21
Jul18
SOLDADO CONHECIDO
António Garrochinho
Soldado Conhecido
Foi o treino e o trem
Foi o porto e o barco
O desfile, o abraço
O tambor a rufar
Foi o porto e o barco
O desfile, o abraço
O tambor a rufar
Foi o pranto no cais
O pai nosso que fica
Sem jeito p’ra vida
Foi o eco do mar
O pai nosso que fica
Sem jeito p’ra vida
Foi o eco do mar
Foi a marcha, o calor
Foi o peito inchado
Do homem fardado
Foi o seu funeral
Foi o peito inchado
Do homem fardado
Foi o seu funeral
Foi a arma na mão
A besta que nos berra
A força da guerra
O avião
A besta que nos berra
A força da guerra
O avião
Água que seca no nosso cantil
O lábio que greta, a febre a subir
O sangue que ferve cá dentro de nós
O corpo que treme debaixo do sol
O medo da morte, a noite a gritar
Foi aquilo que a gente não pode falar
O lábio que greta, a febre a subir
O sangue que ferve cá dentro de nós
O corpo que treme debaixo do sol
O medo da morte, a noite a gritar
Foi aquilo que a gente não pode falar
Foi o estado maior
Foi a messe e o rancho
O mando, o comando
O quartel general
Foi a messe e o rancho
O mando, o comando
O quartel general
Os abutres e nós
Foi aquilo que fez
O negócio da guerra
E obrigou a matar
Foi aquilo que fez
O negócio da guerra
E obrigou a matar
O estilhaço, o napalm
A picada no osso
O Ambriz, o Tomboco
Foi São Salvador
A picada no osso
O Ambriz, o Tomboco
Foi São Salvador
Foi a carta que dói
Da mulher que nos foge
E o puto lá longe
Tão longe de nós
Da mulher que nos foge
E o puto lá longe
Tão longe de nós
A malta, a maca, o negro que cai
O cabaço da preta, o mulato sem pai
O soldado castrado no corpo e na voz
A mina que rebenta por baixo de nós
Foi o preço, é o braço artificial
É aquilo que a gente não pode calar
O cabaço da preta, o mulato sem pai
O soldado castrado no corpo e na voz
A mina que rebenta por baixo de nós
Foi o preço, é o braço artificial
É aquilo que a gente não pode calar
Foi a guerra colonial!
In: Paco Bandeira (1978), Os ferrinhos, o adufe e a guitarra, DECCA.