida homenagem que, com o busto que hoje se inaugura, ficará para sempre presente nesta cidade, num local bem próximo da casa onde viveu e morou José Vitoriano.
Permitam que dirija uma saudação especial ao Carlos, filho de José Vitoriano, a seu neto e demais familiares aqui presentes. Tal como aos eleitos da CDU e das restantes forças políticas com representação autárquica, assim como, a todos os homens e mulheres que hoje aqui se juntam naquela que é uma das mais importantes iniciativas de evocação do centenário deste destacado comunista Silvense, deste construtor do Portugal de Abril.
Ao longo deste ano, o PCP tem vindo a promover em vários pontos do país, iniciativas que procuram homenagear e dar a conhecer a vida, a luta e a intervenção de José Vitoriano. Uma vida de entrega total à luta desde a juventude, como trabalhador consciente, sindicalista, empenhado militante comunista, resistente antifascista, destacado dirigente do PCP, construtor e defensor de Abril - a vida de um homem que se norteou pela causa emancipadora dos trabalhadores, pela libertação do nosso povo do fascismo e por uma sociedade mais justa liberta da exploração do homem pelo homem - o socialismo e o comunismo.
José Vitoriano faz parte daquele núcleo de militantes, homens e mulheres, que em condições muito adversas e à custa de grandes sacrifícios, prisões, torturas - teceram os elos para organizar a luta por melhores condições de vida, pela liberdade e a democracia.
Modesto, tolerante, generoso, atento aos que lhe estavam próximo, foi como o camarada Jerónimo de Sousa - Secretário Geral do PCP - o caracterizou na iniciativa realizada em Lisboa, evocativa do centenário do seu nascimento, "um homem de uma enorme dimensão humanista, cuja riqueza não cabe em nenhuma biografia que o pretenda definir e caracterizar".
José Vitoriano nasceu neste concelho no final do ano de 1917. Ano que assinalará para sempre o início de uma nova época no longo processo de transformação social dos trabalhadores e dos povos e que permanecerá como um marco ineludível na História da Humanidade. A Revolução de Outubro foi o maior acontecimento do século XX, marcando-o e influenciando-o de forma decisiva.
José Vitoriano que aos 13 anos se tornou operário corticeiro não só adquire cedo consciência de classe - com 14 anos participa pela primeira vez numa greve contra o Fundo de Desemprego - como se vai identificar, ao aprofundar a sua consciência política, nomeadamente através do interesse com que acompanha a Guerra de Espanha, com o projecto de transformação social que a Revolução de Outubro concretiza e pelo qual o PCP intervém, luta e age.
Filho de camponeses pobres, José Vitoriano teve uma infância dura, de ajuda a seus pais. Trabalhos do campo, "guardar os porquitos, carregar água para casa, arranjar lenha para a cozinha”, como o próprio deixou expresso em várias entrevistas, eram não só trabalhos pesados como o impediram de ir à escola.
Contudo a sua ânsia de saber cedo se revelou. Ao ter conhecimento de alguém que acabara de fazer a instrução primária e se disponibilizava para ensinar as crianças que não tinham condições de ir à escola, com o acordo dos pais, começou à noite a frequentar "essas aulas". Passados quatro meses era ele próprio professor de outras crianças e do seu próprio pai - "ensinei o meu pai a ler. O suficiente para passar a ler o jornal e aprender a fazer o nome dele” refere mais tarde com legítimo orgulho.
O conhecimento, a necessidade de o ampliar e partilhar tornam-se uma constante na sua vida. Entende que a cultura é um instrumento para melhor compreender, interpretar e transformar o mundo, indispensável à formação humana e à afirmação consciente da classe operária.
É isso que o leva à criação da Biblioteca Popular, inicialmente instalada em sua casa, mas em que a vigilância e a perseguição da polícia fascista, ira obrigar a saltar de sítio em sítio até ter sido enterrada dentro das instalações do campo do Silves Futebol Clube durante 15 anos, só voltando a ver a luz do dia com o 25 de Abril de 1974.
Com a sua entrada formal no Partido, no quadro da reorganização de 1940/41, José Vitoriano vai dar um importante e continuado contributo para a luta do nosso povo contra o fascismo e na defesa dos interesses e aspirações dos trabalhadores. Primeiro no Comité Local de Silves, pouco depois no Comité Provincial como responsável do trabalho sindical (clandestino) no Algarve, enquanto no plano legal, é eleito em 1945, como Presidente do Sindicato dos Corticeiros do Distrito de Faro, facto que atesta o seu prestígio e autoridade junto dos trabalhadores.
Participa, em 1946, no IV Congresso do PCP (II Congresso ilegal), onde é aprovada uma nova orientação em relação ao trabalho sindical - "estar onde estão as massas e com elas trabalhar e agir" - ou seja nos Sindicatos Nacionais, com base na análise de que os Sindicatos clandestinos dificultavam o contacto com os trabalhadores e impediam o desenvolvimento da luta de massas que o Congresso considerou como "tarefa essencial", a par de uma ampla política de alianças e da afirmação do Partido, apontando-se o levantamento nacional como via para o derrubamento do fascismo.
