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POESIA E MÚSICA DA RESISTÊNCIA

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16
Ago16

Terrorismo de Estado e seus cúmplices

António Garrochinho

De Hollande a Obama, de Clinton a May, de Merkel a Renzi, a frente do combate «contra o terrorismo» é inexpugnável. No meio deles, Benjamin Netanyahu funciona como uma referência dessa grande confraria democrática e pacifista.
O parlamento do Estado de Israel, «a única democracia do Médio Oriente» de acordo com a credenciada informação que se acha de referência, acaba de aprovar um dispositivo legal que permite ao poder judicial aplicar penas de prisão a crianças a partir dos 12 anos. Esta medida profilática contra «o terrorismo», inegavelmente de grande alcance pedagógico e humanitário, vem pôr cobro a situações incómodas como aquela a que foi sujeito Mohammed Suleiman, detido, espancado e torturado quando tinha 13 anos e que foi obrigado a esperar na cadeia até perfazer 14 anos, para então ser condenado a 15 anos de prisão, pena que agora cumpre por «atirar pedras». Tudo isto porque a lei israelita em vigor não permitia levar garotos com menos de 14 anos a julgamento.
Agora o processo torna-se muito mais transparente: as crianças podem ser condenadas logo aos 12 anos, embora saibamos que nada impede que sejam detidas, espancadas e torturadas aos 10 ou 11 anos e tenham de aguardar em prisão até terem a nova idade para serem julgadas. Afinal, é uma evolução natural no Estado que é exemplar na «luta contra o terrorismo», segundo alguns dos mais cotados e democráticos jornalistas de referência.
Esta inovadora medida legislativa viola todos os conceitos de Estado de direito, normas e convenções internacionais e, claro está, os direitos humanos. Nada que trave os dirigentes e legisladores israelitas na sua saga contínua para erradicação do «terrorismo», isto é, de todos os actos de luta e resistência contra a criação do Estado palestiniano, cuja existência os principais dirigentes mundiais dizem exigir enquanto tudo permitem para a impedir.
Aos que parecem sempre prontos a criticar Israel, e que, por isso, logo recebem a chancela de anti-semitas, lembre-se que esta lei tem salvaguardas, porque afinal não ameaça todas as crianças. As medidas nela contidas são aplicáveis apenas a jovens palestinianos, os únicos que sofrem da doença «terrorista», ilibando imediatamente os adolescentes israelitas, ainda que participem em assaltos ou actos de latrocínio e destruição promovidos pelos colonos. Não é uma lei universal, é feita de encomenda para uma parte da sociedade.
Dir-se-á que existe em tudo isto um vício racista ou segregacionista, mas trata-se de um comportamento tão entranhado e enraizado na sociedade israelita que já ninguém repara, principalmente os chefes mundiais, mesmo quando os seus olhos embatem em assombrosos muros de separação ou nas jaulas que os complementam e onde são desnudados, revistados e sujeitos a humilhantes interrogatórios e contagens os cidadãos palestinianos que apenas pretendem trabalhar ou deslocar-se para visitar familiares.
Procurem-se reacções a esta lei por parte das sãs consciências mundiais, sempre tão zelosas com alguns direitos humanos, e não as descobrimos, ouvimos ou vemos. É normal: o chefe dos espiões militares israelitas faz declarações em defesa e apoio do terrorismo do Isis ou Estado Islâmico e ninguém se incomoda; o primeiro-ministro israelita visita mercenários da Al-Qaida que são tratados em hospitais israelitas e nenhum dirigente mundial toma conta da ocorrência; dia sim, dia não, os dirigentes israelitas anunciam a construção de novas centenas de habitações em colonatos, e assim inviabilizam o Estado palestiniano cuja bandeira ondula, não se sabe bem para quê, nos mastros da sede da ONU. Mais prosaicamente, as autoridades israelitas impedem a realização da final da Taça da Palestina em futebol e a FIFA finge que nada se passou; os serviços israelitas proíbem o chefe da delegação olímpica palestiniana de viajar de Gaza para o Rio de Janeiro e o tão severo Comité Olímpico Internacional não mexe uma palha – certamente mais ocupado com as malhas do doping, para que capturem a leste o que deixam passar às escâncaras a oeste.
Aliás, por que razões o combate de Israel contra o «terrorismo» e o envio de crianças para as masmorras sionistas deveriam merecer reparo, se essa divindade intocável da globalização conhecida como Google omite dos seus mapas – que funcionam como guias universais – qualquer alusão a territórios palestinianos ou da Palestina? Assim sendo, a Palestina não passa de uma entidade virtual, uma espécie de pokémon por identificar.
De Hollande a Obama, de Clinton a May, de Merkel a Renzi, a frente do combate «contra o terrorismo» é inexpugnável. No meio deles, Benjamin Netanyahu funciona como uma referência dessa grande confraria democrática e pacifista. Ele não hesita em usar a guerra e o terrorismo contra «o terrorismo», nem que tenha de arrasar a vida de crianças, sustentar bandos de criminosos, «islâmicos» ou não, ou fazer gato-sapato do direito internacional e dos mais elementares direitos humanos.
Quando os principais dirigentes mundiais dizem que estão «em guerra contra o terrorismo» ou são favoráveis à existência de dois Estados na Palestina, mentem com quantos dentes têm na boca. E são cúmplices, disso não haja qualquer dúvida, com o terrorismo de Estado tal como é praticado por Israel.

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