José Vitoriano sai deste Congresso com novas responsabilidades.
Irá integrar a Comissão Nacional Sindical e o Comité Nacional Corticeiro que irá dinamizar e coordenar a luta dos operários corticeiros que passaram também a dispor dum órgão de informação - "O Corticeiro" - que mobilizava os trabalhadores para a luta dando a conhecer a situação nas diferentes empresas do Sector.
Tal como hoje, a luta de massas teve altos e baixos, avanços e recuos, mas a justa orientação do PCP para o movimento sindical permitiu que, já no quadro da crise do regime fascista, fosse possível constituir a Intersindical, em 1970, que ira desempenhar um grande papel nos movimentos de massas e greves que antecederam a Revolução de Abril e no processo revolucionário e que, nos nossos dias, é o mais importante movimento social português.
A nossa luta hoje, a acção e intervenção do PCP nos tempos que correm, o trabalho nas empresas e nos locais de trabalho, junto das populações, entre a juventude e de uma enorme diversidade de sectores e camadas sociais, vai colher inspiração, no trabalho dedicado e sistemático de dinamização da organização e da luta reivindicativa em que José Vitoriano se empenhou.
Camaradas;
Amigos;
José Vitoriano que passou quase 17 anos nas cadeias fascistas, foi preso pela primeira vez em 1948 quando desenvolvia uma intensa actividade pelas responsabilidades que tinha no plano sindical e partidário. Tinha então o pseudónimo de Joel.
Durante todo este tempo, José Vitoriano manteve sempre um comportamento digno frente à polícia, pelo que viria a ser violentamente espancado.
Nos tribunais fascistas defendeu a sua condição de comunista e a actividade do PCP, passando de réu a acusador da ditadura. Esteve preso em várias cadeias - Aljube, Caxias, Cadeia da Comarca de Setúbal e Peniche, de onde viria a ser libertado em 1966.
José Vitoriano encarou a prisão como a continuação da luta, não se deixou abalar, manteve as suas convicções e a sua disposição para a luta. Aproveitou o tempo de prisão para continuar a aprofundar os seus conhecimentos. Na altura da sua libertação estudava alemão.
Pouco depois de ter sido libertado, considerou aos microfones da Rádio Portugal Livre que "a arma mais forte que o militante tem ao cair na prisão é a sua confiança no triunfo da causa que serve. Essa luta será ainda difícil, mas podem estar certos da vitória".
Libertado em 1966, como resultado duma ampla campanha nacional e internacional, volta de novo à clandestinidade em 1967 - ano em que passa a integrar o Comité Central com tarefas no exterior, nomeadamente no quadro da actividade internacional do PCP. Tem então o pseudónimo de Relvas.
Como membro do Secretariado do Comité central de 1968 a 1972, viaja para Portugal algumas vezes, onde entra clandestinamente de forma diferenciada, fazendo a ligação com a Comissão Executiva Nacional a funcionar no interior do país.
De regresso a Portugal, em Janeiro de 1973, é como membro da Comissão Executiva Nacional que assume diversas tarefas, nomeadamente como responsável da Margem Sul do Tejo, membro da redacção do "Avante!", responsável pela tipografia de "O Militante", acompanhando ainda algum trabalho sindical, empenhando-se, como sempre o fez, decisivamente no trabalho que iria acelerar a chegada desse dia libertador que foi o 25 de Abril de 1974.
O processo revolucionário vai exigir-lhe uma diversificada intervenção no plano partidário quer pela responsabilidade de importantes Direcções Regionais - Setúbal, Alentejo e Algarve, mas também no plano institucional como deputado do PCP.
Uma actividade intensa em diversas fases da construção da democracia que irá contribuir para as grandes transformações e conquistas então alcançadas.
José Vitoriano foi deputado durante dez anos, eleito pelos círculos eleitorais de Faro e Setúbal.
Atento aos problemas dos trabalhadores e das populações das respectivas regiões, interveio na Assembleia da República visando a defesa dos seus direitos, tendo dado particular atenção à defesa da pesca portuguesa e aos direitos dos pescadores.
Interveio em momentos importantes da actividade parlamentar e sobre diversos temas de que referimos apenas a Declaração de Voto dos deputados comunistas sobre a votação final que cria a Universidade do Algarve que considerou como "factor de desenvolvimento social e cultural" da sua região de origem.
A sua intervenção, sempre que presidiu à Assembleia da República, na qualidade de seu Vice-Presidente foi respeitada por todas as bancadas pelo rigor e competência demonstrados, pela vontade desinteressada de servir o seu povo e o seu país.
Toda a sua actividade e intervenção foram sempre inseridas no colectivo partidário quer como membro do Comité Central (desde 1967) quer na Comissão Política, entre 1974 e 1988.
Posteriormente foi membro da Comissão Central de Controlo e Quadros e da Comissão Central de Controlo.
José Vitoriano deu sempre uma grande atenção aos quadros, não só ao seu trabalho e características, mas igualmente aos aspectos pessoais das suas vidas, o que se pode testemunhar pelas suas valiosas intervenções em quatro Congressos sobre a política de quadros.
A vida pessoal e familiar de José Vitoriano foi marcada pela opção que fez como revolucionário profissional.
Casado com a camarada Diamantina, também ela filha de Silves e sua companheira de sempre, durante quase seis décadas, o período de vida em comum foi bastante reduzido, referindo-nos José Vitoriano no livro que as edições "Avante!" dedicaram ao seu centenário que ao assinalarem os vinte anos de casados tinham apenas dois anos de vida em comum, concluindo "os melhores anos da nossa vida de jovens, não vivemos juntos”.
Faleceu a 3 de Fevereiro de 2006. "Esse homem generoso e afável deixou-nos para sempre nesse dia, mas o exemplo da sua vida perdurará como estímulo à nossa luta e à defesa da identidade do PCP" assim se referiu Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do nosso Partido, na iniciativa central que assinalou o Centenário de José Vitoriano, realizada em Lisboa, no dia 12 de Dezembro.
Camaradas e amigos
Honrar e homenagear José Vitoriano é continuar a lutar pelos ideais que ele abraçou na sua juventude. É alertar para os perigos do ascenso do fascismo, é projectar cada vez mais a necessidade da construção duma sociedade livre de todas as formas de exploração e opressão, objectivo a que José Vitoriano se entregou de forma generosa e plena, com coerência e dignidade, modéstia e firmeza perante os inimigos de classe.
Se o PCP é o que é hoje muito se deve a comunistas como José Vitoriano, cuja vida se confunde com a luta dos trabalhadores e do nosso povo.
Este Partido do qual José Vitoriano é um dos mais destacados construtores é um partido com uma história ímpar. O partido da resistência antifascista, da liberdade e da democracia, o partido da Revolução de Abril e das suas conquistas.
O partido sempre presente nos momentos de resistência, transformação e avanço.
É o partido da classe operária e de todos os trabalhadores, o partido da juventude. O partido com que os trabalhadores, a juventude, o povo sempre podem contar.
É um partido coerente. O partido da verdade, que não cede a pressões e chantagens, aprende com a vida e segue determinado na afirmação da sua identidade comunista.
É um partido com importantes valores éticos e morais. O partido cujos militantes, como José Vitoriano, deram provas sem paralelo de abnegação, recusando e combatendo favores e benefícios, dando o exemplo de dedicação ao serviço dos trabalhadores, do povo, do País, da causa da libertação dos trabalhadores e dos povos.
É o partido que alertou e preveniu, a partir das suas análises, para as consequências da política de direita, para as privatizações e a reconstituição do capitalismo monopolista e o seu domínio sobre a vida nacional. O partido que alertou para as consequências da integração e do rumo da CEE/UE, para o que significaria a adesão ao euro e todo o seu rasto de devastação económica e social, para o comprometimento da soberania nacional.
É o partido que contribuiu e contribui para construir uma vida digna e melhor. O partido cujos militantes no poder local, como aqui nas autarquias em Silves, e noutras instituições, no movimento popular e aos mais diversos níveis agiram e agem para a resolução dos problemas dos trabalhadores e das populações, para a concretização das suas aspirações.
Este Partido que José Vitoriano ajudou a ter raízes fundas no Povo Português, é o partido que promove a participação e a luta. O partido que alerta, esclarece, mobiliza e une, mostrando a força imensa da luta de massas para resistir e desgastar os ataques e retrocessos sociais e civilizacionais e para transformar a sociedade.
É o partido que organiza, que dá a oportunidade de juntar a opinião e a reflexão individual, à discussão e à decisão colectivas e as transforma em poderosa alavanca de intervenção e transformação.
É o partido que propõe soluções para os problemas que enfrentamos, que tem sido fundamental em todos os avanços positivos registados nos últimos dois anos na vida nacional, mesmo contra a vontade do PS, sem prescindir de apontar à necessária ruptura com a política de direita e à exigência duma política patriótica e de esquerda, dum Portugal mais desenvolvido, mais justo e soberano.
É o partido portador de um projecto de futuro. O partido portador das soluções e do projecto alternativo, contra o capitalismo, pela democracia avançada e o socialismo.
O PCP, partido que intervém com uma confiança inabalável assente na sua história, no seu projecto e na sua força, é o partido a que vale a pena pertencer. É o Partido da bandeira vermelha, com a foice e o martelo, e a estrela de 5 pontas, o Partido a quem José Vitoriano dedicou toda a sua vida, e que nos enche de orgulho e responsabilidade nas lutas do presente e do futuro.
Viva a luta dos trabalhadores e do Povo português
Viva o 25 de Abril
Viva o povo de Silves e do Algarve
Viva o Partido Comunista Português
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